E se de repente deixássemos de ter um ‘patrão’ interior e decretássemos a liberdade de princípios? Já podíamos…
– Ver televisão – Pois, toda a gente diz que estamos a ficar insensíveis, acomodadas, balofas, sem vida familiar e com filhos parvos devido ao maldito vício do sofá. E é verdade. Mas quem não chega a casa e vê uma telenovela, um concurso, uma série, umas notícias, que atire o primeiro comando. O pior e o melhor do mundo estão na televisão: aproveite o melhor. Já está sobejamente estudada a forma como a televisão nos devora os neurónios, mas já alguém estudou os anos de sanidade que nos preservou? Quantos de nós não chegámos a casa de rastos e nos animámos com qualquer coisa que vimos na televisão? E nem sequer é só uma questão de evasão. Quantas vezes um programa nos instruiu, nos fez rir, nos fez pensar, nos tornou pessoas melhores, mais cultas, mais sensíveis, mais atentas? Cada vez menos? Talvez, mas é uma questão de saber escolher. Ah e desligue a televisão à hora do jantar… E não se encher de bolinhos enquanto vê a Oprah.
– Comer chocolate – Está na moda apregoar as virtudes do chocolate – e com razão. Desde magnésio até polifenóis e vitamina E, o chocolate é um poderoso antidepressivo e há mesmo investigações a jurarem que ele ‘imita’ muito bem os efeitos de uma paixão. Por isso, mais vale comer chocolate do que ficar no sofá a chorar porque o Zé Carlos a trocou pela lambisgóia da Sandra Patrícia. Mas cuidado: todos estes estudos se referem ao chocolate preto. Preto! Aquele com pouquinho açúcar! Não os bombons com licor nem as tabletes com três camadas de nougat e caramelo onde afogamos as mágoas. E mesmo o preto, é para comer um quadradinho por dia. Não uma tablete inteira. Enfim, é melhor que nada. Ah, já agora: não o partilhe com o seu cão. É que para eles sim, o chocolate é um veneno e não há aeróbica que os salve.
– Pensar primeiro em si própria – Como dizia Rui Zink, as crianças precisam de pais egoístas: se não está de bem consigo, não vai ter nada para dar às suas crianças. A psicanalista suíça Corinne Maier, autora do ‘bestseller’ ‘No Kids’, fala da enorme pressão que hoje sofrem as mães para serem super-mães, e já afirmou que “bons pais precisam de cultivar uma certa indiferença em relação aos filhos”, ou seja, o excesso de preocupação materna priva a criança da liberdade necessária para crescer e ainda torna os pais angustiados pela falta de tempo para si próprios.
– Dormir a sesta – Somos o país com mais falta de sono, e no entanto, na nossa cultura, quem se deita às 10 da noite é mais troçado, insultado e desprezado do que alguém com um sério defeito de personalidade. Ir cedo para cama significa que a pessoa troca ir para os copos, estar na net, desenvolver um caso com o Rodrigo da contabilidade, ter sexo selvagem com algemas de veludo vermelho ou fazer bolo de chocolate com pepitas por… dormir. No léxico português, dormir ainda equivale a não fazer nada. E dormir a sesta então atinge grau muito mais elevado de insanidade, sendo que em vez de se gastar a noite, desperdiça-se logo de uma assentada uma preciosa tarde inteira! Depois estranham que os portugueses sejam o povo europeu que mais gasta dinheiro em comprimidos para dormir. Afinal, dizem todos os estudos, dormir é do melhor que há. A saúde humana assenta em três pilares: alimentação, exercício e sono. Uma simples sesta de 20 minutos aumenta a produtividade, a memória, a concentração e, dizem os estudos mais recentes, protege o coração! Porquê? É que o sono, a qualquer hora do dia, actua como uma válvula de escape para o stresse. A sesta funciona, assim, como uma poderosa protecção. Por isso, deite-se e durma sem remorsos, quando e quanto lhe apetecer. Ainda lhe vai restar muito tempo para viver bem a vida.
– Ser stressada – Há stresse mau, mas pode haver também stresse bom. Em pequenas doses dá energia à nossa vida, mantém-nos alerta, melhora a capacidade de memória e de raciocínio, e ajuda-nos a completar tarefas difíceis. São as hormonas e os químicos que nos gritam ‘foge, idiota!’ que nos ajudam a ter o relatório pronto, o exame feito, um dia difícil bem resolvido. O stresse não é só o assassino silencioso do costume: também pode dar sal à vida e ajudar-nos a resolver tarefas para que precisamos do nosso potencial máximo. No tempo da pré-história, o nosso potencial máximo era posto em prática quando o bisonte vinha atrás de nós. Hoje em dia, na falta de bisontes (ou pelo menos, dos bisontes das pradarias) pomos todo o nosso melhor nas nossas tarefas mais difíceis, seja ter um filho ou realizar um teste difícil. Em resumo, ontem como hoje, o stresse existe para nos ajudar a sobreviver. Claro que é um bom criado mas um mau patrão: se deixarmos que nos comande a vida, estamos feitas. Se soubermos servir-nos dele, pode manter-nos alerta. É a diferença entre um desastre de automóvel e uma montanha-russa…
– Ser imperfeita – Ensinaram-nos desde pequeninas (e se não nos ensinaram, aprendemos sozinhas mesmo) que tínhamos de ser boas em tudo: excelentes mães, esposas irrepreensíveis, namoradas sensuais, cozinheiras melhores que a Maria de Lurdes Modesto e com medidas de fazer inveja à Gisele Bundchen. Ah, e se possível louras. Espertas. Com sentido de humor. E o software do kamasutra incluído. E energia para sair à noite. Se tivéssemos alguns defeitos, seriam poucos e escolhidos, assim tipo a teimosia, que toda a gente acha que é, porque toda a gente acha que não é defeito nenhum. Sabe que mais? É humanamente impossível e se pensarmos bem, nem sequer é desejável. Que graça teria uma pessoa perfeita? Afinal, são as nossas pequenas imperfeições que nos tornam quem somos. Há quem diga mesmo que são as nossas pequenas imperfeições que tornam possíveis as nossas (grandes) perfeições. Por isso, seja imperfeita. Claro que convém que os defeitos não lhe arruínem a vida nem a dos outros. Tirando isso, força. Seja um bocadinho gulosa. Ligeiramente estrábica. Com tendência para acordar mal disposta. Para se rir quando não deve. Para deitar demasiada pimenta na salada. Para ser vingativa. Não, não perdoa, e depois? Ria-se muito de si própria, e tudo estará bem.