Afinal, os imperadores eram todos malucos e cruéis? Havia orgias todos os dias? De repente ficaram todos cristãos? E os cristão eram todos atirados aos leões? E onde fica o Astérix no meio disto tudo?
Calma: já lá vamos. Comecemos pelo princípio. Afirma o prefácio que “os mil anos de civilização romana deixaram uma marca indelével nas memórias e no imaginário político”. Lemos sinais de um declínio semelhante no nosso mundo de hoje: e no entanto, eles duraram mil anos!
Resultado: muito boa gente (eu inclusive) mantém ainda um fascínio pelos ‘antigos’, principalmente naquilo em que eles eram iparecidos connosco (“pão e circo”, recorda-vos alguma coisa?). Mas para quem não é estudioso, continua a haver muita coisa que não sabíamos ou de que temos uma ideia distorcida (e filmes clássicos como ‘Ben Hur’ ou ‘Quo Vadis’ também não ajudaram muito).
Claro que ver estes ‘romanos’ como um todo se percebe facilmente que é impossível, dados os ditos mil anos. A Roma de 750 AC não é igual à Roma de 476.
Uma coisa é certa: este é daqueles livros onde ficamos a saber uma data de coisas que não sabiamos. Os romanos eram vegetarianos? Os romanos faziam turismo? Os romanos iam a restaurantes? Os imperadores eram realmente loucos? O Império tornou-se cristão com Constantino? Os romanos eram cruéis? E cheiravam mal? O livro tenta responder a muitas perguntas e lugares-comuns que tradicionalmente ainda temos sobre o povo que mais marcou a nossa História.
Escrito por um professor e investigador de História Romana, aqui ficamos a saber que, por exemplo, os romanos já tinham um fundo de apoio às cidades, em caso de catástrofe, que as famosas orgias existiram mas não eram tão comuns como parece no cinema (e não, não havia nenhum vomitório. Foi o fim de um mito), que nos banquetes se prezava tanto a boa educação que os convidados homens estavam estritamente proibidos de manter contacto visual insistente com uma mulher casada (enfim, não sabemos se isto era cumprido ou não), Nero nem sequer estava em Roma no dia do incêndio, e era suposto que os políticos (e isto incluia o imperador) se portassem com a dignidade associada ao seu cargo.
Há questões historicamente interessantes: como aconteceu o fim do Império? Vieram os bárbaros em massa e um dia os romanos acordaram e pronto, estavam acabados? Ou a coisa foi acontecendo gradualmente, por ‘incursões’ em vez de ‘invasões’? Há mesmo uma teoria que defende que as alterações climáticas teriam tido aqui um papel, tornando o clima mais frio e abrindo espaço a vários tipos de peste e varíola.
Outros capítulos focam-se no dia a dia: que comiam os romanos? Iam ao médico? Eram saudáveis? Um capítulo especialmente interessante fala das mulheres romanas. Como se orientavam numa sociedade profundamente patriarcal? Chocante é a história de um romano que, querendo ter filhos, pediu a um amigo se podia casar com a filha deste. Acontece que ela já era casada, e o marido era-lhe muito afeiçoado. Como resolveram a coisa: o pretendente casou com a própria mulher no amigo, 30 anos mais nova. O novo casal teve um filho, e ao que parece foi feliz até à morte do segundo marido. Quando este morreu, a viúva regressou ao primeiro.
Pronto, vão ler o resto. É muito interessante e aprende-se imenso sobre aqueles que fizeram parte do nosso passado comum, e que em tanta coisa continuam a fazer parte do nosso mundo.
‘Roma Antiga: Mitos e verdades’ – Dimitri Tilloi-D’Ambrosi, Bertrand, E15,93