Quem nunca atacou um pacote de bolachas, uma barra de chocolate ou um pacote de cajus à noite a ver televisão que atire a primeira pedra. “É muito comum as pessoas sentirem vontade de comer algo doce ou salgado durante algumas semanas, sobretudo quando estão a passar por um período difícil das suas vidas. A fome emocional é, no entanto, diferente de compulsão alimentar ou bulimia. São coisas distintas. Cientificamente, uma pessoa que tem compulsão alimentar come exageradamente durante pelo menos seis meses, várias vezes por semana. A bulimia é uma compulsão alimentar em que depois de a pessoa comer exageradamente provoca o vómito. Mas há pessoas que comem de forma exagerada durante 2 ou 3 meses mas que não são compulsivas… e ficamos aqui com uma lacuna porque não se encaixa no perfil do adicto nem do compulsivo. Sobra aqui a pessoa que come emocionalmente, ou seja, come porque se sente triste, só, frustrada, aprisionada, stressada. São pessoas que veem a comida como uma compensação, como um conforto, um preenchimento de algo que não têm. E depois de comerem o pacote de bolachas ou de batatas fritas sentem uma culpa enorme, por se terem descontrolado, por estarem a contribuir para um aumento de peso quando muitas vezes querem perder,” afirma Teresa Branco, especialista em gestão do peso, autora do livro ‘Como Vencer a Fome Emocional’. “E o que acontece? Prometem a si próprias que isso nunca mais vai acontecer… e não acontece, até à próxima vez em que se sentem em baixo. Então e a força de vontade? “Nada disto tem a ver com a força de vontade. Não me venham dizer que pessoas que passam meses a fazer restrição alimentar, a comer pouquíssimo, não têm força de vontade! Se não tivessem, não conseguiam fazer dieta. Tem sim a ver com o facto destas pessoas terem alterações emocionais e é muito mais fácil recorrer à comida do que às drogas e mais saudável que recorrer ao tabaco ou ao jogo.”
O chamamento do chocolate e das batatas fritas
Não seria mais fácil se nos confortássemos com uma salada de alface ou uma maçã? Seria, mas as coisas nunca são fáceis. O problema é que os doces e os salgados são geradores de prazer e estimulam determinadas áreas do cérebro que são responsáveis pela libertação de hormonas do prazer, como a dopamina, que também pode ser gerada pelas relações sexuais ou pela atividade física, ou toma de drogas. “O açúcar é um forte potenciador de dopamina e por isso as pessoas sentem prazer, conforto, quando comem alimentos ricos em hidratos de carbono. E se a si lhe apetece gelado e a outra pessoa batatas fritas, isso não tem explicação fisiológica. Ambos são hidratos de carbono e potenciadores de dopamina e serotonina, por isso somos impelidos a comer esse tipo de alimentos”, revela Teresa Branco. Mas além das razões fisiológicas há também as emocionais: os bolinhos que a avó fazia, o gelado que a mãe comprava, as batatas fritas em que o pai se esmerava pois sabia que nós adorávamos… eram sinais de amor aos quais recorremos na idade adulta para nos confortar. Cuidado com o que diz ‘Se não tiveres boas notas, não comes sobremesa!’ Se costuma fazer este tipo de chantagem com os seus filhos, pare! “Nunca devemos premiar ou penalizar com comida. Quando dizemos aos nossos filhos que lhe damos um chocolate, um gelado, um bolo, se eles tiverem boas notas, se comerem o jantar todo, se fizerem isto ou aquilo, estamos a dar demasiada importância à comida, a criar pessoas que vão recorrer a ela para se confortarem emocionalmente. É algo que só acontece atualmente, andamos obcecados com comida… já viu a quantidade de programas de culinária?”, remata Teresa Branco.
Aponte o dedo aos culpados
E são vários. Primeiro: o género. Se é mulher, é provável que coma mais por emoção. Os homens são mais tentados a comer por stresse, as mulheres também sofrem com o stresse mas comem mais por tristeza, solidão, desgosto amoroso, além de estarem mais sujeitas às variações do ciclo hormonal, o culpado número dois. O sexo masculino é mais estável a nível hormonal. “A fase pré-menstrual é terrível para a mulher, na semana que antecede o período tende a comer mais. E porquê? Porque ficamos mais irritadiças e a comida funciona como um calmante. Se tomam a pílula ou não, mas têm mais de 35-40 anos, como produzem menos progesterona, há ainda outra razão: tendem a procurar conforto na comida. Isto porque a progesterona é antidepressiva e assim procuramos conforto em certo tipo de alimentos para compensar.” A estação do ano também tem culpas no cartório. “Sobretudo no inverno, pela falta claridade. Por isso se diz que no verão as pessoas são mais felizes e no inverno mais depressivas. Isso tem a ver com a produção do neurotransmissor serotonina, que é formado no nosso organismo quando há claridade. Ora quando nós não temos luz suficiente não formamos tanta serotonina, sentimo-nos mais em baixo e vamos buscar o conforto onde? À comida, que ajuda a produzir a serotonina para o nosso bem-estar.” Se trabalha por turnos, tem outro fator contra si. Como dorme durante o dia e trabalha à noite, tem menos luz (natural) na sua vida, e também tem mais tendência para assaltar o frigorífico.
É também por isso que os ataques de gula se dão mais à noite do que durante o dia.
Não é nessa altura, depois de jantar, quando estamos calmamente sentadas no sofá a ver ‘A Anatomia de Grey’ que fazemos um inventário mental do que há para trincar na despensa ou no frigorífico?
Durma para não comer (demais)
Não se trata de passar a dormir 24h, mas descansar as 8h diárias que o nosso corpo tanto precisa. “As pessoas que dormem pouco estão mais cansadas e o cansaço cumulativo leva-nos a comer mais para termos energia para funcionar normalmente e produzir dopamina, que nos dá prazer e bem-estar. E convém não esquecer que as alterações no metabolismo causadas pela ausência de horas de sono está associada a uma produção excessiva de insulina, que pode levar depois a quebras de açúcar, que tentamos colmatar através dos doces.”
12 dicas para acabar com a fome emocional
. Durma 8 horas seguidas.
. Identifique o que a faz ir buscar consolo ao frigorífico. Anote os pensamentos e sentimentos que antecederam e seguiram esse episódio. É fundamental registar o dia, a hora, o local, o que comeu, todos os pormenores contam.
. Quebre a rotina. Hoje o dia não foi muito agradável? Então já sabe que sentada à frente de televisão, computador ou tablet vai cair na tentação. Vá passear, ao cinema… não vá para o sítio do costume!
. Não faça dieta. A seguir a um período de maior controlo, é muito provável um de descontrolo que ponha em causa todo o esforço.
. Não mude a sua alimentação de um dia para o outro (ou a sua vida). Devagar se vai ao longe! Faça pequenas alterações na sua alimentação e deixe o seu corpo e paladar habituar-se à mudança.
. Faça exercício físico. Não tem de se transformar numa atleta de alta competição, faça uma caminhada com uma amiga, por exemplo. As conversas com amigos fazem milagres pelo nosso bem-estar.
. Escreva o que gostaria de fazer para tornar a sua vida mais feliz.
. Rodeie-se de pessoas de quem gosta e que gostam de si. Fora com os bota-abaixo!
. Não se culpabilize porque comeu demais. Mas também não pense ‘perdido por cem perdido por mil.’
. Não encha a despensa ou o frigorífico com as suas tentações. Se não há em casa, não come.
. Leve na mala alimentos saudáveis para o caso de sentir fome.
. Valorize as suas conquistas.
Mudar hábitos enraizados é muito difícil, portanto qualquer pequena conquista tem de ser comemorada.
Fome emocional: porque comemos mesmo quando não temos fome?
Gula, sim, mas não só, temos todo um menu de culpados e uma receita para se defender da fome emocional, não fique no escuro.
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