Ruas vazias, pessoas que saem juntas, mas respeitam a distância de segurança, animais que se aventuram pelas estradas, agora sem carros. Cidades tomadas pelo silêncio. Esta é a nova realidade da Polónia em tempos de pandemia.

O país, que tem 38 milhões de habitantes, regista quase 12 mil casos de contaminação pelo novo coronavírus e um total de 535 mortes (até ao momento da publicação deste artigo). Marta Roszewska vive na capital,  Varsóvia, e trabalha na área das relações públicas e da comunicação, mais especificamente para a indústria da moda. A jovem levava “uma vida bastante descontraída”, que, tal como tantas outras, sofreu mudanças drásticas com as restrições impostas pelo governo – ao qual não poupa críticas. 

“As decisões são tomadas pelos políticos, e não pelos especialistas. O grande problema é que os políticos estão a usar esta situação para fazer campanha para as próximas eleições, o que é revoltante,” conta-nos. No meio do fogo cruzado está um sistema de saúde com vulnerabilidades, que estão cada vez mais à vista.

Marta Roszewska

Que medidas de distanciamento social estão em vigor na Polónia?
As lojas, os centros comerciais, os restaurantes e todos os tipos de atrações culturais estão encerrados até nova ordem. Os eventos públicos foram cancelados, as pessoas têm de usar máscaras na rua e manter uma distância de dois metros entre si. Na última semana de abril, o governo vai decidir se entramos numa segunda fase da quarentena, com mais lojas abertas, a possibilidade de haver um maior número de pessoas em espaços fechados e a reabertura de hotéis, algumas bibliotecas e museus.

Consideras que tem sido feito um bom trabalho no combate ao surto pandémico?
O surto pandémico mostrou-nos as verdadeiras fragilidades do nosso sistema de saúde. Estamos a enfrentar um grande problema, que é o facto de os hospitais estarem a ficar sem equipamento médico essencial. A segunda questão é o número relativamente baixo de testes disponíveis. Tenho a certeza de que o número real de pessoas infetadas é muito superior ao que foi divulgado.

Como é que os polacos estão a encarar a situação?
No início, as pessoas não levavam o o coronavírus a sério. Apesar de tudo estar fechado, ainda conviviam na rua sem manter a distância necessária e isso apertou rapidamente as restrições da quarentena. Sinto que, tal como tantas outras pessoas, especialmente em Varsóvia, o foco está em ajudar os mais necessitados. Estamos a tentar certificar-nos de que os vizinhos – com atenção especial aos idosos – têm tudo aquilo de que precisam para sobreviver a estes tempos. Isso aquece-me o coração.

AINDA POSSO FAZER AS MESMAS COISAS, MAS ONLINE. O PROBLEMA É QUE ISSO NUNCA VAI SUBSTITUIR O CONTACTO A SÉRIO COM PESSOAS”.

No teu caso, é possível estar em regime de teletrabalho?
Eu sou uma das pessoas sortudas que pode trabalhar em casa, embora muitos dos nossos projetos tenham sido adiados ou cancelados. Eu trabalho numa agência criativa e, maioritariamente, tenho as relações públicas de marcas de moda a meu cargo. Acompanho de perto o quanto a indústria está a mudar por causa do surto pandémico.
Nós estamos a tentar adaptar-nos à nova realidade e ter ideias que ajudem os nossos clientes. Também nos focamos em artistas freelancers, que estão a enfrentar grandes problemas financeiros, porque os apoios do governo são escassos. 

Como é ter de sair de casa em tempos de quarentena?
Eu só saio de casa para comprar bens essenciais, ir ao veterinário com o meu gato ou dar passeios higiénicos. No início, as pessoas agiam como loucas no supermercado. As prateleiras estavam completamente vazias e era difícil ter acesso a coisas como, por exemplo, papel higiénico ou massas. Agora, as coisas estão mais tranquilas, porque a população percebeu que o abastecimento dos supermercados está assegurado.

Como é que tu, especificamente, estás a lidar com a quarentena?
Eu vivo sozinha, o que tem aspetos positivos e negativos. Faço videochamadas com os meus amigos e com a minha família todos os dias, que são as pessoas de quem tenho mais saudades, para saber deles. Às vezes, sinto-me sozinha, mas penso que toda a gente está a passar pelo mesmo.

Que lição estás a aprender com o isolamento?
Acima de tudo, respeito pelo nosso planeta. Mesmo antes da pandemia, eu tentava ter hábitos sustentáveis, mas acho que a situação despertou uma consciência ainda maior em mim. Estou muito entusiasmada com todas as mudanças que vão surgir no mundo da moda, porque tenho a certeza de que os clientes vão estar mais atentos aos produtos que compram e vão levar as marcas a procurar soluções de produção mais sustentáveis. Espero que estes tempos nos ensinem algo e que provemos que merecemos uma segunda oportunidade.

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