Mais vegetais, produzidos o mais perto de si possível, sem químicos (Foto: Getty)

Somos cada vez mais no mundo e precisamos de comer para sobreviver, por isso há que arranjar formas de produzir mais alimento. O problema é que o que estamos a fazer está a esgotar os recursos naturais e a causar ainda mais impacto nas alterações climáticas. É verdade que muitas grandes empresas multinacionais têm uma influência brutal nas alterações climáticas, mas nós podemos lutar em várias frentes. À nossa mesa, nos nossos hábitos de consumo, nas ruas, pressionando essas empresas para mudarem de paradigma… e como todas as lutas, vai ser difícil e demorado, mas se queremos um futuro, temos de começar já – sem perder a noção do todo – pelo que está mais ao nosso alcance: comecemos pelo que compramos nos supermercados.

A situação é muito preocupante, segundo a associação internacional para a conservação da Natureza, a WWF (World Wildlife Fund), “nos últimos 50 anos, a produção alimentar causou 70% da perda de biodiversidade em terra e 50% em água-doce”. Para combater estes números, a WWF criou há poucos anos a ‘Eat4change , “uma iniciativa internacional para promover a transição para dietas sustentáveis”, podemos ler no site. Ali tem acesso às razões da campanha, a receitas e até a uma calculadora do impacto ambiental da sua dieta, a atual, assim como das pequenas alterações que pretenda realizar.

Pensar o que comemos
“A maior parte das pessoas não sabe, mas um terço das alterações climáticas são causadas pela produção de alimentos: desde a desflorestação com o fim de criar campos agrícolas para alimentação humana, a terrenos para criar gado e mais terrenos para alimentar os animais da indústria pecuária, passando pela utilização de fertilizantes no solo, estrume, modo de transporte dos alimentos, processamento, embalamento e até a forma como cozinhamos e a quantidade de alimentos que é desperdiçada… tudo isso tem um impacto enormíssimo”, diz Sarah Bridle, investigadora britânica e professora de Alimentação, Clima e Sociedade na Universidade de York, que começou a sua vida académica dedicada a outras galáxias – era professora de Astronomia e Cosmologia –, mas a morte de um colega levou-a a preocupar-se mais com este planeta que habitamos e com a forma como produzimos alimentos. Ouvimos a sua conferência na Universidade de Cambridge e a entrevista ao podcast Zoe Science & Nutrition, e aqui ficam alguns dos apontamentos mais relevantes. Uma coisa que nos diz – e isto vai alegrar quem adora carne – é que não temos de ser todos veganos (se quiser ser, ou optar pelo vegetarianismo, melhor), mas, atenção, o segredo está na quantidade, esta tem de diminuir e muito, porque “as escolhas que cada um faz acabam por ter um grande impacto, dependendo do que todos fazemos em conjunto”.

O impacto dos fenómenos extremos
Como vimos, a alimentação tem um impacto enorme no aquecimento global, e este, por sua vez, pode provocar graves danos nas colheitas. “O que estamos a ver são fenómenos climáticos extremos a assolar cada vez maiores áreas terrestres ao mesmo tempo, e isso, obviamente, vai ter impacto na capacidade de produzir alimentos porque vários países, contíguos uns aos outros, vão perder as suas colheitas devido aos incêndios, cheias ou secas que são cada vez mais frequentes. Por exemplo, devido ao aquecimento dos polos temos ondas de calor a acontecer em todo o Hemisfério Norte, o que significa que vários locais de produção de alimentos estão a ser destruídos simultaneamente. Outra coisa que temos de saber é que quando se fala em aumento global das temperaturas de 1-2ºC, isso é a média, não quer dizer que vá acontecer de forma igual em todas as zonas do planeta, há lugares que podem ficar 10ºC mais quentes”, alerta Sarah Bridle.

+ de 1,8 milhões de toneladas de alimentos são desperdiçadas por ano em Portugal, de acordo com as conclusões do INE apresentadas em junho de 2022.

Consumir em menor quantidade
A criação de animais para consumo humano é um dos grandes contribuidores para o excesso de emissões de gases com efeito de estufa. Além disso, sabia que 80% dos terrenos agrícolas a nível global são usados para alimentar os animais (gado)? Solução? Simples: reduzir o consumo de carne. Se as pessoas comerem muito menos carne, não só se libertam terrenos para reflorestar como há mais terreno para colheitas para uso humano e não é libertado tanto metano (dos arrotos e puns das vacas, sim, é mesmo um problema grave) para a atmosfera. Até parece que já estou a ouvir umas vozes muito indignadas, ‘era só o que faltava não podermos comer carne, não somos coelhos, o ser humano é omnívoro’. Pois é, mas sobrevive bem sem comer carne ou produtos de origem animal, mas isso não está em causa. O que está em causa é sobretudo a quantidade. Produz-se e consome-se demasiada carne. Lembra-se dos movimentos ‘Segundas-feiras vegetarianas’? Era bom que fosse mais do que um dia por semana. “Não é preciso sermos absolutistas nisto de deixar de comer carne de vaca ou ovelha… o que é realmente importante é a quantidade. Devemos diminuir consideravelmente o consumo de produtos de origem animal… e até é benéfico para a nossa saúde”, diz Sarah Bridle. Agora, que sabemos que devemos comer muito menos carne, “convém ter também em atenção a forma como foi produzida, isto é, se os bifes vieram de vacas que se alimentavam em terrenos desflorestados para esse propósito ou se eram de pastagens já convencionadas nesse sentido há décadas, onde os animais andam livremente pelos campos. É claro que estas últimas têm uma pegada carbónica mais baixa porque não se derrubaram árvores para poder semear pasto. Em cima de tudo isso há que calcular não só se os terrenos precisam de ser regados ou basta a chuva… até isso ‘pesa’ nas contas que se fazem para saber a sustentabilidade de um produto”, diz Sara. Outro fator a ter em conta é saber de onde vem a carne. Tem menos impacto ambiental se for de um produtor a 50km do que se vier da Argentina, Brasil ou Irlanda, como é óbvio.
Frango ou porco têm a mesma pegada carbónica do que as vacas e ovelhas? Boas notícias: não, têm uma pegada três vezes menor, o que também não é um sinal verde para consumo ilimitado. Consumo moderado, por favor.
Então, o que fazer em relação a outros produtos de origem animal, como o leite, queijo e iogurtes? Mais uma vez, a palavra mágica é… reduzir. “Uma coisa é pôr um pouco de leite no café ou no chá, outra é encher uma tigela de cereais diariamente com leite”, chama a atenção Sarah Bridle. E se está preocupada com a ingestão de cálcio, saiba que há muitas outras fontes desse mineral, como os vegetais de folha escura, brócolos, feijão, lentilhas…

LIVROS INSPIRADORES QUE DEVEM FAZER PARTE
DA SUA BIBLIOTECA E DO SEU DIA A DIA

Cuidados a ter com a origem
Se deixarmos de encher o prato com proteína animal só temos de o encher com vegetais? Sim, e ainda por cima são muito mais ‘amigos’ do ambiente. “Para produzir uma caloria de produto de origem animal é preciso, em média, 16 vezes mais terra do que para produzir uma caloria de produtos à base de plantas”, adianta a investigadora britânica, mas… atenção à origem. Uma atividade importante quando for às compras é reparar nas letrinhas pequeninas que nos dizem a origem dos vegetais ou da fruta. Espargos e uvas do Chile e Peru, batatas francesas, quiabos das Honduras, kiwis da Nova Zelândia, peras da África do Sul?! Por muito saborosas que sejam, não são de todo sustentáveis. Já imaginou o tempo de transporte até Portugal? Tudo isso conta para a sustentabilidade de um alimento. Mais ainda se for de avião (lamento, amantes das mangas de avião, mas elas têm uma pegada carbónica gigante). Mas, então, de preferência só devemos consumir produtos locais? Sim, deve dar prioridade a esses e em Portugal há muito por onde escolher (veja nos sites que lhe sugerimos, os mercados onde os produtores nacionais vendem os seus produtos ao consumidor). Isso não quer dizer que, muito ocasionalmente, não possa prevaricar se lhe apetecer mesmo muito, mas tenha em mente o seguinte, os alimentos que vêm de avião devem estar mesmo no topo dos alimentos a evitar. Os que são transportados por barco ou via terrestre têm um pouco menos impacto ambiental que os que vêm de avião, “libertar gases de estufa e queimar combustíveis fósseis em altitude causará cerca de três vezes mais aquecimento global do que queimar exatamente a mesma quantidade de combustíveis no solo”, revela a investigadora britânica.

Acabe com o desperdício
Este é um enorme problema ambiental e de sustentabilidade (para não falar do dinheiro que literalmente deitamos para o lixo). Vamos aos (dolorosos) números? “Um terço de todos os alimentos são desperdiçados. É péssimo porque causámos impacto ambiental na sua produção e não foram aproveitados. Se pensarmos que um terço das alterações climáticas são causadas pela produção de alimentos e que um terço dessa parcela é desperdiçada, então isso quer dizer que 10% das alterações climáticas referem-se a comida desperdiçada, é um horror!”, conclui a investigadora. Planear as refeições da semana e não comprar por impulso, pode ajudar. Optar por congelar vegetais ou comprar, por exemplo, leguminosas num frasco (ou avulso, secas, e cozer na panela de pressão e depois congelá-las), também evita o desperdício.

Pequenos lembretes
Coma comida. Coma pouco. Sobretudo vegetais”, o autor desta frase é Michael Pollan, jornalista americano que escrevia sobre ciência, sobretudo relacionado com alimentação e sustentabilidade. Tem vários livros sobre o tema, mas vamos focar-nos no ‘Saber comer’, onde se destacam algumas regras básicas que são divertidas e fáceis de memorizar:
Não coma nada que a sua bisavó não conhecesse.
Evite produtos com mais de cinco ingredientes.
Evite produtos alimentares que uma criança do terceiro ano não consiga pronunciar.
Coma apenas alimentos que podem apodrecer.
• Sempre que puder, compre nos mercados locais, se for possível de origem biológica.
Trate a carne como um ingrediente para dar gosto ou como um alimento para dias de festa.
Comer o que se aguenta numa perna (cogumelos e vegetais) é melhor do que comer o que se aguenta em duas (aves), que é melhor que comer o que se aguenta em quatro (vacas, ovelhas…).
Plante vegetais no seu quintal ou então em vasos. Mais ‘local’ que isto é impossível.
Coma bacalhau, raia e sardinha só em dias de festa. Bem, esta não é da autoria de Michael Pollan, mas se ele fosse português era o que diria. Estas espécies estão em perigo devido à sobrepesca, mas se gosta de peixe que tal visitar o guiapescado.wwf.pt e saber quais são as alternativas sustentáveis e até experimentar as receitas sugeridas?
. Coma comida, coma menos quantidade, compre local, sobretudo vegetais, não desperdice, ganhe saúde e vitalidade e fique com a consciência de que está a fazer o que está certo para si e para o planeta.

Sites úteis
Os hiper e supermercados já vendem bastantes produtos a granel e têm alas com produtos biológicos. Se não tiver nenhum perto de si ou quiser fazer a experiência de comprar diretamente ao produtor, aqui ficam alguns site úteis.
agranel.pt – Diretório nacional de lojas que vendem a granel. Leve os seus sacos e recipientes e vai produzir menos lixo.
frutafeia.pt – Para reduzir as toneladas de fruta e vegetais que são desperdiçados só porque não têm o aspeto perfeito (mas estão dentro das normas de segurança alimentar), foi criada a cooperativa Fruta Feia. Clique no site e saiba como pode encher a sua despensa a preços bem mais reduzidos.
reformaagraria.pt – é uma plataforma nacional onde pode pesquisar os mercados e feiras bio a nível nacional, e pode também comprar diretamente ao agricultor.

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