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KatarzynaBialasiewicz

A propósito da 7ª edição das Hair Fashion Weeks, que está nas ruas até 25 de março nos 27 salões da Jean Louis David Portugal, fomos falar com quem está no terreno e trata a doença do cancro da mama em proximidade. Até ao final da campanha poderá estar a apoiar a investigação científica nesta área com um simples corte de cabelo ou uma nova colaração. Mas em que evidência científica nos apoiamos para considerar esta patologia importante na atualidade?

A verdade é que, apesar de a maioria dos casos serem diagnosticados numa fase inicial, a doença apresenta uma taxa de metastização de 30-35%, comprometendo a qualidade de vida das doentes. “Isto representa um número muito elevado. Nós queremos estudar as terapêuticas, melhorar a sua utilização e identificar os doentes que mais irão beneficiar delas”, explica Sandra Casimiro, que trabalha a pensar no futuro, para que ele seja uma realidade para muitas mulheres enssombradas pela doença. É investigadora pós-doutorada no Laboratório Luís Costa do Instituto de Medicina Molecular João Lobo Antunes (iMM) desde 2007.

Dos sete projetos em funcionamento no Fundo iMM-Laço, Sandra Casimiro tem a seu cargo um em particular. Corre atrás de uma “promessa” chamada proteína RANK, que existe de forma anormal nas células e que pode ser inibida farmacologicamente. Está amplamente associada à metastização óssea, a tipologia mais frequente no cancro da mama metastizado que afeta 30% das doentes. Perspetiva, dia-a-dia, poder tornar cronicidade da doença em realidade, como se de um caso de diabetes ou de hipertensão se tratasse, assim esteja preparada a mentalidade dos portugueses para ver a patologia pelo mesmo prisma.

Para isso, importa que haja medicação tolerável e eficaz. “As mulheres não morrem de cancro da mama localizado. Quando o tumor tem a capacidade de se espalhar por outros órgãos do nosso corpo, é aí que vai causar a morte. Como é que podemos aferir se uma mulher tem risco dessa ocorrência? Nem todas as mulheres com cancro da mama localizado fazem novo tratamento após a cirurgia, seja radioterapia ou quiomioterapia. Nem todas são elegíveis para esse tratamento: é feita uma aferição do risco dessa mulher vir a ter uma metástase. Se o risco for considerado elevado, existe um tratamento preventivo”, esclarece Sandra Casimiro.

O objetivo do seu trabalho passa por compreender se esta proteína permite ou não distinguir as mulheres que mais irão beneficiar das terapêuticas mais atuais. “Existem vários inibidores, fármacos de última geração muito eficazes, mas ainda há casos de mulheres que apresentam muita resistência e isso poderá estar relacionado com a presença desta proteína e estamos a estudar isso”, justifica a investigadora.

Esse é, precisamente, um dos maiores desafios que o cancro metastático impõe: a aquisição de resistências. “Começamos a tratar um cancro e, inicialmente, este ‘responde’. Depois desenvolve resistência àquela terapia e ela deixa de ser eficaz. Tem de se passar a fazer outras terapias, conhecidas como linhas terapêuticas”, continua.

Não há dois tumores iguais, muito menos quando falamos de partes do corpo humano distintas. É fácil pensar em prevenção primária quando se trata do cancro do cólon e reto, o mesmo não se pode dizer quando se trata de cancro da mama. “É muito difícil dizer quem são os 30% que vão recidivar. É super stressante porque os outros 70% nunca sabem qual vai ser o dia de ir aos exames anuais em que vão receber a notícia. Não temos maneira de dizer ‘olhe, faz parte do grupo dos 30% e temos um tratamento para si que trava completamente aquilo’”, alerta Lynne Archibald, do Fundo iMM-Laço. Pese embora haja o rastreio do nódulo da mama, no futuro acredita que o que terá força é o rastreio genético, “potencialmente muito antes de aparecer o nódulo ou talvez aliando uma vacina que ainda não foi descoberta. É claro que é sempre melhor fazer o rastreio do nódulo e encontrá-lo, mas nós achávamos que isso ia resolver o problema e infelizmente não é solução”.

Quando os rastreios eram motivo de esperança

Lynne recorda que há 25, 30 anos, o rastreio massificado era motivo de esperança para todos: “Tanto na Laço como no resto do mundo acreditámos que o número de mortes ia começar a diminuir. E foi essa a razão principal pela qual criámos o Fundo IMM, que tem uma vertente diferente, de 100% de apoio à investigação. Em Portugal percebemos que não só o número de mortos não estava a baixar como havia mais casos. Nós sentimos – e começaram a sair estudos em todo o mundo a comprová-lo – que o impacto do rastreio não estava a ser o esperado. Portanto, é importante detetar mais cedo, manter a cirurgia conservadora, mas não é a solução. Daí a importância da investigação.”

Contudo, a representante do Fundo iMM-Laço reconhece méridos ao rastreio anual que, apesar de tudo, permite que “os 30% não sejam 50% ou mais”. Sem isto, alguns casos não seriam detetados e a massificação tornou possível detetar nódulos ainda pequenos e impedir o seu desenvolvimento.

A explicação da doença

Não é exatamente possível atribuir fatores de risco determinados ao cancro da mama. Segundo Sandra, “genericamente, os cancros são doenças da idade. Aparecem porque as células adquirem mutações que as tornam diferentes das outras, o que lhes permite viver, crescer, sobreviver e resistir. Isto sucede porque as mutações se vão acumulando, portanto quanto mais vezes a célula se dividir, mais isto acontece”. Contudo, os fatores de risco conhecidos são, como habitualmente, a idade, o sexo (com prevalência para o sexo femino, apesar de serem identificados alguns casos em homens) e a exposição aos estrogénios: ter a menarca mais cedo ou a menopausa mais tarde, ter tido ou não filhos, ter ou não amamentado e a utilização de contracetivos orais de substituição. “Em cerca de 80% dos casos, o cancro da mama alimentação dos estrogénios para ‘crescer’”, explica Sandra. Não poderia, certamente, ser esquecido o peso do histórico familiar, em que há uma alocação de determinadas proteínas, que fazem com que as células não consigam reparar essas mutações logo de início, desde o próprio nascimento. Quando falamos de cancro da mama hereditário, com mutações genéticas BRCA 1 e 2, a situação não é controlável, e o exemplo público mais famoso é o de Angelina Jolie.

A cada cancro sua sentença

Quando uma mulher é submetida uma cirurgia desta ordem, o objetivo de eliminar o cancro pode até ser bem sucedido, mas não é possível localizar células espalhadas noutros órgãos, independentemente de serem únicas ou de se aglomerarem. É preciso fazer um compasso de espera. Aí, é preciso perceber se o risco de recidiva é inferior ao benefício do tratamento, que é asumidamente agressivo. Em caso afirmativo, a investigadora defende que “não se justifica fazer o tratamento. Mas não é muito fácil aferir este risco”.

Aliada a esta dificuldade acrescem os chamados outliers, o mesmo é dizer os casos improváveis: mulheres com elevado risco de recidiva que (felizmente) nunca recidivam, por exemplo. “Há projetos que consistem em desenvolver métodos para personalizar a forma de aferir esse risco, personalizando as ferramentas e adaptando melhor a terapêutica. Quando fazemos uma análise molecular também sabemos que cada cancro da mama é único e que cada cancro tem as suas ‘peças’.”

Questionada sobre se a opinião dos portugueses estará ou não preparada para ver a doença por este prisma, a investigadora admite que a palavra “cancro” tem um certo estigma associado e que é, evidentemente, uma palavra muito forte e que dificilmente se dissocia de uma outra mais dura e pesada: a morte. Não é por acaso que muitos preferem descrever o desfecho das histórias dos outros recorrendo à expressão “doença prolongada”.

Ser mulher e ser cientista: uma dupla responsabilidade?

À primeira vista, será fácil de supor que Sandra sente o “peso” do seu trabalho, ou não fosse uma mulher que investiga o futuro de tantas outras mulheres. “Eu trabalho num grupo de investigação clínica o que significa que não faço investigação centrada no laboratório sem contacto com os doentes. O Prof. Doutor Luís Costa, responsável pelo grupo, é também diretor do Serviço de Oncologia do Hospital de Santa Maria (CHLN). Temos um contacto muito próximo com o serviço e os próprios doentes. Não diria todos os dias, mas dia sim, dia não, vou ao serviço ou passo na sala de espera. Conheço muitos doentes e trabalho com muitas amostras relacionadas com eles”.

Explica ainda que, quando analisa as ditas amostras, tem presente que estas dizem respeito a mulheres e a famílias e que isso só a faz valorizar ainda mais todos os recursos. “Essencialmente, acho que nos dá maior responsabilidade na investigação. Aquilo que nós fazemos implica utilizar recursos que são muito preciosos e têm de ir ao encontro das expetativas dos doentes. Não é o mesmo que trabalhar só com modelos laboratoriais em que, se a experiência não correr bem, repete-se. Não acho que haja uma pressão acrescida. Trabalho ali há 11 anos e aquilo que mais quero é que, na clínica, o Prof. Doutor Luís Costa, possa dizer ‘encontrámos em laboratório algo que pode ajudar os nossos doentes aqui’. É este o nosso combustível”, defende Sandra.

Stop! Sinais e sintomas a que deve estar atenta

Nas palavras de Lynne, não faz sentido falar apenas do autoexame da mama, particularmente porque isso implica que a mulher saiba e aprenda a fazer. Há algo mais profundo e necessário nesse conhecimento. “Aquilo que se pretende é que, todos os dias, se vá conhecendo o corpo incluindo a mama. Todos tomamos banho, pomos creme e vestimo-nos. Então, é só passar a mão na mama e, se há algum nódulo ou corpo estranho, ou simplesmente alguma coisa diferente (como por exemplo a pele ter ficado ondulada, uma vermelhidão que não passa ou algo que simplesmente está diferente) é sempre importante falar com o médico. Essa é a melhor opção. Na maioria dos casos, felizmente, não é nada, mas é importante falar com o médico”, recorda.

Não esquecer, é claro, que a partir dos 50 anos é necessário fazer uma mamografia de dois em dois anos, estar mais atento ao corpo e “tratá-lo bem”. Para a responsável do Fundo IMM-Laço isto significa “não necessariamente a prática de exercício físico, mas manter uma vida ativa, que não seja sedentária. Tratar bem implica também bem não fumar, minimizar o álcool, tratar com carinho e estar atento”. Outro desafio é estender esse ímpeto na alimentação. “Temos três refeições por dia mais um snack e, por isso, temos o controlo sobre o que nós comemos, devemos optar por coisas melhores, desafiar o corpo”, destaca.

A divulgação tem marcado o trabalho da equipa. Porque quanto mais informação antes, durante e depois dos processos, maior a capacidade de enfrentar o problema. “Estamos a tentar tirar a palavra “cancro” do armário e falar, daí a importância destas campanhas que põem as pessoas falar. Hoje em dia, as coisas estão muito melhores porque as pessoas falam do assunto.” Quando aproveitar esta campanha lembre-se que cada ‘tesourada’ é um corte com o historial da doença; cada colaração é o pintar de um futuro de esperança para estas (e todas as outras) mulheres.

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