Mariana Monteiro é um rosto bem conhecido do público português. Aliás, cresceu diante dos nossos olhos. Começou a entrar nas nossas casas em 2005, quando tinha apenas 16 anos, como a personagem “Bia”, na terceira temporada da série juvenil “Morangos com Açúcar”. Entretanto, a menina virou mulher e fez da luta por um mundo mais justo e igualitário uma das suas missões.
Além de ser o rosto de várias campanhas relacionadas com o tema, lançou os livros “Mariana num Mundo Igual” (2015) e “Mariana no Caminho da Igualdade” (2018), ambos para crianças do primeiro ciclo, “uma vez que é nestas idades que pretendemos que ganhem consciência das suas liberdades de escolha e de como a sociedade nos vai formatando,” explica no Instagram. E o trabalho não fica por aí. Faz também visitas a escolas por todo o país e, recentemente, participou na iniciativa “Hora do Conto”, no GuimarãeShopping, que permitem levar para junto dos mais pequenos temas como a igualdade de género e de oportunidades.
A ACTIVA falou com a atriz, de 30 anos, sobre feminismo, as causas que a inspiram e os avanços que já fizemos (e ainda temos de fazer) enquanto sociedade, entre outros assuntos.
Veja a entrevista completa, abaixo.
O que é ser feminista em 2019?
É saber que já não estamos no início da luta, mas que ainda há um longo caminho a percorrer. A igualdade entre homens e mulheres, a nível familiar social e político, ainda está longe de ser alcançada e temos que ter consciência disso.
Na sua opinião, “feminista” é uma palavra que intimida?
Sem dúvida. É uma palavra que, para começar, muita gente desconhece o verdadeiro significado. Ser feminista é ser consciente de que é ainda necessário um ativismo constante pelas causas da igualdade de género, de raças, religiões, etnias… Ser feminista é querer dizer em voz alta que ainda não somos uma sociedade igualitária e que é nosso dever lutar para que seja alcançada essa igualdade de direitos e oportunidades.
Quando e como é que despertou para a questão da igualdade de género?
Relativamente cedo, porque o meu pai é sociólogo e trabalhou durante alguns anos na atual Comissão para a Cidadania e a Igualdade de Género (CIG), quando ainda se chamava Comissão para o Direito e Igualdade das Mulheres. Mas foi sobretudo em 2015, quando a convite das Nações Unidas fui champion para a igualdade de género e durante esse ano tive a oportunidade de estudar e pesquisar muito mais sobre este assunto, ampliando assim a minha consciência para esta problemática. A minha função consistia em divulgar ao máximo o tema ao longo desse ano.
Este é um tema tão ou mais relevante agora do que era em 2015, quando lançou o livro “Mariana num Mundo Igual”?
Em quatro anos não se conseguem mudanças profundas, portanto continua a ser tão relevante quanto era em 2015. O que precisamos é de manter este assunto constantemente na ordem do dia. Seja entre amigos, familiares, no local de trabalho ou com ações como aquela em que participei recentemente no GuimarãeShopping, onde participei na “Hora do Conto” e estive a ler o meu livro para um grupo de crianças.
O que ainda há por fazer (ou o que é mais urgente)?
É urgente apelar ao sentido cívico de cada pessoa, não só pela necessidade de aumentar o debate e diálogo sobre temas importantes que atingem o país e o mundo, para que se reduzam os números de abstenção nas próximas eleições. Incentivar a camada jovem a manter – se informada para que possamos, de facto, evoluir e caminhar para um lugar onde possamos lutar com sucesso.
Os homens estão à margem desta luta?
À margem não diria, porque a causa não estaria a avançar tão bem. Nenhuma luta se faz sem um coletivo que possa estar a representar várias esferas da sociedade. Os homens também têm muito a beneficiar com a desconstrução dos padrões e estereótipos de género. Pode ser frágil, pode e deve mostrar a sua vulnerabilidade, não tem que ser o chefe de família. Mas precisamos que se façam notar mais ainda.
O que é que eles podem fazer para estarem mais envolvidos?
Fazer como faz por exemplo um humorista e ativista que se tem envolvido bastante, que é o Diogo Faro. Portanto mostrarem publicamente que estão também com vontade que a sociedade evolua neste sentido em que possa ser alcançada a igualdade de oportunidades. Trazendo o tema à discussão.
Que aspetos da nossa cultura passam imagens erradas às crianças?
Temos o caso dos desenhos animados, onde a princesa é sempre salva pelo príncipe, salvo raras exceções como é o caso do filme de animação “Entrelaçados”, em que ela é que o salva a ele. Ou a divisão dos brinquedos por género, impedindo muitas vezes uma escolha livre porque tal brinquedo se encontra na zona azul ou rosa. Os próprios manuais escolares contêm ilustrações em que a mãe é que está na cozinha e o pai conduz o automóvel. São tantas as coisas que nos vão deixando mensagens que ficam no nosso inconsciente que é mesmo importante estarmos alertas para isso.
O que aprendeu com os mais novos nas suas visitas a diferentes escolas para falar sobre igualdade de género e de oportunidades?
Para começar, que as crianças são bastante mais genuínas do que os adultos e, portanto. são sempre muito recetivas a este tema. São as primeiras a chegarem à conclusão de que não importa a cor, o sexo ou a religião; que o importante é sermos felizes sendo nós próprios.
Quais são as perguntas mais comuns que eles fazem?
“Porque é que o cor-de-rosa é só para rapariga?” ou “como posso ser jogadora de futebol profissional e ser levada a sério?” Estas questões são muitas vezes repetidas. Um menino na Hora do Conto no GuimarãeShopping, por exemplo, revelava alguma vergonha por gostar de costurar. São estes preconceitos que devemos contrariar desde pequeninos.
Há alguma experiência que a tenha marcado particularmente?
Sim. Gostei bastante de vários trabalhos de turma feitos em diversas escolas que visitei. Lembro – me de um trabalho, que invertia os habituais padrões sociais atribuídos a cada género. O título era princesas de capa (com capas de super heroínas)! E heróis de avental!
Os movimentos online, como o #MeToo, o Time’s Up ou as Capazes, são instrumentos poderosos para dar voz às mulheres?
Hoje em dia as redes sociais são ferramentas muito poderosas que se forem bem usadas podem ajudar e muito nesta e noutras lutas. Sem dúvida alguma há que fazer uso disso.
Um mundo igual é uma utopia?
Uma utopia será certamente, para quem está passivamente a assistir a tudo. Para quem se inquieta, questiona, discute e levanta a sua voz não há utopias.