Durante mais de uma década, a definição de políticas de saúde e social tiveram pouca participação dos cidadãos. As entidades oficiais da saúde e social tinham dificuldade em articular com as famílias afetadas por doenças raras e seus representantes. As próprias associações estavam muito viradas para dentro. A criação da RD-Portugal levou muitos meses a acontecer porque exigiu o contacto com cada uma das associações para a definição da missão, visão, valores e estratégia, que fosse transversal e refletisse a representatividade dos seus membros.
Em maio de 2021, foi celebrada a escritura e esta União de Associações conta com mais de 30 membros. Trazer os temas das Doenças Raras (DR) para a ordem do dia, contribuir para a melhoria das condições de vida destas famílias, ser a entidade de referência nacional quando se pretenda abordar as DR em colaboração ativa e estreita com as entidades oficiais nacionais e internacionais, traduzem o centro da nossa atuação.
As maiores dificuldades das pessoas com doença crónica passam pela dificuldade em navegar na complexidade do sistema, o que, nas pessoas afetadas por doença rara, é agravado. Para estas, destacamos 5 linhas principais:
1. O diagnóstico e o tempo até ao diagnóstico;
2. Para a maioria das doenças raras não existe tratamento e há a dificuldade em motivar a indústria farmacêutica a apostar na investigação destes tratamentos;
3. No modelo de assistência, os hospitais de especialidade e os chamados centros de referência obrigam a deslocações por vezes incomportáveis. Usa-se muito pouco a tecnologia e o trabalho em rede de modo a proteger as famílias;
4. Segue-se o viver com a diferença e o estigma. Uma parte significativa das doenças raras são degenerativas e necessitam de integração. Por muito que se legisle, não há fiscalização, portanto há grande diferença entre o que está no papel e a realidade;
5. Por último, os cuidadores têm de enfrentar todos os problemas inerentes aos pontos anteriores e acrescentando que não têm descanso. Por exemplo, quando neste período a grande maioria das pessoas pensa em férias, grande parte dos cuidadores não têm esse privilégio, vendo por vezes a sua situação agravada com a falta das (eventualmente poucas) respostas do resto do ano.
Acreditamos que a verdadeira integração no Serviço Nacional de Saúde do Cartão de Pessoa com Doença Rara, criado em 2015, nos permitirá ter maior organização e personalização das soluções.
O projeto “Informar sem Dramatizar” (IsD) foi pensado dentro da RD-Portugal para chegar a todas as crianças e jovens dos 3 aos 18 anos com o intuito de alertar e sensibilizar para as especificidades relacionadas com as Doenças Raras e a Deficiência. Precisamos de desmistificar estes temas de forma a integrá-los na sociedade. A melhor forma, será pelo ensino e pela positiva. Introduzi-los na sala de aula, fará com que estas discussões passem para o dia-dia, para os ambientes familiares ou informais e haja maior procura de informação certificada.
Juntamente com os materiais desenvolvidos para o IsD que enviamos às escolas, vão inquéritos aos professores, às escolas, aos alunos e aos encarregados de educação.
Os resultados após o primeiro ano são muito bons. Em cerca de 40 escolas no continente e ilhas, chegámos a mais de 170 turmas, quase 3400 alunos. Numa escala de 1 (muito pouco) a 4 (muito), os docentes avaliaram em 3.8 a relevância, 3.5 a adequação e a facilidade de implementação. Já os alunos avaliaram em 3.8 o quanto gostaram da atividade. Os encarregados de educação afirmaram que 89% dos educandos falaram sobre o projeto na escola e 77% conseguiram retransmitir algo apreendido sobre doenças raras.
Este projeto ainda mal zarpou do porto. Queremos que se transforme num programa nacional, parte do Plano Nacional de Educação. Temos tido o apoio da Escola Nacional de Saúde Pública e da Direção Geral de Educação para garantir a qualidade e assertividade dos conteúdos e metodologia do modelo para melhoria contínua. Quando tivermos o projeto consolidado em Portugal queremos partilhá-lo com outros países, para os quais já fomos consultados nesse sentido.
Iniciámos a criação do Conselho Científico que irá apoiar o Executivo da RD-Portugal em áreas científicas e tecnológicas. Estamos também a pensar numa iniciativa para ir às empresas e alertá-las para o impacto na economia dos 6% a 8% da população afetada. Com informação adequada, sem dramas, pretendemos aumentar o investimento em estudos científicos e em prevenção.
Se há algo que as entidades oficiais da saúde e social poderão afirmar, já e cada vez mais, é saberem que sobre Doenças Raras e representação das famílias, quem devem contactar.
Os textos nesta secção refletem a opinião pessoal dos autores. Não representam a ACTIVA nem espelham o seu posicionamento editorial.