
“O humor é a única maneira de dizer a verdade sem que nos queiram assassinar”: juro-vos que foi a primeira frase que li quando abri o livro ao calhas. Como podem calcular, foi amor à primeira frase.
Essa é uma das coisas boas de ‘O sexo das mulheres’: pode abrir-se em qualquer página e há sempre qualquer coisa interessante para aprender, refletir, recordar ou discordar. Atenção: isto não é um livro de auto-ajuda, de auto-desajuda, de frases para espetar no Instagram (embora haja muitas pérolas como a de cima) ou de alguma coisa parecida com querer transformar-nos em novas mulheres.
O que não quer dizer que não o faça. O que eu quero dizer é que não há aquilo de uma pessoa estar a seguir uma história, ler 2 páginas hoje, depois fica sem ler durante uma semana, depois quando volta já não se lembra de nada do que aconteceu e tem de voltar atrás, enfim, quem tem uma vida mais stressada sabe do que eu estou a falar.
No entanto, há uma linha condutora neste livro, e dito tudo o que ficou para trás, uma vez que o comece, é pouco provável que vá conseguir parar.
Ok, então, o sexo das mulheres. A autora, a francesa Anne Akrish (filha de mãe polinésia e pai tunisino), foi jornalista e ficou famosa por não ter papas na língua. Aqui percebe-se porquê.
O fim é o princípio: “Esta é a história de uma mulher animada pela raiva que requer reparação para o seu sexo e procura salvar-se.”
Aqui se fala, a reboque de terríveis histórias pessoais, de sexo mas de muitas outras coisas: de violação, desejo, negação, maternidade, dor. Claro que também se fala de temas tão atuais como consentimento, Me Too, caça às bruxas, de onde fica a sedução no meio disto tudo, e onde pára a relação entre os sexos.
Mais do que respostas, Anne Akrish apresenta perguntas: que tipo de narrativas vamos ter daqui para a frente? De que tipo de heroínas precisamos? Que tipo de histórias vamos contar, que não as de mata-e-morre impostas pelos homens? “Agora que temos a pena na mão”, diz a certa altura, “quem poderá parar-nos? Temos doravante de decidir de que maneira fazer uso deste novo poder. Porque a controvérsia, o desacordo, a lut, a divergência, produzem ódio, é certo, mas produzem também sentido e histórias.”
Torrencial, intenso, cómico, dramático, profundo e tudo isto ao mesmo tempo, merece todas as leitoras que conseguir encontrar no seu caminho.
‘O sexo das mulheres’: Anne Akrich, Quetzal, E17,70