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Mariza Seita tem a bravura de escolher ser feliz. E fá-lo todos os dias, mesmo nos mais cinzentos. Há uma ternura que a caracteriza, que se mistura muito facilmente com a força de quem sabe viver a vida no seu todo, mas que escolhe sempre o caminho da bondade e do amor. Na forma como se olha a si própria, e na forma bonita como se dá aos outros. É na sua conta de Instagram (marizaseitatattoo) que partilha esta postura, mas é no seu dia-a-dia, enquanto tatuadora, que espalha pequenas sementes de magia em quem a procura. Sobretudo quando se dedica a tatuar mulheres que chegam até si de alguma forma incompletas e com a auto-estima mais lá em baixo. Porque lutaram contra um cancro da mama e precisam de se ver – e sentir – novamente inteiras. Ao tatuar mamilos nas próteses e nas reconstruções mamárias, Mariza está a devolver-lhes esse sentimento de todo, de inteireza. E é assim que vai deixando a sua marca no mundo, sempre em forma de amor. Um amor que passa, em primeiro lugar, pela aceitação de quem é e por saber ver a beleza que o seu corpo encerra.
No Instagram descreves-te como uma dadora de boas vibes. O brilho da vida reside precisamente nessa dádiva?
Sem dúvida. A minha felicidade reside muito nisso e é através da minha profissão que consigo perpetuar esta dádiva – adoro pessoas e a tatuagem é algo muito íntimo. Por isso, poder tocar as pessoas com o que faço e com a minha energia, poder dar-lhes alguma felicidade, é o que me completa.
E quando é que o mundo das tatuagens se afigurou como sendo o caminho?
Sempre me dei com pessoas alternativas e sempre gostei de tatuagens, apesar dos meus pais me terem obrigado a esperar pelos 18 anos para fazer a minha primeira tatuagem. Nunca fui rebelde, era uma criança super zen, uma adolescente responsável… Não tenho nenhuma rebeldia dentro de mim, acho que os dois únicos atos rebeldes que fiz na minha vida foram, aos 18 anos, fazer a minha primeira tatuagem (e ter dito aos meus pais que era temporária [risos]) e não ter terminado a minha licenciatura de Escultura para me dedicar totalmente às tatuagens. Mas não me arrependo desta decisão, se calhar se não a tivesse tomado não estaria onde estou hoje. É importante olharmos para a vida, para os seus acontecimentos e para as escolhas que fazemos de uma maneira positiva.
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Essa positividade traduz-se muito na tua maneira de estar e no tato com o outro. Há uma entrega imediata e muito amor presente no que fazes e no que dás. Houve algum momento específico que te levou a perceber a vida assim ou é algo inato em ti?
Olhando para trás, percebo que só consegui ser esta pessoa, que dá amor, depois de ter aprendido a gostar de mim. Isso é que foi o ponto de viragem, porque quando não estamos a cem por cento connosco, temos sempre algo que nos incomoda e não conseguimos estar totalmente abertos ao outro. O self-love só me assistiu quando tinha uns 22 anos, porque antes disso odiava o meu corpo, tinha ataques de choro, não gostava do que via. Mas, de repente, deu-me um clique e quando comecei realmente a gostar de mim e a perceber que tinha que respeitar o meu corpo porque é a casa da minha alma, resolvi-me comigo mesma e percebi que estava pronta para dar amor aos outros.
O self-love só me assistiu quando tinha uns 22 anos, porque antes disso odiava o meu corpo. Mas, de repente, deu-me um clique.
O amor-próprio é, inevitavelmente, o ponto de partida?
É, sempre. Se não estamos bem connosco, dificilmente vamos estar bem para os outros. Vejo o amor-próprio como aquela imagem das máscaras de oxigénio do avião, em que tens primeiro que a colocar em ti e só depois nos outros.
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Mas esse chegarmos a nós não é imediato, pois não? É um processo, é um caminho que se vai fazendo?
Sim, sem dúvida, e é um caminho que pode demorar muitos anos. O meu foi demorado, desde os 12 anos, quando comecei a querer usar coisas que sentia que não me ficavam bem, até aos 22. Foram dez anos em que não gostei de mim, em que olhava para o espelho e não gostava do que via… E repara que nunca fui de andar atrás das modas, sempre fui mais alternativa, mas usava o meu estilo para esconder algumas inseguranças. Mas nunca quis ser como as modelos, nunca gostei de corpos muito magros, portanto, nunca foi um objetivo para mim. O que eu queria era, por exemplo, ter os tornozelos mais finos, achava que tinha o nariz muito gordo… Mas são fases e se não tivesse passado por elas nunca seria a Mariza que sou hoje.
E quando é que se dá a transformação para a aceitação?
Posso dizer que nisso os meus seguidores do Instagram ajudaram-me muito. E acho que eles não têm essa noção. Quando criei a minha conta de Instagram, comecei a publicar o que vestia, e talvez por ter um estilo um bocadinho diferente, teve uma excelente aceitação. E cada vez que usava uma saia, por exemplo, partilhava, mas sem esconder as minhas inseguranças e houve muita gente a identificar-se com essas partilhas. Da mesma forma que houve muita gente a dizer-me que aquela roupa me ficava bem, que eu estava gira, que essas inseguranças não tinham razão de ser e isso foi uma grande ajuda no meu processo interior.
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Não deixa de ser curioso, sendo a internet, muitas vezes, um poço sem fundo de críticas e coisas menos bonitas, tu teres a experiência oposta.
É verdade, é curioso. Mas acho que há alguns fatores que são a chave para isso: não falar de política, não ir atrás de um tema só porque toda a gente está a falar sobre isso – gosto de discutir temas da atualidade frente a frente. Mas acho, ainda assim, que as pessoas percebem a minha ideologia e que sou uma pessoa que não vota no Chega, por exemplo. [Sorri] Acredito que o meu Instagram é uma espécie de reduto, de porto de abrigo.
Não há a apologia do elogio e devia ser uma coisa mais comum. Eu gosto de elogiar e se desta forma posso melhorar o dia do outro, por que não fazê-lo?
Uma espécie de lugar mágico, onde há espaço para tudo entre purpurinas, cores do arco-íris, muita aceitação e empoderamento pessoal?
Sim, embora não o faça propositadamente. Tudo o que escrevo é o que realmente estou a sentir naquele momento. E acredito muito que os elogios que recebemos não têm que passar só pelos outros, nós temos que aprender a elogiarmo-nos e também temos que aprender a receber elogios. Não há a apologia do elogio e devia ser uma coisa mais comum. Eu gosto de elogiar e se desta forma posso melhorar o dia do outro, por que não fazê-lo?
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Também isso é uma demonstração de amor e parece-me que tudo nesta entrevista vai dar aí, ao sentimento maior. Porque, de facto, através do teu trabalho consegues passar esse amor também a quem ultrapassou períodos mais difíceis, nomeadamente lutando contra o cancro da mama. E decidiste ajudar estas mulheres tatuando mamilos em próteses mamárias, o que muda, realmente, a vida de cada uma delas.
Sim, sem dúvida. É incrível e é um sentimento tão bom, poder fazer isto por elas, que nem consigo expressar por palavras. É ajudar a torná-las mais completas, como muitas me dizem, é o fechar do ciclo. E é maravilhoso fazer parte dessa etapa.
A minha postura passa por valorizar muito a mulher e por fazer com que as mulheres deem valor a elas próprias. Sou pelas pessoas, pelo ser-humano e se todos praticassem o respeito e a aceitação, o mundo seria um lugar muito melhor.
E fazes isto de forma totalmente altruísta.
Sim, seria impensável para mim pedir dinheiro por estas tatuagens. É como digo, umas tatuagens pagam as outras. Sinto isto como a minha missão.
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Há pouco falávamos de empoderamento e estas tatuagens são isso mesmo, não são? Empoderam quem as recebe?
São, completamente. Sabes que até há uns seis anos, não percebia o que era ser feminista, mas quando comecei a ler e a entender melhor, percebi que eu já era feminista sem saber. Não gosto de rótulos, mas claro que temos a nossa ideologia, mesmo quando vai beber a muitas inspirações. E, no meu caso, a minha postura passa por valorizar muito a mulher e por fazer com que as mulheres deem valor a elas próprias. Porque eu sei o que é ser mulher. [Risos] Sou pelas pessoas, pelo ser-humano e se todos praticassem o respeito e a aceitação, o mundo seria um lugar muito melhor.