Inspirar, encorajar, acreditar, mudar. São estes os ingredientes do novo programa de Ana Viriato, apresentadora e empresária, que marca o seu regresso à televisão, com um projeto de sua autoria e produção. Chama-se ‘Viriato no Feminino’, conta histórias inspiradoras de mulheres portuguesas com destaque em diferentes áreas e pode ser visto na SIC Mulher.
Conversámos com Ana Viriato, que, aos 42 anos, é também ela inspiradora na sua vontade de dar – ainda mais – voz às mulheres, a quem recorda a importância de se ouvirem, respeitarem e ajudarem mutuamente.
Quem são as mulheres que a inspiram e porquê?
Tenho várias mulheres que me inspiram. Posso começar por falar das minhas avós. Duas mulheres incríveis e batalhadoras que viveram tempos difíceis onde o papel da mulher era muito redutor enquanto seres humanos livres e pouco reconhecido nas suas tarefas enquanto mães, avós, cuidadoras e trabalhadoras domésticas. Os papéis mais difíceis na minha opinião e que nunca lhes dão o devido valor. As memórias que as minhas avós me deixaram, fazem-me sentir mais forte para continuar o seu legado. Lutar pela liberdade que elas nunca tiveram e certamente ambicionaram.
A minha mãe, uma mulher que teve quatro filhos, foi professora e, ao longo da sua vida, ocupou, e ainda ocupa, vários cargos como voluntária em associações que apoiam os mais carenciados. É uma mulher que nunca baixa os braços e luta sempre pela felicidade dos seus filhos e netos. Tem sempre a porta da casa aberta a quem mais precisa e, na mesa, há sempre lugar para mais uma pessoa. Ensinou-me a ser verdadeira, humilde e educada. Ensinou-me a ter fé (a minha mãe é uma mulher de fé) e a nunca desistir dos meus sonhos.
Estas são as principais mulheres da minha vida, depois tenho como fonte de inspiração mulheres como Eleanor Roosevelt, uma mulher com uma visão incrível para a época, com uma coragem e um jogo de cintura que a permitiu criar numa época dominada pelos preconceitos e discriminação, a carta da liberdade, a declaração universal dos direitos do Homem. Um legado que permitiu que a lei que defende os direitos dos homens e das mulheres estivesse presente num grande número de países. Cabe-nos a nós, agora, dar continuidade a este legado para que chegue a muitos maisá
Hoje fala-se mais sobre igualdade de género. Mas talvez ainda não seja o suficiente. É essa uma das missões do programa?
Falar de igualdade de género é falar de direitos humanos, é falar de justiça. Hoje fala-se mais porque as mulheres têm mais acesso à educação e percebem os seus direitos. Há 50 anos, as mulheres não viviam livres e por isso pouco se falava de direitos iguais, não havia liberdade de expressão. As mulheres tinham medo, dependiam dos seus maridos, dos seus pais. Hoje, uma mulher que viva num país democrata, é uma mulher livre, independente, que luta pelos seus direitos, que estuda, que se especializa, o que na minha opinião é a maior arma para combater a desigualdade.
Mas como diz, há muito a fazer, porque apesar de as mulheres terem todas as ferramentas para alcançar os seus objetivos, a misoginia é um flagelo ainda difícil de combater. Por isso, o “Viriato no Feminino” tem essa missão, inspirar as mulheres, dar-lhes força e coragem para usar essas ferramentas e lutar pelos seus sonhos. São histórias inspiradoras de mulheres que através do seu testemunho podem potencializar esse passo.
Viriato (o seu apelido) foi o líder dos Lusitanos. Agora, as guerreiras somos nós, mulheres?
As mulheres sempre foram guerreiras, mesmo na época de Viriato, no entanto não eram reconhecidas como tal. As tarefas que exerciam enquanto cuidadoras, cozinheiras, gestoras do lar, eram vistas como uma obrigação.
Hoje, mesmo longe de termos esse reconhecimento já temos exemplos como a primeira-ministra da Nova Zelândia que amamentou o seu bebé durante as suas reuniões no parlamento, o que demonstra que, cada vez mais, a mulher apesar do seu trabalho remunerado, também se ocupa do trabalho não remunerado. Não sei se os homens teriam essa capacidade de gestão.
É preciso uma força física e psicológica, uma capacidade de organização extraordinária para gerir um país e uma casa. Acho que não somos nem mais nem menos que os homens, somos diferentes. No entanto, mesmo com todas as diferencias e especificidades a mulher tem facilidade na procura de soluções para as situações de conflito e é importante envolver as mulheres na instauração de uma paz e reconciliação. Após a aprovação, em 2000, da Resolução 1325 pelo conselho de segurança das Nações Unidas sobre “Mulheres, Paz e Segurança”, as mulheres passaram a ter maior representação, participação e agência nos processos de resolução de conflitos. E já são muitas as mulheres que também estão na linha da frente de guerras, causas e são líderes de grandes projetos. Existem muitas guerreiras espalhadas pelo mundo, falta agora dar-lhes mais voz e reconhecimento.
É difícil ser mulher. Há que conjugar os papéis de mãe, profissional, mulher, amante… Mas muitas vezes a maior pressão vem de mulheres como nós…. Como podemos ser melhores umas para as outras?
Infelizmente as mulheres são as suas piores inimigas. As mulheres são muito críticas umas em relação às outras e julgam-se muito. A minha justificação para isso é que há uma concorrência muito maior. Como são menores as oportunidades, tornam-se mais competitivas e reservadas. Não partilham, não se unem. Se houvesse uma união maior, tenho a certeza de que a luta pela igualdade seria mais fácil. As mulheres deveriam interagir mais, criar estratégias juntas, aprenderem com as experiências umas das outras. Juntas somos infinitamente mais fortes.
Das mulheres que passaram pelo seu programa, que características acha que as unem e que podem definir a mulher portuguesa atual?
As convidadas que já passaram pelo “Viriato no Feminino” são mulheres guerreiras. São mulheres com uma mente aberta, que trabalham com paixão. Vivem de uma forma justa e verdadeira com elas e com os outros, o que, na minha opinião, é a fórmula perfeita para alcançarem o sucesso, nas suas diversas formas, enquanto seres humanos. São mulheres que lutaram, e lutam, para alcançar os seus objetivos, tentando sempre conciliar as várias frentes que a vida da uma mulher exige.
Na minha opinião, as mulheres portuguesas têm, interiormente, todas estas características, mas algumas não exteriorizam porque vivem subjugadas. Apesar de Portugal ser um país pequeno, a cultura machista ainda está muito enraizada na maioria das comunidades religiosas, impactando mulheres da geração da minha mãe e algumas da minha também.
Tenho esperança na comunicação e na cultura mediática como veículo para mudança de paradigma. Os media de hoje já promovem mais o sucesso no feminino e acredito que a percentagem de mulheres que vivem uma vida que não escolheram, irá diminuir. Acredito mesmo no poder da comunicação para ampliar a nossa voz, promover o empoderamento das mulheres, sendo por isso, uma ferramenta fundamental para este desenvolvimento.
É mais difícil para uma mulher provar o seu talento? Se for bonita mais ainda, não?
Conciliar os múltiplos papéis desempenhados pela mulher constitui um dos principais fatores que não ajudam a promover o talento feminino. As estatísticas indicam que há menos mulheres a trabalhar do que homens e a diferença é maior nos cargos de liderança. Muitas mulheres optam por se dedicar aos filhos ou familiares e, de certa forma, anulam-se profissionalmente. Mesmo sendo uma opção da própria, eu considero que este papel (de cuidadoras) é uma característica intrínseca das mulheres. Sem dúvida, um talento extraordinário, mas que não é remunerado.
Quando uma mulher tem de se destacar num mundo construído por homens, a missão de superação e desenvolvimento de talentos torna-se, desde logo, desigual. Têm de ser criadas condições para que lhes sejam dadas as mesmas oportunidades de promover os seus talentos e concorrer em igualdade.
A meritocracia é fundamental para que haja justiça e equilíbrio nas equipas. A escolha da pessoa para determinado cargo não tem de depender do género, da idade, da etnia… devem, apenas e só, serem consideradas as competências e as características necessárias para o cargo.
A mulher bonita, na maioria das vezes, é conotada como menos inteligente. Contudo, considero que estamos a perder esse preconceito, porque as mulheres aprenderam a defender-se mais, talvez provando mais.
Mas ainda há um longo caminho a percorrer…
Assinalou-se, recentemente, o Dia Internacional pela Eliminação da Violência contra as Mulheres. Só este ano já morreram 20 mulheres vítimas de violência doméstica em Portugal. O que está a falhar? Onde estamos a falhar?
A violência doméstica é um problema enraizado na sociedade e no mundo desde os primórdios da humanidade.
A forte cultura patriarcal, privilegia os homens dando-lhes poder. Não é fácil erradicar um comportamento que se perpetua há tantos séculos, mas a violência não deve ser aceite por ser algo cultural, isso não pode servir como justificação.
O medo, a dependência financeira, a falta de confiança e de autoestima podem ser os principais fatores do silêncio destes casos. A proteção da vítima tem de ser reforçada para que ela se sinta segura na denuncia. Acho que o facto de ter de ser a vítima a sair de casa, também não ajuda na decisão. Quem ama não agride, quem ama cuida. O agressor tem de ser punido de forma que a vítima consiga viver tranquila.
Onde estamos a falhar?
Acho que neste momento deveria haver uma intervenção mais ativa e direta na educação. As escolas deveriam criar temáticas que desenvolvessem este tema e que, de alguma forma, tanto os meninos como as meninas, pudessem ser instruídos sobre a igualdade e o respeito entre os pares. É fundamental sensibilizar desde cedo para os perigos da violência, educar para a gestão de conflitos e ensinar a importância da nossa liberdade e do respeito pela liberdade do outro.
Enquanto educadores, nós pais, também temos de ser mais interventivos nesta missão e transmitir esses valores de paz e tolerância. As pessoas são o reflexo da sua educação e exemplo. Só assim, ainda com muita demora e atraso, consigo ver um futuro de homens e mulheres onde prevalece a justiça e a paz.
Sobre Ana Viriato:
Ana Viriato é apresentadora, produtora de TV&Online e embaixadora de marcas. Nasceu a 23 de setembro de 1980, na cidade do Porto. É licenciada em Educação Física, Saúde e Desporto e tem diversas formações no âmbito da Dança, do Teatro e da Televisão. Entre março de 2007 e julho de 2019, foi apresentadora dos programas “Praça da Alegria”, “Portugal no Coração”, “Programa das Festas” (RTP1) e foi o rosto do programa sobre moda, calçado e lifestyle “What´s Up Olhar a Moda” (RTP2). Atualmente, é CEO da AV Entertainment, empresa de produção audiovisual, comunicação de marcas e entretenimento que fundou em 2018, e é CEO da AV Portuguese Brands, espaço de vendas online, disponível para marcas portuguesas de autor com peças exclusivas e personalizadas para o conceito de autor Ana Viriato. É ainda CEO do ChillOut – O seu Clube de Saúde, desde 2006.