Fala-se muito de ‘estimular o sucesso’, mas o que é que isso quer dizer ao certo? Às vezes, coisas tão simples como deixá-los sonhar… Aqui ficam os verbos mais importantes para começar bem.
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Quando falamos em sucesso vemos sempre uns mini-executivos de fatinho completo a falar a um mini-telemóvel, mas não é isso que está em causa. Essa terrível e engravatada palavra, ‘sucesso’, não quer dizer necessariamente que os vamos transformar em empresários, economistas, engenheiros ou advogados.
Neste mundo onde tudo muda de um dia para o outro e onde aparecem novas profissões todos os dias, quem sabe se ele não terá mais ‘sucesso’ como cozinheiro ou ladrilhador do que como arquitecto ou cirurgião? O importante é perceber que tipo de filho tem em casa. Se ele não gosta mesmo nada de matemática, orientá-lo para médico é uma asneira. Se ela nunca medirá 1,75m e não tem a cara da Cláudia Schiffer, não será uma perda de tempo animá-la a ser modelo? Descubra aquilo em que eles são mesmo bons em vez de querer integrá-los à força num padrão que só lhes vai trazer sofrimento inútil. O ‘sucesso’ passa em muito por se fazerem escolhas que juntem gosto e aptidão.
Explicar
Convém habituá-los a pensar pela sua própria cabeça e a saber a razão porque têm de cumprir certas coisas. Não dê ordens à espera de ser obedecida sem mais, explique sempre. Isto pode ser cansativo, mas tem de ser feito. Primeiro, porque retira o peso autoritário de uma ordem. Eles ficam a saber que têm de fazer aquilo não porque o pai ou a mãe acordaram maldispostos naquele dia, mas porque há uma razão para isso. E depois, porque os protege de desconhecidos. Como? Já pensou no perigo? Uma criança habituada a obedecer sem mais, fará tudo o que um adulto lhe pedir…
Mimar
A maioria das pessoas ainda tem imensa dificuldade em elogiar uma criança com a desculpa de que ‘ela pode ficar mimada’. Ora isso é misturar alhos com bugalhos. O que faz uma criança mimada é a ausência de regras e de responsabilidade, não um elogio bem dado na altura certa.
Crianças que nunca são elogiadas, nem beijocadas, nem abraçadas, têm mais dificuldade em achar que valem alguma coisa. E crianças que não se acham nada de jeito têm dificuldade em encontrar soluções para problemas, porque pensam que não vão encontrá-las de qualquer maneira e portanto não vale a pena esforçarem-se. Crianças inseguras vêem um fracasso como uma situação que vai durar sempre. Crianças confiantes sabem que foram capazes de ultrapassar dificuldades noutras alturas, e portanto é provável que voltem a ser capazes.
Transformar
Energia negativa em energia positiva. As crianças não têm a cabeça dos adultos, e um fracasso para eles pode-lhes parecer um obstáculo intransponível. É preciso um grande esforço mental para continuarmos a acreditar em nós próprios depois de uma nega ou de uma tampa (lembre-se lá da última e já fica a saber o que custa…) e os pais podem ajudar. Estampou-se no teste de matemática? Em vez de "bolas, sou mesmo mau a isto", oriente-o para pensar que ele é um bom estudante, e só precisa de trabalhar um bocadinho mais naquela disciplina. Às vezes uma explicação pontual ou uma ajuda do irmão mais velho que já deu aquela matéria são o que basta.
Respirar
Se falarmos com alguns bons alunos, independentemente da escola, é engraçado verificar que a maioria deles afirma que em casa tem um ambiente relaxado, sem grandes pressões para boas notas ou o ‘sucesso’ futuro. Isso não quer dizer que é uma mãe ou pai desatento, quer dizer que sabe o que se passa mas não anda constantemente em cima deles para saber se já fizeram os trabalhos e quando é que têm o próximo teste. Estes esquemas já devem estar treinados quando as crianças chegam à adolescência, de modo a poderem trabalhar sozinhas sem interferência dos pais. Crianças pressionadas ou criticadas não costumam ter iniciativa, vitalidade, interesse ou motivação.
Passear
Festas, ballet, futebol, computadores, patins, escuteiros… Não se deixe hipnotizar pela quantidade de actividades que parece que eles têm de fazer se quiserem progredir na vida. Se eles não param de segunda a domingo, quando é que arejam? Quando é que se divertem? Quando é que lêem livros que não sejam os da escola? Quando é que vão ver a avó? Quando é que fazem patetices?
Sonhar
Alimente a imaginação: há muito por onde descobrir e desenvolver talentos. Livros, música, passeios, conversas, poesia, teatro, brincadeiras. Dê-lhes material para criar outros mundos, alimente as fantasias, deixe-os sonhar.
Mostrar
Aos 14 anos, uma pessoa tem de escolher uma área de estudo. Ora como é que se vai escolher se nem sequer se sabe o que é que se está a escolher? É um bocado atirar no escuro, e depois resulta em anos que se andam para trás e fracassos inúteis. Para prevenir, ao longo da vida, vá mostrando o mundo. Vá dando exemplos de várias profissões, porque ninguém lhe garante que, lá porque o pai é engenheiro de máquinas e a mãe professora de história, a criança queira ser engenheira ou historiadora. Sempre que possível, leve-o ao seu trabalho, deixe que visite o trabalho de outras pessoas (tios, primos), deixe que converse e saiba o que é que mais tem a ver com ele.
Uma questão angustiante para vários pais é: e se ele gosta de qualquer coisa que depois ‘não dá nada’, o que é que se faz, contraria-se ou deixa-se? Isto pode funcionar um bocado como um amor contrariado: se se contraria, aquilo fica sempre como um fantasma mal resolvido, e se é mesmo uma vocação, há-de vir à tona de uma maneira ou de outra. Uma possibilidade pode ser procurar outras áreas que estejam ligadas àquilo que ele gosta.
Trabalhar
Há muito pouca coisa nesta vida que se consiga sem esforço. O problema é que vivemos cada vez mais no mundo do imediato, e ninguém, nem eles nem nós, está habituado a esperar. É difícil treinar a perseverança (até é difícil de dizer, quanto mais…) mas é uma arma importante para qualquer tipo de sucesso: trabalhar e batalhar até conseguir, aprender a esperar, esforçar-se. Isto revela-se em coisas tão banais como pedir uma pizza em vez de fazer o jantar ou comer um bolo porque não se teve paciência para fazer uma sanduíche. Um bom começo é iniciá-lo em algum desporto: suar fisicamente ajuda a suar mentalmente.
Confiar
Se ele se habitua a que todos em casa trabalhem para ele, nunca vai perceber que também tem de fazer alguma coisa na vida… Claro que isto não é pô-lo a trabalhar, é dar-lhe desde pequenino uma posição na família, uma tarefa à medida das suas capacidades. Mesmo com 3 anos há qualquer coisa que eles podem fazer: ajudar a dar banho ao cão, regar as plantas, aprender a arrumar os brinquedos dentro da caixa. A partilha de tarefas reforça o espírito de grupo, e além disso pode ser um excelente desbloqueador de conversa.
Incentivar
‘Espírito de iniciativa’ é o que se pede em quase todos os anúncios de jornal (embora depois a coisa varie segundo a prática, mas pronto). Ora o espírito de iniciativa não se consegue com crianças acabrunhadas, cabisbaixas, mudas, cheias de trabalho e com a impressão de viverem num quartel… É certo que a rotina escolar não ajuda e que a própria vida dos pais ainda menos, mas tente ser um contraponto às nuvens negras que nos rodeiam. Ouça as ideias dele e encoraje-as. Deixe-o fazer experiências, tomar riscos controlados, sujar as mãos e arranhar os joelhos, cair para saber que consegue levantar-se. Mas cuidado com aquela ideia perigosíssima de que é preciso ganhar e ser melhor do que os outros. O que é preciso é dar o seu melhor, não ganhar. Não queira criar um executivozinho em miniatura: é melhor que ele seja uma óptima pessoa do que um génio sem coração.
Ser feliz
É o mandamento mais difícil de cumprir, mas às vezes basta querer. Os pais também precisam de vida própria. Tenha os seus amigos, saia com o amor da sua vida, passeie sem ele de vez em quando, vá ao cinema. Como dizia Rui Zink, os filhos precisam de pais egoístas.