*artigo publicado originalmente em fevereiro de 2018
“Já não sou Filipa para ninguém, as pessoas acham mesmo que me chamo Maria”, conta a criadora da rede de escolas de costura Maria Modista. Em criança sonhava ser professora de inglês, como a mãe, em jovem escolheu licenciar-se em gestão, aconselhada pelo pai, e, agora com 39 anos, sente que por fim é apaixonada pelo seu trabalho.
Em 2011, Filipa estava ainda a trabalhar na empresa de contabilidade que fundou com Patrícia Pinto, uma colega que conheceu no seu primeiro emprego, na área financeira. Juntas saíram da firma, criaram a sua própria empresa e, de novo juntas, voltaram a mergulhar numa nova aventura, desta vez num universo diferente daquele que estavam habituadas.
“Estava farta daquela profissão cinzenta, sem conhecer pessoas e sem criatividade. Não era apaixonada pelo meu trabalho e, numa daquelas resoluções de ano novo, fiz uma lista das três coisas pelas quais eu sou apaixonada: viagens, roupa e comida”, relembra.
Um negócio no mundo da moda com tudo para resultar
Lista feita, a decisão saiu por exclusão de partes. Abrir uma agência de viagens exigia um grande investimento inicial e, apesar de adorar comer, a sua preocupação com a linha não era conciliável com um restaurante. Filipa viu, então, a sua escolha recair sobre a roupa. Desde sempre muito atenta às tendências, começou a pensar fazer um curso de design de moda.
Nessa procura por formação apercebeu-se que as poucas escolas de costura que existiam em Portugal eram muito antiquadas, o contrário daquilo que procurava. Foi aí que surgiu a ideia de negócio: uma escola diferente, com formadores jovens e roupas modernas, em que os alunos saíssem no próprio dia com peças terminadas. A ideia convenceu a sua sócia, que é a “terra-a-terra” da parceria, e as duas entraram no mundo das linhas e das agulhas, ainda sem saber se as “marias modistas” de Lisboa iriam aderir à novidade.
Quando Filipa pediu opiniões a amigos, nem todos a motivaram e acreditaram no sucesso da escola, mas foi no apoio dos que não duvidaram dela que se convenceu de que a sua ideia tinha tudo para resultar. Hoje, o tempo que a gestão da rede de escolas lhe exige não lhe permite costurar tanto quanto gostaria. Os conhecimentos em gestão são uma mais-valia para o negócio e gerir as redes sociais é das coisas que mais gozo lhe dá. Patrícia diz que “o telefone é a terceira mão da Filipa”.
Há seis anos, a criadora da Maria Modista não acreditaria, mas a verdade é que a escola acabou por impulsionar e revolucionar a costura em Portugal. Por lá já passaram mais de 10 mil alunos e, ao todo, a rede já conta com nove escolas pelo país. Expandir para as ilhas e, quem sabe, para Espanha, é o próximo passo. Entretanto, ao longo da aventura, Filipa já publicou dois livros sobre costura. O mais recente, de roupa para criança e bebé, foi lançado no passado mês de novembro. Os seus sobrinhos são as crianças para quem mais costura e é algo que adora fazer.
A costura mudou a sua vida e a de outros
O gosto pela costura surgiu na infância, quando Filipa recebeu uma máquina e, apesar de nem sequer saber mexer nela, não teve medo de arriscar. No início fazia roupas para as bonecas, “roupas em série e todas tinham de ter um laço”. Depois começou a apertar as calças de ganga (as dela, as da irmã e as das amigas), porque na altura estavam na moda calças justas e nas lojas ainda não eram vendidas. Mais tarde, experimentou criar as primeiras peças de roupa, sem medo de ter de deitar fora o tecido e fazer noutro.
“O meu pai ia muito a Angola e trazia capulanas, então eu decidi tentar copiar uma saia e ficou perfeita, até o fecho meti”.
Apesar de a máquina de costura ter ficado parada enquanto esteve a fazer a licenciatura e durante os anos em que trabalhou na área financeira, Filipa não lhe perdeu o jeito. Tem um objetivo pessoal, mas que ainda não conseguiu cumprir: passar um ano inteiro sem comprar uma única peça de roupa.
“Tenho até lojas de tecidos a patrocinar o meu ano sem roupa, mas é muito difícil não comprar nada quando se gosta tanto de moda”.
Emociona-se ao ler emails de antigas alunas a agradecer-lhe. Algumas estavam desempregadas e conseguiram criar uma fonte de rendimento; outras, tal como fez Filipa, deixaram o trabalho que tinham e aventuraram-se na verdadeira paixão. Ana Gomes, 29 anos, é um desses casos, trocou a consultoria pelo design de moda e, hoje, dedica-se exclusivamente à Nanai Portugal, a marca de roupa de praia que criou.
“Sempre quis ter a minha própria marca e o ‘bichinho’ aumentou quando fiz o curso de costura de fatos de banho na Maria Modista. Para mim, a Filipa sempre foi um exemplo a seguir, largou tudo para seguir o seu sonho”, conta a ex-aluna.
Filipa sente-se muito feliz e grata por tudo o que já conseguiu.
“Não penso muito no que gostava de ter, mas espero que o negócio cresça ou que fique assim, já está perfeito”.
Qualidade no trabalho e amor pelo que faz parece ser o segredo do sucesso. Recentemente pedida em casamento, pretende ser ela a fazer o seu próprio vestido de noiva, juntamente com os formadores e amigos da rede de escolas de costura – uma criação que será uma prova do amor entre Filipa e a Maria Modista.