Primeiro, percorre-se o caminho entre ruínas e só depois se avista a casa, assumidamente moderna. Quando os actuais proprietários adquiriram o terreno, com 3500 metros quadrados e uma antiga casa rústica, vivia ali um casal de velhotes e 300 galinhas. O mato era tanto que ocultava a maior parte da propriedade, constituída por leiras que rasgam o monte até à estrada principal, e grande parte ainda estava queimado de um incêndio. E foi nestas condições que o arquitecto e a decoradora pegaram no projecto.
"Aproveitámos para construir a história da casa antiga e da nova", diz Isabel Santos, decoradora e proprietária da Empatias, no Porto. Nesta perspectiva, o arquitecto Zulmiro Pereira optou por conservar as paredes de pedra sem telhado, deixando um pouco do estuque à vista para não apagar a memória da velha casa pintada a azul-turquesa. "Na altura, ainda chegámos a pensar em recuperar o edifício primitivo, mas como era pequeno o arquitecto lembrou-se de deixar as ruínas intactas, que assim antecedem a casa propriamente dita." A casa, nas proximidades de Vila Verde, tem uma área total coberta de 286 metros quadrados e os seus interiores foram pensados de modo a contemplar amplas zonas sociais e um corredor aberto aos quartos, funcionalidade desde sempre desejada uma vez que os proprietários recebem muitas visitas.
Outra característica da casa, e que em muito a beneficia, é o facto de todas as áreas estarem voltadas para a natureza, quer para os socalcos em frente, para onde dão as salas e quartos, quer atrás, alternando a cozinha e cada casa de banho com pátios interiores a céu aberto. A ideia dos pátios interiores, bem como a de separar a zona social e os quatro quartos projectando a cozinha e casas de banho para outro corredor, foi do arquitecto. As casas de banho beneficiam de clarabóias sobre os lavatórios e janelas em cada lateral, aproveitando a luz dos jardins interiores.
O mesmo acontece com a cozinha, com portas abertas aos pátios.
No terreno abundam plátanos um dos quais muito próximo da zona de estar. Daí o muro larguíssimo, para suportar as raízes. Na leira abaixo espraia-se a piscina, que sobressai do amplo relvado e mata envolvente. "Concebemos uma casa que contrastasse o mais possível com as ruínas. Nos interiores, também contrastámos alguns materiais. É o caso da parede em cerejeira, à entrada das salas, que vai dar aos quartos, do pavimento em plátano ou do rodapé da sala de jantar, em madeira, em oposição ao betão…" Inclusive, a parede-biombo de betão que marca a entrada foi pensada para desenhar um caminho contemporâneo que contrasta com o percurso inicial entre ruínas, lá fora.
Esta levou um acabamento especial, que lhe dá o aspecto rústico do cimento, acabamento esse que se repete na parede do fogão de sala, que separa a zona de jantar da de estar, e em colunas pontuais que sustentam o amplo vão. Por outro lado, os pilares em ferro equilibram o tecto da sala, cujo vão mede cerca de 16 metros. "Quisemos ainda tirar partido, em termos arquitectónicos, das colunas em betão. E esta solução resultou por acidente", conta o arquitecto. "Os construtores decidiram betonar a placa e depois perceberam que era muito pesada. Foi o próprio engenheiro que aconselhou esta estrutura para sustentar o vão gigantesco." Quanto à cozinha, delineada como kitchenette no início, é hoje um exemplo das que víamos antigamente nas casas de aldeia, tendo o balcão em betão como elemento diferenciador.