Professora e autora de livros infantis e escolares, é uma mulher de coragem: em 2021, aos 53 anos, escreveu o primeiro romance erótico assumido por uma portuguesa, que esgotou na primeira semana, e agora escreveu o segundo, que promete seguir o sucesso do primeiro.

Como é que se lembrou de escrever ‘Prova-me’, um romance erótico, num país ainda tão puritano como o nosso?

Sempre estranhei haver em Portugal tantos livros eróticos escritos por mulheres estrangeiras que não tinham nada a ver com a nossa cultura. Nós somos mulheres diferentes, com hábitos diferentes, e a certa altura pensei ‘Porque não eu’?’ O ‘Prova-me’ (Ed. Manuscrito) conta a história de um casal que gosta de sexo. Passados 10 anos de casamento, a heroína desafia o marido para fazerem coisas diferentes e as coisas acabam por não correr como previsto. Quando parti para esta aventura nem sabia muito bem para onde ir. Tinha lido o Henry Miller, mas não queria nada tão perturbador. Das ‘Cinquenta Sombras’ só li algumas páginas, para não me influenciar, e é uma escrita que não me entusiasma.

Como foi o processo de escrita?

Demorei quatro anos a escrever este livro. Foi muito difícil de escrever. Passei pela fase em que quis desistir, em que me arrependi, em que toda a gente me criticava. E uma dúvida que parece básica: como é que hei de nomear certas partes do corpo? ‘Tocou-lhe na…’ (risos) Algumas palavras soavam-me demasiado cruas, outras demasiado calão. Até à minha filha perguntei, mas ela só me disse: ‘Ó mãe, por favor!’ (risos) Quando tinha 50 páginas escritas mostrei às minhas melhores amigas. Veio tudo cá para casa, o meu marido fugiu (risos) e foi a histeria. Mas elas não queriam falar do livro: queriam desabafar sobre a vida delas! Uma contou-me uma cena que teve uma vez numa estação de serviço e aproveitei-a para o livro. Houve quem me dissesse: ‘Que coragem!” e “Meu Deus, no que te foste meter!” Porque até aqui eu só tinha escrito livros infantis e escolares, e de repente mostro-lhes um livro megapicante.

Qual é a função da literatura erótica?

Fazer-nos sonhar. A pessoas precisam de sexo, o sexo faz parte da vida, e eu decidi escrever sobre isso do ponto de vista da cultura portuguesa.

Ainda somos um povo sexualmente reprimido?

Depende. Nós, portugueses, somos uns falsos puritanos: temos dificuldade em falar sobre sexo, mas temos vidas escondidas muito mais aventurosas do que se pensa. Havia pessoas que eu nem imaginava que já tivessem feito o que fizeram. Falei com muita gente, li entrevistas de acompanhantes de luxo, fiz pesquisas na Internet e descobri muita coisa. O que me chocou mais foi a diferença entre o que nós sabemos e o que realmente acontece. E quanto mais dinheiro se tem, mais excêntrico se é, mais limites se quebram, porque são pessoas que se fartam facilmente e dão-se ao luxo de procurar outras coisas. Por exemplo, o que se passa nas casas secretas da alta sociedade, onde se faz sexo só por convite, é inimaginável.

Revê-se na sua heroína?

Claro que não (risos). A vida da Raquel não é a vida que eu queria ter. Quis apenas quebrar o tabu que diz que não se escreve literatura erótica no feminino. Porque não? Temos muito medo do julgamento dos outros, e as mulheres ainda mais. Portanto, eu fiz a minha parte.

É um livro que tem uma mulher como personagem principal e é dirigido ao público feminino. Como reagiram as suas leitoras?

As leitoras reagiram de duas maneiras a este livro: dos 35 para cima, adoram. As mais novas não gostaram tanto porque a Raquel é um Alfa na relação, ou seja, ela é a dominadora e a predadora, e as mulheres mais novas querem coisas mais românticas, que espelhem a sua alma, as suas aspirações. Mas quando escrevi o primeiro livro, nem eu adorei a minha personagem: ela é uma anti-heroína, é uma mulher de quem nós não gostamos muito, não é uma personagem linear. O que acontece é que, principalmente numa certa idade, ainda partimos muito para um livro com aquela ideia básica de que temos de ‘gostar’ da personagem principal, temos de nos identificar com ela. Ora uma personagem pode ser ‘principal’ não porque seja moralmente exemplar mas por uma imensidão de outras razões. Um livro de ficção não é um tratado de moral, é um retrato do mundo. Portanto, a ideia não é gostar dela, é perceber o que ela nos traz. Não nos identificamos, aprendemos.”

Agora lançou a continuação de ‘Prova-me’, ‘Prova-me outra vez’. Para quem não leu, conte-me a história deste segundo livro.

Foi um livro arrojado, mas com uma linguagem cuidada e um discurso fluído. A temática é a do sexo entrelaçada numa narrativa. Há uma evolução da Raquel, um processo de crescimento que passa por um amadurecimento e autoreflexão, não perdendo, contudo toda a sua sensualidade e erotismo. É uma mulher com mais consciência de si própria e dos que a rodeiam. O amor surge inesperadamente e faz milagres, como não podia deixar de ser. Mas claro que sendo um livro erótico, continua a haver a narração de cenas sexuais, conjugando todo o tipo de sensações e despertando o próprio leitor através do visualismo e da imaginação.

Como foi escrever um segundo livro? O que mudou? Já ia mais confiante ou pelo contrário houve coisas que refreou, linguagem, temas?

Foi mais difícil escrever o primeiro, porque não sabia como iriam reagir os leitores. Fazia falta um livro deste género escrito em língua portuguesa em Portugal. As traduções não captam a essência e as capacidades da nossa língua. O que mudou foi a Raquel, porque ela está em evolução, tal como a vida. Ela aprende, reformula, cai e levanta-se. Vive, dentro de um livro, mas vive. E tem uma personalidade cheia de defeitos e qualidades. Neste livro, tornou-se uma pessoa melhor. E até eu já gosto mais dela (risos). Continuo a pensar no que virá, porque vejo-a num futuro próximo a voltar a transformar-se num possível terceiro livro, se vier a acontecer.

Mas qual é de facto a diferença entre ler um livro erótico escrito por uma portuguesa e um livro escrito por uma estrangeira?

Tudo depende da linguagem. A forma como se descreve o ato sexual na nossa língua vai ser muito mais rica, mais minuciosa, mais poética do que numa tradução de um livro estrangeiro, a palavra não é tão nua, tudo é mais erotizado. E a palavra é importante num romance erótico. Claro que depois cada leitor tira do livro o que quiser, como em qualquer outro romance, porque a literatura é essa magia do encontro entre leitor e escritor em que cada leitura é diferente. Houve uma leitora que me disse: ‘aquilo aquece uma fornalha’. Eu nunca usaria essa palavra, fornalha, mas ela usou porque a experiência foi dela. Para mim sexo é o encontro do corpo e da alma, e um romance erótico bem feito tem esse condão de nos despertar sensações físicas.

Deu a alguém a ler este último? Como foram as reações?

Não. Só eu e a editora. Foi um processo muito solitário. Quando se criam personagens, criam-se ligações com elas e esta Raquel já a consigo visualizar, já é quase minha amiga (risos). Na verdade, o que mais desejo é escrever um último livro em que a Raquel consiga ser totalmente feliz, em que consiga juntar amor e sexo. As pessoas que estão a ler este livro estão a gostar muito e adoram o ambiente oriental onde a Raquel se encontra. Falam-me também da forma como ela processou o que lhe aconteceu no primeiro romance, admirando o facto de ela ser uma personagem modelada. E continuam a gostar da forma como eu descrevo as cenas sexuais, o que, como já contei, não foi fácil.

O que mais a surpreendeu nas reações de leitores que teve ao primeiro livro?

Já contei que algumas leitoras não gostaram de Raquel. Eu compreendo, mas estava previsto ela ser uma personagem que sofresse um processo de evolução. A essas leitores, gostaria de lhes pedir que conhecessem a Raquel do segundo livro. Outros aderidam de tal forma ao livro que eu fiquei desconcertada. A forma audaz, a descrição minuciosa do corpo, o erotismo, a sensualidade, a presença das sensações, o visualismo, o dinamismo. O ‘Prova-me’ foi um sucesso tão grande que esgotou na primeira semana. Esperemos que esta nova Raquel se transforme num ícone das mulheres modernas: poderosa, solidária, empoderada, independente, apaixonada, desempoeirada, despreconceituosa, empreendedora. O futuro o dirá! 

Mas nem todos os seus leitores são mulheres…

Claro que não. Aliás, num dos meus lançamentos, houve um grupo de bombeiros que apareceu e todos compraram o livro. Fiquei muito surpreendida.

Palavras-chave

Relacionados

Mais no portal

Mais Notícias

VOLT Live: Atlante, o operador que quer ter a maior rede de carregamento rápido e ultrarrápido

VOLT Live: Atlante, o operador que quer ter a maior rede de carregamento rápido e ultrarrápido

Portugal visto pelos estrangeiros

Portugal visto pelos estrangeiros

11 ideias para fazer neste fim de semana, em Lisboa e Almada

11 ideias para fazer neste fim de semana, em Lisboa e Almada

David e Daniela trocaram o primeiro beijo na boca no “Big Brother”

David e Daniela trocaram o primeiro beijo na boca no “Big Brother”

Dânia Neto usou três vestidos no casamento: os segredos e as imagens

Dânia Neto usou três vestidos no casamento: os segredos e as imagens

JL 1396

JL 1396

Fed e BCE em direções opostas?

Fed e BCE em direções opostas?

As escolhas de guarda-roupa de Letizia e Máxima durante a visita do reis de Espanha aos Países Baixos

As escolhas de guarda-roupa de Letizia e Máxima durante a visita do reis de Espanha aos Países Baixos

Torel Palace em Lisboa: Um hotel perto do céu

Torel Palace em Lisboa: Um hotel perto do céu

40 empresas portuguesas marcam presença na 62ª edição do Salão do Móvel de Milão

40 empresas portuguesas marcam presença na 62ª edição do Salão do Móvel de Milão

Investigação da FMUP cria novo biomaterial para tratar infeções ósseas

Investigação da FMUP cria novo biomaterial para tratar infeções ósseas

A gestão aos gestores

A gestão aos gestores

Exame Informática TV nº 859: Veja dois portáteis 'loucos' e dois carros elétricos em ação

Exame Informática TV nº 859: Veja dois portáteis 'loucos' e dois carros elétricos em ação

Recorde alguns dos melhores 'looks' de Anya Taylor-Joy

Recorde alguns dos melhores 'looks' de Anya Taylor-Joy

PCP apresenta medidas para

PCP apresenta medidas para "inverter a degradação" do SNS

Nicolas Floc’h levou as cores da água para dentro do MAAT

Nicolas Floc’h levou as cores da água para dentro do MAAT

É o fim do mundo dos escritórios como o conhecemos, mas está tudo bem!

É o fim do mundo dos escritórios como o conhecemos, mas está tudo bem!

Bolieiro quer reforçar verbas para a Saúde no próximo orçamento regional

Bolieiro quer reforçar verbas para a Saúde no próximo orçamento regional

VISÃO Se7e: Celebrar Abril, em casa e na rua

VISÃO Se7e: Celebrar Abril, em casa e na rua

Atenção a nova fraude que altera IBAN do beneficiário de transferências

Atenção a nova fraude que altera IBAN do beneficiário de transferências

Os melhores momentos do casamento de Dânia Neto e Luís Matos Cunha

Os melhores momentos do casamento de Dânia Neto e Luís Matos Cunha

Extraterrestres podem ser roxos e não verdes

Extraterrestres podem ser roxos e não verdes

Lisboa através dos tempos na VISÃO História

Lisboa através dos tempos na VISÃO História

Rir é com ela!

Rir é com ela!

Há séculos que não se assistia a nada assim: biliões de cigarras vão emergir nos Estados Unidos este ano

Há séculos que não se assistia a nada assim: biliões de cigarras vão emergir nos Estados Unidos este ano

DS E-Tense Performance: Serão assim os superdesportivos do futuro?

DS E-Tense Performance: Serão assim os superdesportivos do futuro?

MAI apela à limpeza dos terrenos rurais

MAI apela à limpeza dos terrenos rurais

No dia em que celebra 50 anos, Victoria Beckham partilha imagens da infância e assume-se uma mulher feliz

No dia em que celebra 50 anos, Victoria Beckham partilha imagens da infância e assume-se uma mulher feliz

EDP Renováveis conclui venda de projeto eólico no Canadá

EDP Renováveis conclui venda de projeto eólico no Canadá

Capitão Salgueiro Maia

Capitão Salgueiro Maia

Caras Decoração: escolhas conscientes para uma casa mais sustentável

Caras Decoração: escolhas conscientes para uma casa mais sustentável

Bruna Gomes e Bernardo Sousa brilham no casamento de Dânia Neto

Bruna Gomes e Bernardo Sousa brilham no casamento de Dânia Neto

As Revoluções Francesas na VISÃO História

As Revoluções Francesas na VISÃO História

Um novo estúdio em Lisboa para jantares, showcookings, apresentações de marcas, todo decorado em português

Um novo estúdio em Lisboa para jantares, showcookings, apresentações de marcas, todo decorado em português

Pigmentarium: perfumaria de nicho inspirada na herança cultural da República Checa

Pigmentarium: perfumaria de nicho inspirada na herança cultural da República Checa

Vencedores do passatempo ‘A Grande Viagem 2: Entrega Especial’

Vencedores do passatempo ‘A Grande Viagem 2: Entrega Especial’

Tesla despede mais de 14 mil trabalhadores

Tesla despede mais de 14 mil trabalhadores

Na CARAS desta semana, o casamento de sonho de Dânia Neto e Luís Matos Cunha

Na CARAS desta semana, o casamento de sonho de Dânia Neto e Luís Matos Cunha

Catarina Gouveia junta amigas na Comporta para evento especial

Catarina Gouveia junta amigas na Comporta para evento especial

25 peças para receber a primavera em casa

25 peças para receber a primavera em casa

Lucros da Netflix disparam no primeiro trimestre

Lucros da Netflix disparam no primeiro trimestre

Regantes de Campilhas querem reforçar abastecimento de água e modernizar bloco de rega

Regantes de Campilhas querem reforçar abastecimento de água e modernizar bloco de rega

Descubra 6 pistas para ter no seu jardim os tecidos certos

Descubra 6 pistas para ter no seu jardim os tecidos certos

Teste em vídeo ao Volkswagen ID.7 Pro

Teste em vídeo ao Volkswagen ID.7 Pro

25 de Abril, 50 anos

25 de Abril, 50 anos

Parceria TIN/Público

A Trust in News e o Público estabeleceram uma parceria para partilha de conteúdos informativos nos respetivos sites