Temos a ideia de que a fibra é o parente pobre da nossa alimentação e que a proteína é a rainha dos nutrientes (porque se fala muito mais desta, em detrimento da primeira). No entanto, a verdade científica está longe de ser essa. Como o gastrenterologista americano Will Bulsiewicz escreve no seu livro ‘Movidos a Fibra’, logo nas primeiras páginas, “a fibra é a alma e o coração da verdadeira cura dos intestinos, e a verdadeira cura dos intestinos conduz a uma saúde melhor em tudo, do sistema cardiovascular à saúde cerebral, passando pelo bem-estar hormonal. É efetivamente poderosa”. Em Portugal, não foi feito ainda um estudo exaustivo sobre o nosso consumo de fibra, mas a avaliar pelo número de portugueses com hipertensão, colesterol elevado, problemas de obesidade e coração, arriscaria afirmar que não ingerimos os gramas de fibra diários aconselháveis: 30g (adultos).
Muitos milhões para alimentar
Porque é que a fibra é tão importante para a nossa saúde? Bem, não é só porque (como matraqueiam há anos) nos ajuda a ir ao wc todos os dias, mas porque é o alimento favorito do microbioma, o centro de operações da nossa saúde geral que ‘reside’, sobretudo, nos intestinos. Aqui vive um ‘exército’ de 39 mil milhões de microrganismos muito diversos (bactérias na sua maioria, mas também fungos, vírus, parasitas e arqueas) e todas estas ‘bocas’ precisam de se alimentar bem. São eles que, em conjunto, trabalham num só sentido: ajudar o organismo a retirar a energia dos alimentos, a eliminar toxinas, a manter em forma os anticorpos para poderem lutar contra vírus nocivos, e até a produzir hormonas, como a do bem-estar, a serotonina, entre muitas outras funções vitais.
Acontece que a fibra é o nutriente preferido desses milhões de micróbios por uma simples razão: é aquele que chega intacto aos intestinos. A maior parte dos nutrientes – como os hidratos de carbono simples, proteínas e gorduras – são absorvidos maioritariamente na corrente sanguínea antes de chegar ao intestino. A fibra, ao invés, mantém a estrutura das suas moléculas ao longo do processo digestivo, e só ali (intestino) existem as enzimas necessárias à sua decomposição.
Onde a vamos buscar?
A fibra é (quase) exclusiva do mundo vegetal (ver quadro, na página seguinte, com vários exemplos saudáveis), por isso há que apostar numa alimentação fundamentalmente à base de vegetais, fruta, sementes e leguminosas, hidratos de carbono complexos porque são digeridos de forma lenta. Já a digestão dos hidratos de carbono simples e refinados – como bolos, bolachas, pão branco, rebuçados… – começa logo na boca e em 20 minutos já estão a ser absorvidos.
O problema para a nossa saúde é que nos dias que correm os hábitos alimentares que adotámos têm-se deteriorado muito. O ritmo de vida acelerado e stressante faz com que tenhamos uma higiene de sono péssima, não façamos exercício físico e optemos, mais facilmente, por uma alimentação processada e pouco variada, em que ingerimos essencialmente açúcares refinados, exageramos na proteína animal de fraca qualidade, nas gorduras nocivas, em alimentos e bebidas pejados de adoçantes artificiais, conservantes e aditivos químicos… Quem é que paga a fatura? O nosso microbioma. Isto porque este estilo de vida pouco saudável pode dar origem a uma disbiose, na qual a comunidade dos microrganismos deixa de ‘conviver em harmonia, isto é, há um desequilíbrio de forças entre bactérias benéficas e bactérias inflamatórias e patogénicas, em que estas últimas aumentam a sua presença.
A necessidade de fibra diárias:
Dos 2 aos 5 anos: 15g
Dos 5 aos 11 anos: 20g
Dos 11 aos 16 anos: 25g
Mais de 17 anos: 30g
Sinais de alarme
Segundo Will Bulsiewicz, a disbiose pode manifestar-se de variadas formas, com níveis e gravidade diferentes, mas sobretudo em cinco categorias de sintomas:
• Digestivos: dor e inchaço abdominal, gases, azia, arrotos, diarreia e prisão de ventre, que podem dar origem a doenças como Síndrome do Cólon Irritável, Doença de Crohn ou colite ulcerosa, por exemplo;
• Metabólicos: diabetes, obesidade, colesterol alto, hipertensão;
• Imunitários: alergias, asma, doenças autoimunes;
• Neuropsiquiátricos: ansiedade, depressão, fadiga crónica, doença bipolar, enxaquecas;
• Desequilíbrios hormonais: períodos irregulares, infertilidade, endometriose, ovários policísticos, disfunção erétil.