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Esmiucemos um pouco os dados que a revista médica The Lancet Public Health publicou em 2022: em 2019 havia cerca de 57 milhões de pessoas em todo o mundo com demência e calcula-se que em 2050 esse número aumente para 153 milhões. No caso concreto de Portugal, havia, em 2019, à volta de 200 mil casos e prevê-se que aumente para 351 mil em 2050. Números que nos devem assustar a todos. No entanto, como diz Sanjay Gupta – conhecido neurocirurgião, correspondente de assuntos médicos da cadeia televisiva CNN nos Estados Unidos e autor do livro ‘Mente em Forma’ –, inspirar à mudança pelo medo não é o melhor, “não resulta bem e não dura muito tempo. Quando assustamos alguém, ativamos a amígdala dessa pessoa, o centro emocional do seu cérebro. A reação é rápida, impetuosa e não dura muito tempo. É uma ação que tem início nos centros emocionais do cérebro ultrapassa também as áreas de discernimento e da função executiva do cérebro, daí que a reação pode ser intensa e imediata, mas é muitas vezes descoordenada e passageira”. E o objetivo deste artigo é precisamente o contrário, que se inspire para uma mudança organizada e prolongada no tempo. Porquê? Uma das doenças mais ‘conhecidas’ e comuns dentro do espectro da demência é o Alzheimer. Sabe-se hoje que esta começa 20 a 30 anos antes de qualquer sintoma, por isso, idealmente, era começar já hoje a pôr em prática aquilo que vai fazer com que não entre nestas previsões desanimadoras. A má notícia é que não há medicamentos nem cirurgia que cure a demência, a boa é que um estilo de vida saudável pode reduzir drasticamente estas doenças que destroem a nossa mente, as nossas memórias e raciocínio.

Sabia que a nossa herança genética tem um peso muito pequeno no aparecimento da demência? “Um estudo de 2018, publicado da revista Genetics, revela que os genes são responsáveis por menos de 7% do tempo de vida das pessoas, logo, mais de 90% do tempo da nossa saúde e longevidade está nas nossas mãos”, revela Sanjay Gupta no seu livro. E mais, o declínio cognitivo não é uma inevitabilidade trazida pela idade, “podemos otimizar o cérebro de várias formas significativas e melhorar a sua funcionalidade, reforçar as redes neuronais, estimular o crescimento de novos neurónios e ajudar a protelar doenças cerebrais relacionadas com a idade. Pense num edifício histórico que ainda se mantém de pé. Com a manutenção de rotina e remodelações ocasionais aguenta o teste do tempo e é elogiado pela sua beleza e proeminência. O mesmo é verdade no caso do cérebro”, sublinha o neurocirurgião americano.

Factos curiosos sobre o cérebro

Já dizia Hipócrates (séc. IV A.C.), pai da Medicina ocidental, que “os homens [e as mulheres, acrescentamos nós] devem saber que de nada, senão do cérebro, provêm as alegrias, os prazeres, os risos e as piadas, as tristezas e o sofrimento, a melancolia e as lamentações”. Anil Seth, professor de Neurociências Cognitivas e Computacionais da Universidade do Sussex, em Inglaterra, e autor de ‘O cérebro em 30 segundos’, vai mais longe ao afirmar que “o cérebro é também responsável pela forma como entendemos o mundo e como nos comportamos nele. Por isso, compreender o cérebro é compreendermo-nos a nós próprios e ao nosso lugar na sociedade e na Natureza”.

O cérebro é o órgão mais complexo do corpo humano – quando há doença, não se pode transplantá-lo, como o rim, o fígado ou até mesmo o coração. “Tem o tamanho e a forma de uma couve-flor, pesa cerca de 1,36kg e uma textura semelhante à do tofu. Existem tantas conexões num cérebro adulto comum que se contássemos uma por segundo demoraríamos mais de 3 milhões de anos a fazê-lo. Contém mais de 90 mil milhões de neurónios (células nervosas) e cada um destes neurónios é, por si só, um dispositivo complexo de processamento de informação que interage com cerca de mil outros neurónios”, revela o neuropsicólogo Chris Frith no mesmo livro. 

Há muito que este órgão exerce um grande fascínio na comunidade científica mas o neurónio foi identificado há apenas 100 anos. “Só nos últimos 25 anos é que se tornou possível observar a estrutura do cérebro em voluntários saudáveis”, sendo que a tecnologia contribuiu para grandes avanços neste campo, basta pensar na imagiologia cerebral.

Mais factos? Aqui vai mais uma mão cheia deles revelados por Sanjay Gupta: o cérebro é constituído por 73% de água, bastando 2% de desidratação para afetar a memória, atenção e outras capacidades cognitivas (por isso é tão importante estarmos hidratados e se insiste tanto na certificação de que os mais velhos bebem água, sobretudo nos meses mais quentes). É o último órgão a amadurecer, só por volta dos 25 anos é que atinge a maturidade plena, por isso é que crianças e adolescentes têm mais dificuldade em controlar as emoções e incorrem em comportamentos de risco; e até meados dos anos 90 pensava-se que nascíamos com uma espécie de reservatório de neurónios que, ao longo da vida, se iam esgotando, sem se regenerarem. Felizmente, esta teoria estava errada. Sabe-se hoje com toda a certeza que podemos estimular o nascimento de novas células (neurogénese) – construindo aquilo que se designa ‘reserva cognitiva’ ou, como lhe chamam os cientistas, ‘resiliência do cérebro’.

Existem tantas conexões num cérebro adulto comum que se contássemos uma por segundo demoraríamos mais de 3 milhões de anos a fazê-lo.” neuropsicólogo Chris Frith

Será Alzheimer? Acabe com receios e dúvidas

‘Onde é que deixei… as chaves, os óculos? O que é que vinha aqui buscar/fazer/procurar? Como é que se chamava a colega que se sentava ao meu lado na escola? E o professor de Matemática que gostava de nos chamar ao quadro?’. O mais certo é que já se tenha visto numa destas situações. Muitos de nós questionamo-nos se não será um pré-aviso, um sinal de declínio cognitivo. No livro ‘Mente em Forma’ identificam-se seis tipos de lapsos de memória que são considerados normais e não devem causar alarme. São eles:

Distração. É aqui que encaixa o típico, ‘onde é que guardei as chaves?’ ou ‘o que vinha buscar à despensa?’. Este tipo de lapsos devem-se à falta de concentração e de atenção. Provavelmente no momento em que guardámos as chaves ou decidimos ir buscar arroz à despensa estávamos a pensar nas mil e uma tarefas diárias. Para estes lapsos não acontecerem, temos de estar ativamente a pensar no que fazemos. “Existe uma diferença entre o que os olhos ‘veem’ e a mente ‘observa’. Se a mente estiver ausente quando executamos uma ação, pode não haver observação ou consciência da ação e subsequente criação da memória”, destaca o neurocirurgião. Convém distinguir esta distração de algo mais preocupante como, por exemplo, esquecer-se do caminho para casa, quando o trajeto é o que faz habitualmente.

Bloqueio. É o ‘ai tenho o nome dela mesmo debaixo da língua e não me lembro’. Tem a ver com a perturbação criada quando há várias memórias semelhantes que se sobrepõem.

Baralhação. Imagine que tem uma ou mais amigas com quem se encontra com regularidade e com quem costuma falar ao telefone. Pode confundir pormenores de uma conversa que teve ao telefone, pensando que ela lhe terá dito ao vivo, por exemplo. Tem a ver com errar nos pormenores de algumas memórias mas lembrar-se com rigor da maior parte dessa mesma memória.

Desvanecimento. É normal em todas as idades. O nosso cérebro é como um gigante computador em que a memória tem de ser limpa de vez em quando para criar espaço para novas memórias, e aquelas que não são recuperadas com alguma frequência tendem a ser mesmo esquecidas. Por isso talvez nos lembremos, por exemplo, do que sentimos, vestimos no primeiro dia de aulas, porque já falámos disso várias vezes, mas já não nos lembramos dos detalhes do segundo dia. Com o cérebro e as memórias, o ‘use it or lose it’ (usa-a ou vais perdê-la) é uma verdade.

Esforço para recuperar memórias. É parecido com a distração. Fomos ao cinema e dias depois não nos lembramos do nome do filme ou dos atores principais porque passámos pelas brasas, não nos despertou grande interesse, tivemos um dia stressante…

Tarefas múltiplas em confusão. Lá vai o tempo em que conseguíamos fazer exercícios de matemática com a televisão ligada e o irmão a tocar as escalas no piano no quarto ao lado. À medida que a idade avança, menos capacidade temos para nos concentrarmos em várias tarefas ao mesmo tempo, mas não se preocupe porque o ‘multitasking’ não traz qualquer benefício ao cérebro.

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