No ano passado, a L’Oréal Paris elegeu a Miss Second Life L’Oréal Paris Glamour, que ganhou um ano de produtos de cosmética grátis.
Até aqui nada de novo. Mas se eu lhe disser que, neste evento particular, as candidatas não existem, isto é, não são de carne e osso, mas bonecas virtuais… aí tudo muda de figura. A vencedora é, pois, uma dos cerca de quatro milhões de residentes (0,39% são portugueses) que habitam a comunidade virtual 3-D Second Life (SL), criada em 2003 pela Linden Labs. As mulheres que ‘vivem’ nesta sociedade online (40% do total) são quase todas potenciais top models, já que a aparência e as medidas de sonho estão democraticamente disponíveis à distância de um clique. E para as evidenciar, existem lojas suficientes para encher vários Colombos. Sim, porque a SL tem moeda própria (linden dólares), que pode ser trocada por dólares reais. Eu ‘recriei-me’ neste mundo de faz-de-conta tão real e conto-lhe como é.
Sou uma sem-abrigo
Uma lição importante: escolha bem o seu nome ao entrar no Second Life. Eu, por exemplo, sou a Sexycat Allen e, com este nome, temo nunca vir a ser levada a sério nesta trama virtual.
Até porque não tenho casa (ou seja, não quis gastar dinheiro a comprar uma). E a roupa que trago no corpo foi a que me deram no início. Mas, cá entre nós, dotei-me de formas muito mais generosas e nem precisei de cirurgia estética! Além disso, decidi tornar-me brunette, o que é, ao que parece, actualmente muito chique.
Moda e beleza virtual
Dinheiro bem real
Algumas pessoas gastam muito dinheiro na aparência dos seus ‘bonecos’. ‘Criar estilos para as personalidades virtuais (‘avatares’) é talvez o segundo negócio mais lucrativo da SL’ (o primeiro é o mercado imobiliário). Eu própria já investi cerca de 1500 dólares em compras para a minha personagem.’ Quem o diz, em entrevista à ACTIVA, é Celebrity Trollop, directora da revista ‘Second Style’, que tem como alvo cerca de 13 mil leitores…que não existem. E embora o download da revista seja de graça, a publicidade é paga.
A edição de Fevereiro, com 70 páginas, rendeu cerca de 800 dólares bem reais. As marcas mais populares? ‘Last Call, Celestial Studios, ETD, Nyte ‘n’ Day, Mischief, Blaze, Simone e Pixel Dolls são só algumas’, explica Celebrity. O mundo da moda e da beleza é tão importante na comunidade que a personagem Natalia Zelmanov foi recentemente eleita a Miss Second Life 2007.
Brincar às compras
Entrei na loja virtual da cadeia American Apparel, mas consegui resistir. Ainda fiquei a olhar para umas leggings de algodão… Está bem, não eram caras, cerca de 1 dólar, mas considerando que nunca iriam aparecer no meu guarda-roupa na vida real… segui em frente sem olhar para trás… Para ter uma ideia, uns ténis da Adidas custam alguns cêntimos, um chapéu com 2500 pedras de ametista, quartzo rosa e cristais Swarovski, da estilista canadiana Nyla (que existe realmente mas que decidiu ‘abrir’ uma loja na SL), pouco mais de cinco dólares… Mas, a brincar a brincar, só em Fevereiro deste ano, a SL somou quase nove milhões de transacções comerciais.
Oportunismo político destrói sonho de utopia
A Second Life é também uma boa plataforma para o marketing político.
A candidata às presidenciais francesas Ségolène Royal já abriu uma sede de campanha virtual, assim como Obama Barack, candidato democrata a Presidente dos Estados Unidos.
Na esfera diplomática, a Suécia vai ser o primeiro país a abrir uma embaixada na SL. Com isso, o governo sueco espera aumentar o turismo. E não deve demorar muito até vermos as mansões dos residentes decoradas com artigos Ikea.
As sete vidas da solidariedade
As organizações não governamentais (ONG) também já descobriram a Second Life. Em 2006, a American Cancer Society angariou (verdadeiramente) mais de 40 mil dólares.
Estive na sede virtual daquela organização e fotografei uma espécie de memorial que homenageia algumas vítimas de cancro, também elas bem reais. Fiquei impressionada, embora confesse que não dei o meu contributo. Mas fica a promessa de que o farei na minha próxima incursão virtual. Não visitei a Better World Island, onde se encontra o Camp Darfur e outras organizações de solidariedade social.
Não querendo pôr em causa o espírito benemérito dos residentes, a verdade é que isso contribui para a sua popularidade.
Existe um ‘sistema de reputação’, em que cada pessoa é avaliada pelas outras da comunidade.
Gigabytes de ciúmes
Há cada vez mais pessoas a casarem-se na Second Life.
Bem, talvez não fosse má ideia! Afinal, podemos sempre ‘desligar’ o marido. ‘Os casamentos são cada vez mais populares na SL, o que levou à necessidade de haver empresas especializadas nestes eventos’, explica à ACTIVA Catherine Smith, directora de Marketing da Linden Lab. E segundo uma residente escreve num dos muitos blogs dedicados a esta comunidade, as relações são levadas bastante a sério. ‘A competição resulta muitas vezes em níveis ridículos de ciúmes e possessão. Fiquei chocada com a seriedade com que as pessoas encaram estas relações e com a intensidade com que vivem neste mundo paralelo.’