Os miomas uterinos são os tumores pélvicos mais comuns nas mulheres. Entre 30% a 50% das mulheres com miomas têm sintomas que afetam significativamente a sua qualidade vida, provocando frequentemente hemorragias, dor e perturbação na vida sexual da mulher, levando muitas vezes ao absentismo laboral. Os miomas uterinos têm também um forte impacto ao nível da saúde psicológica da mulher, existindo nomeadamente uma grande dificuldade em exteriorizar o sofrimento diário associado à doença.
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No Dia Internacional da Mulher, quisemos abordar uma temática tão importante da saúde da mulher. Por isso mesmo, entrevistámos a Dr. Irina Ramilo, Assistente Hospitalar de Ginecologia e Obstetrícia do H. Vila Franca de Xira e do Centro Especializado de Endometriose do H. Lusíadas em Lisboa ainda autora da página @aginecologistadamelhoramiga
- O que são exatamente os miomas uterinos, que afetam em Portugal mais de dois milhões de mulheres? Têm vários graus de gravidade?
Os miomas uterinos são nódulos pélvicos benignos, que crescem no tecido do útero, com origem nas células musculares lisas do músculo uterino.
São muito frequentes nas mulheres jovens em idade reprodutiva, no entanto, a sua verdadeira incidência é desconhecida dado que muitas mulheres são assintomáticas. Nalgumas séries, o risco de surgirem na vida duma mulher chega aos 80%. São cerca de 2 a 3 vezes mais prevalente na raça negra, normalmente múltiplos e maiores.
Em termos de localização, os miomas podem ser intramurais (crescem na parede do útero e são os mais frequentes), subserosos (crescem na parede exterior do útero) ou submucosos (localizam-se na cavidade uterina/endométrio e tendem a provocar mais perdas de sangue) e a sua gravidade caracteriza-se pelo seu número, tamanho e localização.
- Quais as causas mais comuns para o seu aparecimento?
O aparecimento dos miomas uterinos, têm uma base multifatorial, e as causas vão desde fatores genéticos, fatores hormonais e de crescimento.
Na sua origem estão anomalias genéticas, são também reativos e crescem com o estímulo hormonal, nomeadamente maiores concentrações de estrogénios e progesterona, e por fatores de crescimento.
O ambiente hormonal é importante no seu desenvolvimento, já que após a menopausa param de crescer e começam a reduzir as suas dimensões.
Os fatores de risco associados são a idade, idade precoce da primeira menstruação, existência de história familiar, raça negra, obesidade, dieta rica em carnes vermelhas e álcool.
- Afeta de igual forma mulheres de todas as idades?
Sabe-se que há uma relação direta da idade da mulher com a presença de miomas uterinos.
A frequência dos miomas uterinos é alta em mulheres em idade reprodutiva, com uma prevalência de 20-40% nas mulheres em idade reprodutiva e de 70-80% aos 50 anos.
- A que sinais se deve estar atento? Como se faz o diagnóstico?
Os miomas uterinos são maioritariamente assintomáticos. Em 30-40% podem ter sinais e sintomas que vão depender do seu tamanho e da sua localização. Os sintomas mais frequentes são a hemorragia uterina anormal e excessiva, com menstruações muito abundantes e prolongadas, podendo originar anemia. Também podem originar sintomas de compressão pélvica pelo tamanho dos miomas e dor pélvica.
A hemorragia uterina anómala e excessiva é o sintoma mais frequente, principalmente sob a forma de hemorragia menstrual abundante. É a sua localização e as suas dimensões que vão determinar o grau da hemorragia, que ocorre pelo aumento da superfície endometrial que sangra, maior vascularização do útero e por não permitir a normal contractilidade vascular e uterina.
O diagnóstico faz-se pela história clínica com os sinais e sintomas descritos pela mulher. O exame pélvico, pode permitir, à inspeção, identificar miomas porque podem ser visualizados ou palpáveis.
Para a confirmação diagnóstica, realizam-se os exames complementares de diagnóstico como a ecografia pélvica, a ressonância magnética, a histeroscopia ou a histerossonografia.
- Uma mulher com miomas uterinos pode engravidar?
Uma mulher com miomas uterinos pode engravidar. É difícil estabelecer se a infertilidade estará ou não associada à presença de miomas uterinos. É considerada causa de infertilidade se existirem e não houver outro motivo aparente.
Não se consegue estabelecer o verdadeiro impacto dos miomas na reprodução, numa população de mulheres que engravida cada vez mais idosa, dada a relação inversa da idade com a fertilidade e a relação direta da mesma com a presença de miomas uterinos.
No entanto, os miomas uterinos podem interferir na fertilidade por poderem interferir na progressão dos gâmetas, na implantação dos embriões condicionadas pela distorção da cavidade uterina.
Os miomas submucosos (dentro da cavidade uterina) diminuem de forma significativa as taxas de implantação e de gravidez. São nestes miomas que a miomectomia por método vaginal (histeroscópica) prévia a qualquer tratamento ou gravidez, está comprovada como benéfica nos estudos realizados.
Se os miomas uterinos impliquem um tratamento médico, este impede a ocorrência de gravidez durante a sua instituição, porque inibem a ovulação e estarem associadas a alterações hormonais.
- De que forma afetam a vida das mulheres, quer do ponto de vista físico como psicológico?
A presença de miomas uterinos e a sua expressão clínica muito variada, díspar, polimorfa, e às vezes escassa e inespecífica traz muitas dúvidas para a mulher.
Põe em questão a sua resolução médica, cirúrgica ou repercussão futura na sua fertilidade.
Em termos físicos, pode diminuir drasticamente a qualidade de vida da mulher e implicar decisões médicas rápidas, em termos de controlo da sintomatologia, dependente da mulher e da apresentação clínica.
Em termos psicológicos, traz muitas incertezas e humor depressivo face à dificuldade de resolução de sintomas, do risco de retirar o útero (histerectomia) e de redução de fertilidade.
- Existe uma cura para os miomas uterinos?
A repercussão nas diferentes áreas da vida reprodutiva carece, habitualmente, de uma conduta diagnóstica quando o crescimento, volume ou número dos miomas geram sintomas e sinais significativos. A imagiologia (ecografia, fundamentalmente) representa um papel importante na avaliação dessa repercussão clínica e na elaboração de um plano terapêutico. Outros exames (por exemplo análises) impõem-se igualmente na integração clínica.
O tratamento médico pode controlar sintomas e diminuir o tamanho dos miomas e o tratamento cirúrgico pode excisar/retirar os miomas uterinos.
O risco de recidiva de um mioma uterino é de cerca de 20-30%, dependendo da localização, do número e tamanho dos miomas, e do sucesso do procedimento cirúrgico.
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- Quais os principais objetivos da campanha ‘WTF: Mulheres que falam de miomas’, lançada no Dia da Mulher?
A campanha “WTF: Women Talking Fibroids/Mulheres que falam de miomas” lançada neste dia importante que é o Dia 8 de março, Dia da Mulher é uma campanha global que pretende sensibilizar a população e principalmente as mulheres através da partilha nas redes sociais para alertar e identificar sinais e sintomas para identificar miomas uterinos.
O principal objetivo da campanha é aumentar a consciencialização das Mulheres sobre os Miomas Uterinos, ou seja, garantir que as mulheres têm informação credível, correta e necessária para ajudar na identificação da doença, que tem elevada prevalência.
Para muitas mulheres é difícil falar sobre aspetos da saúde da mulher como os Miomas Uterinos, então outro objetivo importante é empoderar as mulheres para falar com seu médico.
“Silêncio” é o mote da campanha, que visa alertar para o fator mais comum entre as mulheres que sofrem de miomas uterinos – o sofrimento em silêncio.
Através da consciencialização e da sensibilização empodera-se mais um pouco o universo feminino.
- Foi um processo difícil encontrar mulheres dispostas a dar o seu contributo para esta campanha?
O silêncio impera em relação a patologias ginecológicas que possam interferir na qualidade de vida das mulheres, seja em termos físicos como psicológicos. E os miomas uterinos são uma dessas patologias, até porque estão muitas vezes associados a probabilidade de afetar a fertilidade.
A campanha WTF trata-se de uma campanha global que ocorrerá em diferentes países. Neste momento temos vários testemunhos de mulheres de outros países, mas em breve teremos os nossos próprios testemunhos para divulgar.
Alertadas de que o seu caso clínico, poderão ajudar outras mulheres e apesar da dificuldade da exposição de imagem e de nome, acabou por convencer algumas mulheres portuguesas a falarem abertamente sobre o tema.
- Que outro tipo de conteúdos vamos encontrar nesta plataforma?
Esta campanha de sensibilização, que conta com o patrocínio científico da Sociedade Portuguesa de Ginecologia (SPG), reúne um conjunto de informações, testemunhos e conteúdos interativos, que visam, por um lado, informar as mulheres e, por outro, desmistificar esta doença, mostrando-lhes que não estão sozinhas e que existem muitas mulheres na mesma situação e, assim, promovendo o diálogo.
Através desta plataforma, as mulheres podem procurar informação clínica fidedigna sobre os miomas uterinos. Para além do website, a campanha vai ter as suas próprias redes socias (Facebook e Instagram) onde serão partilhadas informações relativas aos miomas (o que são, sintomas, fatores de risco), verificador de sintomas, a opinião e dicas de especialista, canal aberto para perguntas e respostas e acesso a entrevistas em órgãos sociais e acesso a testemunhos de outras mulheres e formas que irão ajudar as mulheres a lidar com os miomas uterinos.
Para permitir que o silêncio em relação a esta patologia nas mulheres termine e lhes permita empoderamento e possibilite conhecimento dos sinais e sintomas em relação aos miomas uterinos.