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O nosso cérebro, para o seu funcionamento, no que concerne à permanente interação entre o “eu” e o mundo, precisa de referenciais. Entre outras funções, estas referências permitem-nos gerir a distância a que nos vamos posicionando em relação à nossa zona de conforto. A pandemia retirou-nos, de forma súbita e brutal, grande parte das nossas referências. Tudo e nada passa ser uma ameaça. A ansiedade cresceu exponencialmente e com ela as doenças psiquiátricas, em geral, agravaram-se ou surgiram pela primeira vez. A Perturbação Obsessiva-Compulsiva (POC) foi sem dúvida uma das mais atingidas.

A POC é uma doença muito exigente. Caracteriza-se por pensamentos intrusivos, recorrentes, indesejados, que ocupam a consciência, e que são considerados desproporcionais, ilógicos, “sem sentido”.

As pessoas começam por ter consciência desta falta de sentido destes seus pensamentos, envergonhando-se pelo facto de tal lhes estar a acontecer, e esforçam-se por controlar e dominar esses pensamentos. Tentam, tentam muito, mas não conseguem! Os pensamentos persistem e com eles a ansiedade aumenta até se tornar insuportável, entrando naquela que é considerada a fase obsessiva da doença. Chegados aqui, nada mais resta a estes pacientes que não cederem ao pensamento, desistindo de o tentar controlar e fazendo o que o pensamento “lhes diz para fazer”, numa tentativa recorrente de controlar a ansiedade por ele causada, o que se designa por fase compulsiva. As compulsões são, pois, os comportamentos repetitivos, ou atos mentais, que as pessoas fazem em resposta a uma obsessão.

Os temas obsessivos variam, sendo comuns os da contaminação, com a consequente e compulsiva limpeza; as obsessões pela simetria, com as compulsões de repetição, simetria ou contagem; os pensamentos proibidos ou relacionados com a violência, como o medo irrealista de poder fazer mal a alguém ou a si próprio.

Refletindo sobre os hábitos que todos nós adotamos em tempos de pandemia, é possível perceber que mimetizam, de alguma forma, o que é viver com uma POC cujo tema central é o da contaminação e limpeza. Ou seja, estar sempre atento ao que se toca e aos outros, com medo de sermos recetores ou fonte de contágio, e a consequente necessidade e/ou vontade de lavar as mãos, as superfícies, os sapatos e afins. São receios que não precisamos de esconder, são reais e reconhecidos e partilhados por todos.

Na POC muito medos existem, mas sem base real. Existe o receio do que se imagina (e a pessoa sabe que imagina). Mas esse medo é só do próprio, é escondido e incompreendido e pode dominar e desregular a vida da pessoa. Geralmente estas pessoas sofrem caladas, enclausuradas dentro da própria cabeça.

Com a pandemia juntam-se medos reais a medos imaginários, e com isso a maioria dos doentes com POC ressentiu-se e teve de procurar ajuda. Recordo-me de vários pacientes

com POC que se sentiram pior ao longo destes últimos meses e anteciparam a consulta para reavaliação da sua situação. Outros que se sentiam mal pela apreensão permanente e as limpezas e cuidados acrescidos à rotina habitual. Felizmente, para muitos, não passou de uma adaptação funcional a uma nova realidade e não o início ou agravamento de uma doença. É por isso, importante procurar o médico especialista à primeira alteração ou agravamento de sintomas para que se possa intervir o mais precocemente possível e minimizar as consequências negativas. Manter um acompanhamento médico regular da doença é importante.

A POC, tal como a maior parte das doenças psiquiátricas, é tratada partindo de uma abordagem integrada / biopsicossocial. Assim é vital a consulta de psiquiatria e a toma de certo tipo de medicamentos, como é importante a consulta de psicologia, com a realização de uma psicoterapia que desmistifique a doença, e ensine um conjunto de estratégias para lidar e gerir as manifestações da doença.

É igualmente necessário implementar medidas fundamentais para o bem-estar geral, que incluem as rotinas do sono, da alimentação saudável e da atividade física. Deverá existir uma gestão cuidadosa da informação, privilegiando conteúdos de lazer, e o reforço dos laços emocionais com a nossa família nuclear e/ou com amigos, mesmo que tendo de se realizar através de meios digitais.

Por último, o contexto pandémico, o receio de recorrer aos serviços de saúde instalou-se entre as pessoas de uma forma generalizada. É preciso relembrar que as unidades de saúde adotaram protocolos e circuitos que garantem a segurança dos doentes e dos profissionais de saúde, pelo que, sempre que se justifique, não deve adiar a deslocação às unidades de saúde por receio, seja para realizar uma consulta, exame ou tratamento.

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