Se fuma que nem uma chaminé, tem uma alimentação à base de gorduras, tensão arterial alta e o colesterol elevado, acha mesmo surpreendente acabar com uma doença cardiovascular? Geralmente pensamos que só acontece aos outros, mas infelizmente os outros somos também nós. Talvez se o corpo fosse transparente e pudéssemos ter noção dos efeitos que o nosso estilo de vida tem no coração as coisas fossem diferentes, mas a degradação a que sujeitamos o nosso órgão vital é invisível e os números das estatísticas continuam a aumentar.
As doenças cardiovasculares são a principal causa de morte em Portugal e dela morrem 42 mil pessoas anualmente, segundo o Instituto Nacional de Estatística. Destas, 10 mil por enfarte do miocárdio.
ESTEJA ALERTA
Dá-se um enfarte quando há a obstrução total de uma artéria do coração, normalmente provocada por um coágulo. A falta de oxigénio prolongada nas artérias (geralmente já diminuídas no seu diâmetro interno por fenómenos de arteriosclerose) causa a morte celular do músculo cardíaco, deixando uma cicatriz que diminui a sua capacidade de bombeio.
A gravidade depende da extensão e localização da zona afectada. Os sintomas mais típicos são dor no peito, geralmente muito intensa, com irradiação para um dos braços (geralmente o esquerdo), para o maxilar ou para o pescoço. Muitas vezes é acompanhada de mal-estar geral e suores frios. Mas também pode haver situações de enfarte sem que estes sintomas apareçam ou em que apareçam em grau ligeiro, embora seja mais raro.
Os sinais são semelhantes à angina de peito, mas enquanto nesta a dor é aguda e não dura mais do que cinco a dez minutos, a dor do enfarte é mais prolongada e pode surgir em repouso, ao contrário da angina, que costuma surgir associada a algum esforço físico ou acontecimento emocional perturbador.
A confirmação do diagnóstico é feita através do electrocardiograma e de análises que verificam a existência de certos enzimas resultantes da destruição de tecido cardíaco e que entram em circulação ao fim de algum tempo.
Há que ter cuidado porque este problema pode ser confundido com outras patologias, como a pancreatite aguda, patologias agudas abdominais ou intratorácicas. Em todo o caso, na sua presença, e dada a sua gravidade, é sempre conveniente dirigir-se imediatamente a uma urgência hospitalar, já que a maior parte das mortes se devem por falta de assistência atempada.
FACTORES DE RISCO
O stresse, tabaco, uso da pílula, hipertensão, diabetes, colesterol, excesso de peso e falta de actividade física são tudo factores que aumentam a probabilidade de ter um enfarte. A predisposição familiar também não pode ser descartada. Um historial de doenças coronárias, obesidade, diabetes e hipertensão deverá sempre ser tido em conta quando se for aferir o risco.
E apesar de o enfarte estar mais associado a idades avançadas, começa a surgir com maior frequência em indivíduos mais jovens. Os factores desencadeantes são os mesmos, embora nos mais novos os principais factores de risco sejam o tabagismo, o colesterol elevado e a vida sedentária, enquanto em pessoas mais velhas a hipertensão é o principal factor de risco.
COMO SE TRATA
O tratamento do enfarte tem como priorida-de alargar as artérias para possibilitar a passagem do sangue. Este procedimento será tanto mais eficaz quanto mais rapidamente for feito, por isso é tão importante o atendimento médico imediato nestes casos.
A administração de ácido acetilsalicí-lico meia aspirina em caso de crise pode ajudar até chegar ao hospital. Ali poderá ser feita uma trombólise, isto é, a administração de um medicamento que vai desobstruir a veia, ou uma an-ginoplastia, intervenção cirúrgica que introduz um cateter na artéria coronária obstruída dilatando-a.
MAIS VALE PREVENIR
Controlar os factores de risco ainda é o melhor que podemos fazer para prevenir o enfarte. A prevenção passa, de um modo geral, por um estilo de vida mais saudável. Eis algumas medidas que pode desde já tomar:
Vigie a tensão arterial. Controle os níveis regularmente e mantenha-a dentro de limites considerados normais.
Controle o colesterol. 190 mg/dl de sangue é o máximo recomendado.
Diminua o consumo de sal, já que este contribui para aumen-tar a tensão arterial.
Mantenha o peso. Evite oscilações bruscas, e se tem peso a mais faça uma dieta.
Não fume. A dependência do tabaco é uma das princi-pais causas ligadas ao apa-recimento do enfarte, e os fumadores têm o dobro de probabilidades de sofrer um enfarte do miocárdio.
Evite as bebidas alcoó-licas. O consumo exagerado (mais de 2 dl/dia) aumenta o risco de enfarte. Mas de forma moderada (um copo de vinho à refeição) até pode, segundo alguns estudos, ter um efeito protector.
Faça check up’s de saúde periódi-cos. Sobretudo a partir dos 45 anos.
Adopte uma dieta saudável. As recomendações da American Heart As-sociation são: incluir grande variedade de frutas, vegetais, cereais, produtos pobres em gorduras, peixe, legumes e proteínas pobres em gorduras saturadas (por exemplo, nas carnes, aves e outras carnes magras e em proteínas de origem vegetal, como o feijão). Na alimentação, as gorduras saturadas não devem exceder 10% das calorias ingeridas e as gorduras trans devem ser absolutamente evitadas (estão presentes em charcutaria, margarina e na maioria dos produtos fumados).
Faça exercício físico com re-gularidade. Não tem de se inscrever num ginásio, nem transformar-se numa maratonista, nem sequer tem de comprar fato-de-treino. Gestos simples, como subir escadas em vez de ir de elevador, andar até à mer-cearia em vez de levar o carro ou fazer um passeio depois do jantar já ajudam, mas o ideal é fazer 30 minutos diários de uma actividade de intensidade média, como andar depressa.
ABC do coração
Angina de peito É uma insuficiência transitória do fluxo de sangue ao coração devido à obstrução parcial das artérias coronárias. Os sintomas são uma dor forte e súbita no peito, que passa rapidamente assim que a circulação sanguínea se restabelece. Geralmente dura entre 5 a 10 minutos (ao contrário da dor do enfarte, que é mais prolongada) e está ligada ao esforço físico.
Cardiopatia isquémica É uma deficiência no suprimento de oxigénio ao coração. A arteriosclerose estreita as artérias, diminuindo o fluxo de sangue e impedindo que este acompanhe as exigências do miocárdio perante a actividade física. É uma patologia crónica, que pode começar na adolescência e agravar-se com os anos, dificultando a irrigação do coração.
Doença cardiovascular É um termo mais genérico, que se refere às patologias que afectam as veias e artérias, não só do coração mas também do cérebro, por exemplo.
Doença coronária Diz respeito às situações clínicas em que existe estreitamento do calibre das artérias coronárias, provocando redução do fluxo sanguíneo ao miocárdio (músculo estriado que constitui a quase totalidade da parede do coração), o que implica uma diminuição da irrigação do músculo cardíaco.
Enfarte do miocárdio Dá-se quando há a obstrução total de uma artéria do coração. A gravidade depende da extensão e localização da zona afectada.