Peço desde já desculpa pelas frases que se seguem: “Disse que tá apaixonada/Que quer ser minha namorada/Desculpa falar/Mas tem outras querendo sentar/Eu já tô fechado com a ousadia/Uma rebola de lado/A outra vem joga por cima.”
Mais uma vez, peço desculpa: “Sou esse cara que você está vendo/Sou problemático um pouco ciumento/Mas você sabe que eu sou f*** na cama/Por isso que me ama.”
Isto é o que os nossos filhos andam a ouvir e, acreditem, há versos bem piores! O chamado Funk Brasileiro ou Favela Funk já existe há muitas décadas e se calhar, mesmo cá, não é novidade para ninguém. Talvez eu agora esteja mais sensível, com um filho e uma filha em plena adolescência e o ouvido mais atento aos versos de todos os MCs que rimam em freestyle e que deitam por terra todo um caminho que tenho tentado fazer como mãe. Fui confrontada com esta realidade – ou melhor, encurralada – numa festa que dei em minha casa há um par de meses, com mais de duas dezenas de adolescentes. Achei por bem disponibilizar uma daquelas maquinetas de karaoke, das quais normalmente fujo: afinal, não fiz mal a ninguém para ter de ouvir boas músicas a serem chacinadas a noite inteira. Mas neste caso achei que estariam entretidas com a Miley Cyrus ou a Taylor Swift. Em vez disso, saiu-me na rifa um tal Kevinho que rapidamente me apeteceu rifar.
Dizem-me algumas pessoas que o que os atrai é o ritmo, não tanto as palavras, que todos nós já cantámos coisas que não percebíamos. Sim, talvez durante algum tempo estivesse convencida que o Hotel California, dos Eagles, fosse acerca de umas férias num resort de luxo com piscina, mas não esquecer que muitas vezes o inglês criava algumas barreiras à interpretação – quem não se lembra de cantar ‘Cavalinho na feira a comer”, quando o que os Men at Work diziam, em Down Under, era “Travelling in a fried-out kombi”. Sim! E os Nirvana cantavam, logo no início de Smells Like Teen Spirit, “Load up on guns” e nós dizíamos “Não há pão quente” (escrito não faz sentido, mas experimente ouvir!) E tantas vezes fomos apanhados a falsear letras quando de repente a música parava e se fazia silêncio.
Mas estamos a falar de canções em português, ainda que do Brasil, e crianças pequenas a papaguear letras que são tudo menos encriptadas, a cantalorar “Essa garota rebola a bunda em cima de mim” ou “Comi [dizem-me que este comer agora significa o ‘curtir’ da minha altura] sua amiga, me desculpa”. De repente, o “Toda nua só com um véu” parece um refrão digno de uma canção aprendida na Catequese.
A questão é: O que fazemos? Ignoramos? Proibimos e não serve de nada porque vão ouvir à mesma? Acabamos com a música que o grupo de adolescentes está a ouvir lá em casa, correndo o risco de as afugentar para outras paragens piores? Pedimos para lerem as letras e explicamos o querem dizer e simplesmente esperamos que passe a fase da “bunda” e da “piroca” como passou a fase do cocó chichi da primeira infância? A resposta é: Não sei – mas aceito sugestões. Nós, mães, não temos todas as respostas. E está tudo bem. Já cantava Madonna: “Poppadom peach, I’m in trouble deep”…