Lembra-se daquelas dores de barriga de que a sua criança se queixava todos os dias antes de ir para a escola? Na barriga não tinha nada era tudo, como diriam as nossas avós, ‘nervos’. Ou, como diríamos nós, stresse. É que às vezes são as pequenas coisas do dia-a-dia que nos afectam mais. A nós e a eles.
Quando falamos em stresse, vem-nos logo à ideia um executivo engravatado a braços com dois telemóveis e quatro assessores ou então uma mãe de família a tentar equilibrar filhos, profissão e ginástica. Mas um bebé de meses pode sofrer de stresse. Aliás, um bebé que ainda não nasceu pode sofrer de stresse, através da mãe. Uma criança de três anos pode sofrer de stresse. E escusado será dizer que, no nosso mundo, os adolescentes são fortes candidatos a roer as unhas e a andar com os nervos em franja.
Ainda há quem se ria: stresse infantil? Mas que preocupações pode haver na infância, quando não há prestações de nada a pagar, nem decisões difíceis a tomar, nem a mulher a dias que não aparece, o cano da casa de banho que rebentou e o amor da nossa vida que fugiu com outra? Quem não tem memória curta sabe que as crianças têm muitas preocupações e muito menos defesas para lidar com elas.
Claro que há crianças e crianças: há as que são capazes desde muito cedo de criar as suas próprias defesas e aquelas a quem tudo parece afectar, desde o copo que caiu da mesa ao gato que saiu da sala. Há as que interiorizam e as que fazem birras. Importa estar atenta aos sinais de alerta que todas dão quando a vida exige de mais.
E lembre-se de que, quanto mais pequenos, mais falam em código: uma criança de três anos não lhe dirá ‘ai, que ralada que eu estou’. Mais depressa dirá: ‘Dói-me tanto a barriga.’ Tenha especial atenção às muito caladinhas: as que tentam agradar aos pais nunca se queixam, não falam muito. Geralmente, são crianças que interiorizam o stresse. Ajude-as a perceber que são amadas, ajude-as a gostarem de si próprias e fale muito com elas.
O QUE PODE AFECTÁ-LOS
O stresse tem a ver com aquilo que nos é pedido ou que sentimos que nos é pedido e a nossa capacidade para lidar com isso. A causa pode ir das situações mais dramáticas morte na família, divórcio, doença, problemas financeiros até às que nos parecem mais comezinhas problemas na escola, uma visita ao médico, um irmão rival.
À medida que as crianças crescem, as pressões exteriores tornam-se cada vez mais fortes. E o mundo não ajuda: desde o momento em que eles acordam que tudo é feito a correr.
Quantas vezes não ficamos impacientes porque eles levam eternidades para se vestirem, lavarem os dentes ou despacharem o pequeno-almoço? Não, não é para nos chatear. É que as crianças ainda estão muito perto do ritmo antigo, o ritmo da Pré-História, em que se tinha tempo para olhar para o céu e ver as estrelas (enfim, calculamos nós..), e o ritmo natural delas não é esta montanha-russa em que as obrigamos a viver.
PODEMOS TORNÁ-LOS IMPERMEÁVEIS?
A melhor maneira de os ajudar é reduzir a velocidade a que andamos todos. Impossível? Se pensarmos bem, talvez não seja. Há coisas que não podemos mudar. Mas outras, se calhar, até podemos. É mesmo preciso que ele ande em tantas actividades? O teste para descobrir se ele tem actividades a mais é uma pergunta: ele tem tempo para não fazer nada? ‘Não fazer nada’ não é estar na natação ou nos computadores ou a fazer os trabalhos, é não fazer nada mesmo. Se não tem, reduza as actividades. Estamos num mundo competitivo, sim, mas não se deixe cegar por isso: aquilo de que as crianças mais precisam não é de inglês, computadores e natação, é de estar com as pessoas que gostam delas.
Para as mais preocupadas aquelas crianças para quem a vida é toda uma grande tragédia, saber o que as espera em potenciais situações de stresse e estar preparado para isso pode reduzir imenso a angústia do desconhecido. Ajude-as a planear o tempo de estudos para os testes, por exemplo.
Se o seu filho é mais novo e tem medo de injecções, fale-lhe da visita ao médico com antecedência, leia-lhe livros sobre isso e brinque aos médicos com bonecas e ursos, em vez de aterrar com ele de chofre no consultório rezando para que ele não reconheça a sala. Não diga que não há nada de que ter medo: se vir que ele está preocupado, não ignore isso. O melhor é perguntar-lhe e desmontar os medos. Se ele vai levar uma injecção, não lhe diga que não dói nada: afinal, é mentira. Diga-lhe que se sente a picada mas que passa num instante, por exemplo.
Diga-lhe que não faz mal sentir-se zangado, com medo, ansioso. Afinal, toda a gente se sente assim de vez em quando. Pode contar-lhe histórias suas (um exame de Matemática? Uma professora complicada?) para lhe provar que os pais também têm medo e que é possível conquistá-lo. Encoraje-o a pensar que é capaz de resolver as situações, que tem valor e que é digno de que os outros gostem dele.
QUANDO TUDO COMEÇA NOS PAIS
Talvez não seja possível e talvez não seja desejável retirar toda a angústia da vida das crianças. Mas uma família estável estável não quer dizer necessariamente tradicional e um ambiente familiar sereno, onde há amor, carinho e segurança, continuam a ser os principais remédios anti-stresse para crianças e adultos. Uma criança que gosta de si própria e que confia em si sabe que a vida pode ser complicada mas que irá encontrar uma maneira de resolver os problemas. Uma criança que gosta de si própria consegue transformar o stresse num amigo, serve-se dele para progredir, para se tornar mais forte, para perceber que não está sozinha.
O mais importante é perceber que nada tem imensa importância. Se já tem uma criança enervada, não piore ainda mais a situação: escolha as suas batalhas. Não lhe exija que seja perfeita: uma criança é uma criança, não é um adulto em miniatura. A escola é actualmente um dos principais focos de stresse. Se vir que ela tem trabalho a mais, fale com os professores. E não vale a pena exigir que ele tenha 5 a todas as disciplinas se ele só pode dar 3 ou 4. Seja o maior admirador da sua criança e encoraje-a a chegar o mais alto possível, mas não exija que ela seja uma criança diferente e não lhe peça aquilo que ela não pode, ou não quer, dar.
E às vezes não nos apercebemos de qualquer coisa simples: o stresse das crianças pode começar nos pais. Por isso é que é tão importante tratar de si. Se não estiver calma e feliz, como é que há-de exigir isso à sua criança?
sinais de ALERTA
Ser irrequieto não é ser necessariamente stressado e brincar às guerras não quer dizer que se está pelos cabelos. Uma criança não tem de ser ‘sossegadinha’: brincadeiras agressivas, enérgicas e movimentadas são necessárias para que elas deitem cá para fora toda a energia acumulada, e ficar-se eufórico com uma boa batalha de almofadas ou uma sessão de gargalhada é do mais saudável que pode haver. Fique atenta a outro tipo de sinais, nem sempre óbvios: alterações de comportamento, birras demasiado frequentes, sonos trocados, tristeza. Algumas crianças queixam-se de dores de cabeça ou de barriga, outras têm dificuldade em concentrar-se, andam sempre apressadas e preocupadas, passam muito tempo sozinhas ou são constantemente agressivas. As mais novas podem chuchar no dedo, ter dificuldade para deixar a chucha ou enrolar o cabelo. As mais velhas podem desatar a pôr em causa todo o tipo de autoridade.
As melhores técnicas de RELAXAMENTO
EXERCÍCIO
Escolha com ele um tipo de exercício de que ele goste.
MÚSICA
Calma e sossegada. Ensine-o a fechar os olhos e a visualizar paisagens.
CONVERSA
Como terapia, é imbatível, mas só se for de facto uma conversa, não um monólogo, nem um sermão, nem um interrogatório.
ALIMENTAÇÃO
Atenção ao excesso de açúcar e cafeína.
SONO
A grande maioria das crianças e dos adolescentes não dorme aquilo que deveria dormir. Habitue-o a deitar-se mais cedo.
MASSAGENS
Uma massagem nas costas à noite é tiro e queda.
PUZZLES
Ensine-o a recuperar o prazer de desenhar, tricotar, fazer puzzles e até de cozinhar.
RIR
Mantenha o sentido de humor. Há sempre alguma coisa que nos faz rir.
Os MEDOS em cada idade
1 ANO. A ansiedade tende a aumentar entre os 6 e os 18 meses, altura em que eles descobrem o medo. O mimo e a estabilidade são especialmente importantes.
3 ANOS. Têm medo que lhes ralhem, medo que deixem de gostar deles por já não serem bebés, medo que as coisas se partam, medo de desconhecidos, medo de animais selvagens, do escuro e de fantasmas.
4 ANOS. Têm medo da insegurança e da rejeição, e especial atenção aos medos dos adultos, que tendem a copiar.
5 ANOS. Têm medos irracionais, medo de perder as coisas preferidas, medo que os outros não os aprovem, medo de serem abandonados.
6 ANOS. Têm medo de perder a aprovação dos pais. Há competição com os colegas ou irmãos. Gostam de cumprir regras. Cria-se tensão entre o desejo de independência e a ligação à família.
7 ANOS. Podem tornar-se pensativos e são especialmente sensíveis a alterações, problemas e discussões dentro da família.
8 ANOS. Têm medo de falhar: podem ser muito críticos com eles próprios e ressentir-se da autoridade dos pais.
9 ANOS. Têm medo de que os envergonhem, medo de perderem aquilo a que têm direito. Grande tensão entre os sexos: preferem andar separados e marcar vincadamente as diferenças. Podem ser um pouco melancólicos e rebeldes.
10 – 12 ANOS. Às questões típicas da identidade e da independência juntam-se as exigências escolares e da família. Os amigos têm cada vez mais importância.