A Miocardiopatia Amilóide por Transtirretina (ATTR-CM) surge pela acumulação de porções insolúveis de uma proteína (que neste caso é a transtirretina), formando as designadas fibrilas de amilóide, que infiltram o músculo do coração. Rara, mas muito grave, pode ser Hereditária, devido a uma mutação no gene da transtirretina, ou ser causada por fenómenos de desagregação, ou desestabilização da estrutura da transtirretina, que parecem estar relacionados com o envelhecimento. Neste último caso, é denominada “Wild-Type” (ou “selvagem”, sendo antigamente designada de “senil”).
Estão descritas mais de 100 mutações diferentes no gene da transtirretina e, dependendo da mutação em causa, o atingimento pode ser predominantemente neurológico (de que é exemplo a “Doença dos Pezinhos” ou Paramiloidose, cujos sintomas se iniciam geralmente na 3.ª década de vida e que, apesar de rara, tem um foco endémico em Portugal) ou cardíaco (ATTR-CM). Neste último caso, a ATTR-CM Hereditária manifesta-se habitualmente entre os 50 e os 60 anos, com incidência semelhante em ambos os sexos e é possível que não haja um histórico da doença na família. Apresenta-se frequentemente como insuficiência cardíaca e/ou como arritmias ou problemas da condução elétrica cardíaca, mas também podem coexistir sintomas neurológicos e/ou gastrointestinais, e um historial de síndrome do túnel cárpico bilateral.
A ATTR-CM Wild-Type, por outro lado, é bastante mais frequente do que a Hereditária, sendo especialmente prevalente em homens caucasianos com insuficiência cardíaca, arritmias como a fibrilhação auricular, ou estenose aórtica grave. Manifesta-se, normalmente, mais tarde: depois dos 60 anos, sendo particularmente frequente depois dos 80. Não é habitual haver atingimento extra-cardíaco, com exceção da síndrome do túnel cárpico.
Será ATTR-CM?
Caso haja suspeita de se tratar de ATTR-CM ou se considere que há risco da doença se desenvolver, existem análises e exames que se podem fazer para confirmar essa hipótese. A análise de sangue e urina, bem como a realização de Electrocardiograma, Ecocardiograma e Cintigrafia Óssea são os pilares do diagnóstico. A Ressonância Magnética Cardíaca e a Biópsia
Cardíaca podem ser necessárias em alguns casos. O Teste Genético é geralmente aconselhado numa fase posterior, em que já se fez o diagnóstico de ATTR-CM, para distinguir a doença Hereditária da Wild-Type.
Sinais e sintomas que não deve desvalorizar
Apesar de muito impactante, a ATTR-CM pode ser confundida com outras doenças do foro cardíaco. Apresenta, frequentemente, sintomas e sinais comuns a outras causas de insuficiência cardíaca: cansaço extremo, “falta de ar” ou dificuldade em respirar, palpitações, inchaço simétrico nas pernas, tonturas, desmaios ou oscilações involuntárias de peso. Devemos, também, estar atentos a problemas oculares, a uma eventual rotura do tendão bicipital sem que tenha havido trauma, a problemas gastrointestinais, a dormência, formigueiro e dor nos dedos das mãos, ou diminuição de sensibilidade, formigueiro ou dor nos pés. Estes sintomas podem estar relacionados com o depósito de fibrilas de amilóide em diferentes órgãos.
Não se isole
Atendendo ao facto de exigir um elevado nível de suspeição e algum conhecimento diferenciado, era, infelizmente, frequente que o diagnóstico de ATTR-CM demorasse vários anos até ser feito, causando grande desgaste nos doentes. Esperamos que em breve, com a maior divulgação da doença, maior conhecimento nesta área e possibilidade de tratamento específico, os profissionais de saúde estejam mais familiarizados com esta patologia e que os diagnósticos passem a ser mais rápidos, o que é fundamental para um melhor prognóstico.
Sabemos que a doença está claramente subdiagnosticada e que, com o envelhecimento da população, a ATTR-CM Wild-Type será cada vez mais frequente.
Para além do acompanhamento médico regular, é fundamental que os doentes tenham uma boa rede de suporte. Como noutros casos e patologias, o acompanhamento por parte de família e amigos é essencial. Existem, também, entidades como a AADIC – Associação de Apoio aos Doentes com Insuficiência Cardíaca, que poderão facilitar o processo e ajudar o doente a encontrar o suporte de que necessita para controlar a doença, seja através do aconselhamento ou da partilha de experiências.
Adicionalmente, a aposta no conhecimento e na literacia em saúde será uma importante mais-valia. Através destas ferramentas, o doente pode acompanhar melhor a evolução da doença, debater e definir estratégias com a equipa médica e tomar as melhores decisões.
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