Viriato Soromenho-Marques, Professor Catedrático, filósofo, ambientalista e autor (fotos: João Lemos)(Agradecimento aos ICS pelas facilidades concedidas para a realização da sessão fotográfica)

Nos dias que correm, é fácil sentirmo-nos assoberbadas com a catadupa de informação, as fake news que se multiplicam a cada dia e a retórica que nos descreve um mundo a preto e branco, sem considerar a sua complexidade. Precisamos que a informação seja simples, sim, mas não simplista e ‘pronta a comer’. Queremos que seja contextualizada, com espírito crítico. E é isso que faz o professor universitário, filósofo e autor de diversas obras sobre Política, Filosofia e Ambiente, nas suas crónicas, intervenções em conferências e órgãos de comunicação social (aconselho vivamente uma visita ao viriatosoromenho-marques.com e Azorean Torpor), com quem aprendemos sempre. Na nossa edição dedicada ao Tempo (abril de 2025), não podíamos deixar de falar sobre os tempos perigosos em que vivemos com quem conhece e estuda, a fundo, estas questões. Vale muito a pena ler, com calma, e refletir.

Por que o jovem Viriato decidiu estudar Filosofia e tornar-se académico?
Terminei o ensino secundário no ano letivo do 25 de abril de 74. Embora me interessassem as ciências naturais e a Geografia, acabei por escolher o campo das Letras. Hesitei entre Filosofia, História e Direito. Pensei demoradamente, mas acabei por seguir o curso que me parecia corresponder melhor à minha curiosidade e inquietação com um mundo imenso, e já em acelerada mudança. O estudo das tradições filosóficas é uma viagem fascinante por diferentes interpretações da realidade como um todo. Agradou-me esse horizonte onde temos possibilidade, e até o dever, de pensar para além daquilo que apenas podemos conhecer, ao contrário da disciplina de restrição que ocorre em muitas outras áreas científicas. Na verdade, nunca me arrependi da escolha. Pela sua complexidade e globalidade dos seus problemas, este nosso tempo, em toda a história humana, é aquele que mais precisa de uma abordagem filosófica.

A Filosofia é vista por muitas pessoas como uma disciplina complicada. Como deve ser dada aos jovens de modo a torná-la acessível?
O ensino da Filosofia é também um problema filosófico. Não faltam diferentes propostas pedagógicas. Na minha perspetiva, contudo, o importante é incentivar a formação de uma consciência de si dos estudantes, capaz de alimentar um duo ético fundamental: autoconfiança e responsabilidade em todos os sentidos, por si mesmo, pelos outros, pelo mundo. O contacto inicial com os grandes livros e autores parece-me fundamental, exigindo docentes habilitados para tal. Por outro lado, o contributo para uma atitude e um pensamento críticos é das aquisições mais úteis e transversais para o amadurecimento pessoal em geral. Isso passa não apenas pela aprendizagem da lógica, mas também por competências básicas no domínio da língua, da escrita e da comunicação oral. No secundário, a colaboração entre os docentes de todas as disciplinas é particularmente relevante. A Filosofia também ajuda aí.
Por outro lado, quando sou convidado para falar nas escolas secundárias, vejo extremas dificuldades materiais e organizativas, até disciplinares. A profissão docente tornou-se muito difícil. As políticas públicas passam ao lado do facto de os professores serem os primeiros a sentir as angústias de jovens que já não encaram a Escola como o lugar onde existem todas as respostas para os problemas do nosso tempo. Porque essas respostas (ainda) não existem em parte alguma.

Vivemos em tempos muito perigosos. Podemos equiparar este período em que estamos a viver a outro na História?
O nosso tempo é único na história da humanidade. Não é por acaso que muitos cientistas defendem a tese de que vivemos numa nova época geológica, o Antropoceno, pois é a humanidade que hoje tem o poder de alterar a estrutura e o curso da história planetária. Mudar o hardware e o software da Terra. Há séculos que vamos acumulando poderio tecnocientífico, industrial, bélico, sem, contudo, o amparamos em estruturas políticas e sociais de cooperação internacional, que nos protejam dos seus imensos riscos. As guerras atuais são um dramático exemplo da ausência de uma indispensável ação coletiva. O grande biólogo Edward O. Wilson (1929-2021) definiu o nosso problema de modo magistral do seguinte modo: “Temos emoções paleolíticas, instituições medievais e tecnologia quase divina.” Podemos identificar uma constelação de perigos existenciais para a espécie humana, ou mesmo para a vida planetária no seu conjunto. Julgo que hoje o perigo mais próximo de nós é o de uma grande guerra mundial, onde as armas nucleares destruam a própria habitabilidade do planeta. É o que designo, metaforicamente, como o risco de ataque cardíaco. Depois temos, o que chamo de esclerose múltipla, a saber, a cada vez mais crescente degradação global do ambiente, incluindo o clima, a biodiversidade (raiz de potenciais pandemias futuras), e todos os ecossistemas. Falamos, preocupamo-nos, iludimo-nos com consensos moles, como o Acordo de Paris, mas a verdade é que esta ameaça está a transformar-se num perigo de colapso global, sem que existam esforços sérios para enfrentar as causas. Por último, o risco e incerteza tecnológica, desde a IA até às biotecnologias e nanotecnologias. Avançamos rapidamente, sem estimar previamente os riscos envolvidos.

As extremas-direitas voltaram à Europa e EUA. Fala-se muito que a História pode repetir-se, os anos 30, do século XX, assemelham-se aos anos 20 do séc. XXI?
Importa não confundir as causas com as consequências. Muitos daqueles governantes que pregam os malefícios do extremismo de direita deveriam, primeiro, fazer uma autocrítica à sua desastrosa política, que manifesta um total desprezo pela qualidade de vida dos cidadãos. Isso é válido, tanto para os EUA, como para UE. As analogias são importantes, mas no sentido que lhe deu Mark Twain, “a história não se repete, mas rima”. Comparando a situação atual e o que se passou na Europa e no mundo depois do crash da bolsa de Nova Iorque, em outubro de 1929, encontramos semelhanças, mas também uma diferença fundamental, no que ao Ocidente diz respeito. Primeira semelhança: na raiz temos o colapso de um sistema financeiro ultraliberal nos EUA. Os anos loucos americanos (the roaring years), entre 1919 e 1929, de desregulação económica e financeira, de especulação, de abusos e violação das regras mais elementares. O governo de Washington limitou-se a assistir, como cúmplice das elites financeiras. Segunda semelhança: quando a bolha rebentou (a volatilização de 1929 “rima” com a explosão do subprime americano de 2007-2008) foram os mais débeis que pagaram a conta através das políticas de austeridade (Portugal foi uma das vítimas). A enorme diferença entre o século passado e a crise atual, é que a resposta à Grande Depressão foi diferenciada: na Alemanha e no Japão tivemos o surgimento de regimes nacionalistas e militaristas, enquanto na Suécia e nos EUA de F. D. Roosevelt triunfaram respostas que defenderam os direitos dos trabalhadores e puseram um açaime legislativo na cupidez financeira, que só seria rasgado nos EUA em 1999, com o regresso em força do hipercapitalismo financeiro. Infelizmente, a crise mundial revelada pelo colapso do Lehman Brothers e pela crise do euro terminou…com o reforço desse capitalismo financeiro com ramificações mundiais.

Podemos dizer que o capitalismo, a concentração do poder económico em poucas mãos, está a destruir as democracias?
Sem dúvida. Se a democracia é o poder do povo, isso é válido para todas as formas de poder. Os que estão satisfeitos com o que atualmente ocorre nos EUA e na UE reduzem, por conveniência ou ignorância, o poder à esfera da representação política, esquecendo que hoje os sistemas representativos estão literalmente rendidos a uma fonte muito mais dominante de poder, nascido de quarenta anos de neoliberalismo implacável: o império dos oligarcas e bilionários, que tanto compram ministros como iates. Nesse aspeto, a brutalidade de Trump, que tem na sua equipa governativa uma dúzia de bilionários, constitui uma clarificação da cruel realidade das nossas agonizantes democracias. No tempo de Obama ou Biden, os bilionários compravam a lei através da venalidade dos congressistas, agora são eles que as fazem, diretamente, para benefício próprio. Na Europa, basta seguir o modo como os grandes interesses económicos, representados em Bruxelas, condicionam as diretivas e regulamentos que, depois se aplicam a toda a União…

Sigo as questões da paz e guerra na Europa desde 1983. Em 1985, antes da chegada de Gorbachev ao poder na URSS, escrevi o único livro português sobre a ‘crise dos euromísseis’ e o risco de guerra nuclear na Europa.”

Numa entrevista à RTP1, feita antes das eleições americanas, disse algo que me fez pensar: ‘se Kamala ganhar, poderemos ter uma guerra mundial, se for Trump, é o perigo de uma guerra civil’. O perigo de guerra mundial desapareceu com a eleição de Trump?
Neste momento, a total desorientação de Bruxelas, com o seu plano irracional e ilegal (sem base nos tratados) de corrida aos armamentos na Europa, é o principal risco de guerra, pelo menos enquanto os europeus não colocarem aqueles que jogam com as nossas vidas no seu lugar. Trump pensa como um comerciante. A paz parece-lhe melhor negócio do que continuar a guerra. O seu pacifismo é mais utilitarista do que baseado em convicções fortes. Contudo, nos EUA, o perigo de guerra civil é real. Se Trump for assassinado, o que me parece ter uma probabilidade elevada, poderemos assistir a uma reacção em cadeia, com consequências impossíveis de antecipar.

Como é que vê a invasão da Ucrânia pela Rússia?
Eu olho para tudo isto a partir de um ponto de vista que me confere alguma responsabilidade. Sigo as questões da paz e guerra na Europa, desde 1983. Em 1985, antes da chegada de Gorbachev ao poder na URSS, escrevi o único livro português sobre a “crise dos euromísseis” e o risco de guerra nuclear na Europa (Europa, o Risco do Futuro, Dom Quixote). Segui atentamente as relações do Ocidente com a Rússia desde a implosão pacífica da URSS, em 1991. A guerra na Ucrânia é uma tragédia com muitos responsáveis. Concordo, particularmente, com a posição de notáveis professores norte-americanos, como Jeffrey Sachs e John Mearsheimer, que consideram terem sido os EUA e a NATO (eu acrescento também a passividade da UE) os principais responsáveis por esta guerra, que estava latente no modo como os EUA impuseram a expansão da NATO até às fronteiras da Rússia, numa postura arrogante, trocando a força pela diplomacia. A guerra nem sequer começou com a invasão de 2022, mas em 2014, com o derrube insurrecional do governo legítimo do presidente ucraniano Yanukovich, por um golpe insurrecional financiado e apoiado pelos EUA (tudo está hoje devidamente provado por estudos académicos incontestáveis). A narrativa de culpabilização exclusiva da Rússia distorce e oculta trinta anos de acontecimentos e não passa de mera manipulação de guerra. Que existam tantos intelectuais e académicos que se juntem a essa propaganda, disfarçada de explicação, só mostra até que ponto o conformismo, o preconceito e a ausência de pensamento crítico são porosos, e estão presentes em todas as camadas sociais de uma Europa. Também na esfera do espírito, os europeus caíram já para uma segunda divisão dos países no sistema internacional.

Vemos esta guerra na Ucrânia, assim como os bombardeamentos massivos em Gaza, como os bons contra os maus?
Com estas guerras assistimos à fragilidade de alguns dos princípios que julgávamos fundamentais no Ocidente, desde as revoluções do final do século XVIII, nos EUA e em França. A violação da liberdade de expressão no Ocidente transformou-se num ataque àqueles que denunciam a “destruição” dos factos, da verdade factual, em favor da fabricação de narrativas hegemónicas, grosseiramente moralistas, que justificam a continuação indefinida da guerra na Ucrânia, e os horrendos massacres do IDF em Gaza e na Cisjordânia. O maniqueísmo fanático, em vez da diplomacia realista, poderá incendiar o mundo.

Se Trump for assassinado, o que me parece ter uma probabilidade elevada, poderemos assistir a uma reação em cadeia, com consequências impossíveis de antecipar.”

Por que os EUA foram vistos como um ‘farol da democracia’? Ainda o são?
Os EUA inauguraram a moderna era republicana. Com todas as suas limitações, como foi o caso da perpetuação da escravatura em parte dos seus estados, os EUA inventaram o constitucionalismo das democracias representativas e o federalismo contemporâneos, enquanto na Europa, ainda dominavam as monarquias absolutas. A partir da I Guerra Mundial, como foi previsto em 1870 pelo nosso João Andrade Corvo, os EUA tiveram um papel decisivo no terminar de conflitos mundiais onde a Europa se autodestruiu como foco de poder mundial. Os EUA iniciaram uma rota de declínio quando a democracia foi transformada em plutocracia. Quando o dinheiro começou a valer mais do que a vontade dos eleitores. Estamos a falar de mais de 40 anos de crescimento da desigualdade, a níveis sem paralelo em qualquer outro país da OCDE. Na política internacional, com o fim da URSS, os EUA entraram numa fase de desmesura, incluindo guerras de pilhagem de recursos alheios, julgando-se suficientemente poderosos para governarem o planeta sozinhos. O total abandono de políticas ambientais e climáticas, mostram como os EUA se transformaram num perigo para si próprio e o resto do mundo.

Queremos pensar que os países são independentes para decidirem o seu próprio futuro, os seus aliados, e a que comunidades económicas ou militares querem pertencer, mas isso será verdade só para alguns? 
Todos os países gostariam de ter vizinhos confiáveis. Basta pensamos no nosso caso, apenas com um vizinho terrestre, Espanha. Foi necessário passar por séculos de invasões e guerras para termos hoje uma paz durável com Madrid. As grandes potências, até pela sua dimensão, são também particularmente vulneráveis. Os EUA resolveram o seu problema transformando todo o continente americano numa grande ilha dominada pelos EUA. Em 1823, com a doutrina Monroe, resolveram o assunto definitivamente. Nessa altura o receio era a possível interferência de países europeus. Nenhum regime hostil aos EUA, ou aliado a um Estado hostil (veja-se Cuba, 1962), poderia erguer-se sem uma provável ação militar dos EUA. Só entre 1898 e 1994 ocorreram 41 operações militares americanas de mudança de regime na América Latina. Ao contrário dos EUA, protegido também pelos Oceanos, a Rússia é um gigante vulnerável, com um território apetecível, objeto de cobiça e de sucessivas invasões. Se a Ucrânia se tivesse limitado a aderir à UE, mantendo um estatuto de neutralidade no que toca à NATO, viveríamos hoje em paz na Europa.

Desde cedo interessou-se pelas questões ambientais, foi presidente da Quercus, e é membro fundador da Zero. Como surgiu essa preocupação?
Comecei a escrever sobre temas ambientais com 18 anos, em 1976, mas o interesse é mais antigo. Considero serem duas as razões principais que alimentaram esse interesse pelo ambiente: o importante contributo da primeira organização pública portuguesa para a esfera da política de ambiente, a Comissão Nacional do Ambiente (CNA, 1971), dirigida pelo engenheiro José Correia da Cunha, uma das mais excecionais pessoas que conheci até hoje. Em 1972, no ano da 1.ª Conferência da ONU sobre Ambiente, em Estocolmo, não perdia uma série de programas de educação ambiental na RTP, apoiada pela CNA e apresentada pelo jornalista Luís Filipe Costa; o segundo fator foi a industrialização acelerada de Setúbal, a minha cidade natal. Vi, à minha volta a fatura negativa, natural e humana, de um modelo de crescimento económico insustentável.

Somos governados por políticos profissionais, mais habituados à intriga do que à estratégia, pouco inclinados ao estudo, fechados no curto prazo.”

Como vê a questão ambiental a ser tratada pelos políticos e governos portugueses?
As políticas públicas de ambiente surgiram com algum brio e intensidade. Ribeiro Teles, Carlos Pimenta, ainda hoje são recordados. A integração europeia deu algum impulso, sobretudo no quadro normativo. Mas, desde o final do século passado que temos assistido a um declínio na relevância das políticas de ambiente. Em Portugal e no mundo. A prova disso é o Acordo de Paris, uma caricatura de um regime internacional, pois os países ficam à solta e desobrigados de metas e sanções por incumprimento. Somos governados por políticos profissionais, mais habituados à intriga do que à estratégia, pouco inclinados ao estudo, fechados no curto prazo. Exatamente o oposto do que necessitaríamos para uma política ambiental que deveria ter como horizonte governar para hoje, sem esquecer as gerações futuras.

O que deveriam as autarquias, estar a fazer, já?
As políticas de ambiente e de combate/adaptação às alterações climáticas podem encontrar na escala municipal um campo notável de acção, até de inovação, com uma mais-valia fundamental, que é a da vertente de participação pública. Gostaria de enaltecer o trabalho levado a cabo em concelhos como Loulé, Guimarães, Castelo Vide, Idanha-a-Nova e Manteigas. A escala municipal permite desenhar, implementar e avaliar estratégias que vão da protecção dos solos com valor ecológico e agrícola (contra o risco permanente da especulação), mobilidade sustentável, criação de mercados para produtos locais, mudança de hábitos de consumo, nomeadamente no plano alimentar (uma dieta com menos carne, é boa para a saúde e para o ambiente). Não podemos esperar que a mudança venha de cima para começar a fazer o que é necessário.

A nossa edição é dedicada ao Tempo, daí falarmos um pouco sobre atualidade e futuro, mas também queria que abordasse como a tecnologia nos prometia ajudar a poupar tempo e parece, agora, que não temos tempo para nada, para estar com a família e amigos, para ler e refletir, para o ócio…
Essa tem sido uma das mais gritantes ilusões propaladas pelos defensores acríticos da tecnologia: afirmar que a tecnologia nos libertaria em todos os sentidos. Tal não é verdade. Pelo contrário, a tecnologia tem tornado o trabalho mais intenso, mais central nas nossas vidas. A tecnologia tem ocupado todos os poros da nossa existência, diminuindo o espaço e o tempo das interações entre seres humanos (basta ver quantas pessoas estão afundadas nos telemóveis numa carruagem do metro). Temos aumentado as nossas competências para lidar com as máquinas e perdido o talento para nos relacionarmos com os outros seres humanos. Como vai longe o convite de John Stuart Mill, que em 1848, num tratado sobre economia política, aconselhava a que o único crescimento exponencial fosse feito, não a delapidar a natureza e a trabalhar até à exaustão, mas a desenvolver, uns com os outros, “a arte de viver” (the Art of Living). É esse tempo e esse caminho que teremos de retomar nas nossas vidas.

Uma das mais gritantes ilusões propaladas pelos defensores acríticos da tecnologia: afirmar que a tecnologia nos libertaria em todos os sentidos. Tal não é verdade.”

O que pensa da forma como utilizamos a Inteligência Artificial (IA) e os ‘chatgpts’?
Comecei a aprofundar os temas da IA em 2018. O método que tenho seguido, recentemente, é o de obter informação sobre uma lista de algumas dezenas de cientistas e empresários ligados ao sector a nível mundial. Pesquiso declarações e conferências públicas e, também o que vão escrevendo nas redes sociais. Todos os aspetos relacionados com os utentes particulares de IA não devem esconder aquilo que quem comanda esse processo escreve ou diz, na condição de pessoa singular. Destaco algumas ideias marcantes: China e EUA comandam o processo; a velocidade de autodesenvolvimento dos algoritmos ultrapassa a compreensão dos próprios especialistas; sabemos que os impactos vão ser brutais nos mercados laborais, seja de trabalhadores de base, sejam nas profissões especializadas; a criação de novas armas na base da IA já aí está em alta velocidade; há quem diga que a IA vai criar uma nova ordem da matéria (digital), do mesmo modo como há 3,5 mil milhões de anos a Terra acolheu criaturas biológicas, irrompendo das ordens físico-químicas anteriores; os próximos cientistas de topo serão eles próprios sistemas de IA (Jürgen Schmidhuber); há mesmo quem faça uma leitura teológica do que está a suceder, afirmando que ao criar uma Inteligência Artificial Geral (AGI) estaremos a criar uma divindade, invertendo a narrativa bíblica de que foi Deus quem criou o mundo e a humanidade (Bryan Johnson)…Julgo que, a partir de uma perspetiva portuguesa e europeia, só podemos ser humildes e aguardar com serenidade o que aí vem, recordando, prudentemente, o aviso antes da descolagem dos aviões: fasten seat belts


Que conselho daria às pessoas para se tornarem menos passivas perante a torrente de (des)informação que temos acesso hoje em dia?
Duas perguntas kantianas podem ajudar-nos bastante. Que poderemos conhecer? Que deveremos fazer? A primeira pergunta deve conduzir-nos a um saudável ceticismo em relação à maioria das mensagens que nos vão chegando. Uma atitude crítica ajuda a compreender que vivendo numa sociedade dominada por um mercado (em vez de ser a sociedade a ter um mercado, é o mercado que domina a sociedade do hipercapitalismo, como explicou Karl Polanyi numa obra clássica publicada em 1944), a maior parte das mensagens visam condicionar-nos a comprar qualquer coisa: seja um produto, seja uma crença, até um estilo de vida, uma identidade… Se soubermos desmontar as ratoeiras que nos são lançadas, o resultado será o de nos tornarmos cidadãos mais exigentes e, eventualmente, mais interventivos. Na segunda questão, o que está em causa é uma ética prática. Todos nós temos uma certa quantidade de poder, mesmo que escassa. Se a usarmos para o cuidado, o respeito e a cortesia para com a família, os amigos, os vizinhos, e mesmo daqueles que encontramos ao longo da vida, incluindo o mundo natural, que é a nossa casa, estaremos a contribuir para um mundo menos violento e mais justo. Mesmo que o mundo esteja condenado, a verdade é que cada um de nós tem uma tarefa intransmissível, que deve ser levada a sério. Dar um sentido à vida. Fazer com que ela tenha valido a pena ser vivida.

Palavras-chave

Relacionados

Mais no portal

Mais Notícias

CARAS Decoração: 10 ideias para transformar o velho em novo

CARAS Decoração: 10 ideias para transformar o velho em novo

Do Liberation Day ao Acordo de Genebra – O que se segue?

Do Liberation Day ao Acordo de Genebra – O que se segue?

Fotografia: Os tigres de Maria da Luz

Fotografia: Os tigres de Maria da Luz

Lady Kitty Spencer regressa a Roma para o desfile de alta-costura de Dolce & Gabbana

Lady Kitty Spencer regressa a Roma para o desfile de alta-costura de Dolce & Gabbana

Indeed e Glassdoor vão despedir 1300 trabalhadores

Indeed e Glassdoor vão despedir 1300 trabalhadores

Paixão em “A Serra”: Marta e Fausto em sexo escaldante na praia

Paixão em “A Serra”: Marta e Fausto em sexo escaldante na praia

48 ideias de presentes que dão para todos - da tia difícil ao amigo

48 ideias de presentes que dão para todos - da tia difícil ao amigo

A VISÃO Se7e desta semana – edição 1707

A VISÃO Se7e desta semana – edição 1707

Pigmentarium: perfumaria de nicho inspirada na herança cultural da República Checa

Pigmentarium: perfumaria de nicho inspirada na herança cultural da República Checa

Sara Matos ousada em cenas em lingerie em “Sangue Oculto”

Sara Matos ousada em cenas em lingerie em “Sangue Oculto”

Tesla entregou menos carros no segundo trimestre do ano

Tesla entregou menos carros no segundo trimestre do ano

A VISÃO Se7e desta semana – edição 1708

A VISÃO Se7e desta semana – edição 1708

Camilla celebra 78.º aniversário

Camilla celebra 78.º aniversário

A poesia que sai à rua em Salvador

A poesia que sai à rua em Salvador

O futuro da energia é agora

O futuro da energia é agora

Ovos

Ovos "ilibados" no caso do colesterol

Reportagem na selva mágica da Amazónia

Reportagem na selva mágica da Amazónia

Parque Marinho Luiz Saldanha: Um mar abençoado, nas palavras e imagens do multipremiado fotógrafo Luís Quinta

Parque Marinho Luiz Saldanha: Um mar abençoado, nas palavras e imagens do multipremiado fotógrafo Luís Quinta

Os 40 atores negros mais famosos de Hollywood

Os 40 atores negros mais famosos de Hollywood

Samsung vai lançar smartphone dobrável tríptico até final do ano

Samsung vai lançar smartphone dobrável tríptico até final do ano

CARAS Decoração: 10 espreguiçadeiras para aproveitar o bom tempo

CARAS Decoração: 10 espreguiçadeiras para aproveitar o bom tempo

Stella McCartney: designer distinguida na Nat Gala

Stella McCartney: designer distinguida na Nat Gala

A VISÃO Se7e desta semana – edição 1709

A VISÃO Se7e desta semana – edição 1709

José Luís Peixoto na (des)conhecida Coreia do Norte

José Luís Peixoto na (des)conhecida Coreia do Norte

Famosos brilham na apresentação da nova temporada da TVI

Famosos brilham na apresentação da nova temporada da TVI

Sede da PIDE, o último bastião do Estado Novo

Sede da PIDE, o último bastião do Estado Novo

Parabéns, bicharada!

Parabéns, bicharada!

Rainha Letizia celebra 53.º aniversário

Rainha Letizia celebra 53.º aniversário

Vendas da Tesla na Europa estão em queda

Vendas da Tesla na Europa estão em queda

Vasco Futscher - O mundo inteiro em cada forma

Vasco Futscher - O mundo inteiro em cada forma

Carlos Areia faz 80 anos! Veja 80 fotos do ator

Carlos Areia faz 80 anos! Veja 80 fotos do ator

Segway apresenta série de trotinetes elétricas Ninebot E3

Segway apresenta série de trotinetes elétricas Ninebot E3

Salgueiro Maia, o herói a contragosto

Salgueiro Maia, o herói a contragosto

E se os refugiados do clima formos nós?

E se os refugiados do clima formos nós?

25 peças para receber a primavera em casa

25 peças para receber a primavera em casa

Infeções respiratórias como Covid ou a gripe podem

Infeções respiratórias como Covid ou a gripe podem "acordar" células cancerígenas adormecidas nos pulmões

Quis Saber Quem Sou: Será que

Quis Saber Quem Sou: Será que "ainda somos os mesmos e vivemos como os nossos pais?"

Repórter Júnior: Entrevista a Luísa Ducla Soares

Repórter Júnior: Entrevista a Luísa Ducla Soares

A fruta comum que têm mais de 1600 elementos e que os cientistas querem ver reconhecida como

A fruta comum que têm mais de 1600 elementos e que os cientistas querem ver reconhecida como "superalimento"

António Casalinho: ninguém o pára

António Casalinho: ninguém o pára

Microsoft revela poupanças de 500 milhões com Inteligência Artificial, depois de despedir nove mil

Microsoft revela poupanças de 500 milhões com Inteligência Artificial, depois de despedir nove mil

Pavilhão Julião Sarmento - Quando a arte se confunde com a vida

Pavilhão Julião Sarmento - Quando a arte se confunde com a vida

Na CARAS desta semana - Edição especial viagens: Os melhores destinos para umas férias de sonho em hotéis e

Na CARAS desta semana - Edição especial viagens: Os melhores destinos para umas férias de sonho em hotéis e "resorts" de Portugal

Vencedores e vencidos do 25 de Abril na VISÃO História

Vencedores e vencidos do 25 de Abril na VISÃO História

Cosentino inaugura o Cosentino City Porto e reforça a sua presença em Portugal

Cosentino inaugura o Cosentino City Porto e reforça a sua presença em Portugal