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Inara Prusakova

*artigo publicado originalmente na revista ACTIVA de junho de 2018

Seis anos depois dos primeiros sintomas, Maria Guedes conheceu o diagnóstico da sua doença: hipotiroidismo. Finalmente havia um nome, uma razão para aquilo que sentia e que sempre tinha sido justificado com o facto de ter ‘vida de mãe’. Tudo começou aos 30 anos, depois do nascimento do seu filho Pedro. Cansaço permanente, sono constante, pele seca e baça, cabelo seco e quebradiço. Não ligou a estes sinais pois associou às mudanças hormonais e às noites maldormidas, que sempre ocorrem quando se tem um bebé. O filho entretanto cresceu e os sintomas continuavam e pareciam até, alguns deles, agravar-se, como o peso, que aos poucos se ia acumulando, sobretudo à volta da cintura, e a deixava exasperada, porque por mais dietas que fizesse a balança não se mexia um milímetro. Falou com o médico de família mas este receitou-lhe comprimidos para dormir, umas vitaminas para fortalecer o cabelo e as unhas e fazer umas caminhadas. Esperou meses, para que fizessem efeito, e ao fim de um ano achou que estava a melhorar. Foi quando decidiu que queria ter um segundo filho. Deixou de tomar a pílula, e quase um ano depois… nada. Seria a sua idade ‘avançada’ a culpada da dificuldade em engravidar? Como os seus ciclos menstruais pareciam ter enlouquecido, consultou uma ginecologista, que pediu uma série de análises e levantou a hipótese do hipotiroidismo quando ouviu a lista de sintomas que a atormentavam há uns anos. Uma simples análise ao sangue e pronto: diagnóstico feito.
Calcula-se que haja 10 mil a 200 mil doentes, mas quantos casos haverá em Portugal por descobrir, como o de Maria Guedes?

O que é?

Hipotiroidismo é uma disfunção da tiroide, uma glândula endócrina (em forma de borboleta, com 2x4cm, que está na base do pescoço) cuja função é segregar hormonas que são depois libertadas na circulação sanguínea. Quando se tem hipotiroidismo há uma diminuição da produção de hormonas tiroideias e isso vai ter um grande impacto no nosso organismo porque estas hormonas influenciam o peso, o metabolismo, o ritmo cardíaco, o funcionamento do cérebro, os músculos, além de regularem o sistema digestivo e são ainda importantes na manutenção da temperatura do corpo.
“Esta é uma doença maioritariamente feminina, sobretudo porque no nosso país a principal causa é autoimune, e as doenças autoimunes têm uma maior prevalência no sexo feminino. Por outro lado, os eventos que ocorrem ao longo da vida das mulheres, como a gravidez, torna-as mais propensas ao desenvolvimento de alterações da função tiroideia”, explica-nos Daniela Guelho, endocrinologista do Hospital Central de Leiria.

O desafio da gravidez

Além das causas autoimunes, o hipotiroidismo pode também ter origem numa disfunção da hipófise ou hipotálamo, na toma de medicamentos e ainda por carência de iodo. Esta última causa é agora bastante menos frequente no nosso país do que era há 30-40 anos devido às grandes melhorias nas condições de vida, mas ainda assim “tem-se constatado que em Portugal o aporte de iodo fica aquém do esperado. Desta forma, os programas de suplementação com iodo na população portuguesa, maioritariamente pela utilização de sal iodado, são extremamente importantes. Também os estudos em grávidas mostraram uma grande carência de iodo nesta população, mesmo em zonas do litoral. Durante a gravidez, até o feto ter a tiroide formada, fica dependente das hormonas da mãe, e as hormonas tiroideias são formadas com uma grande quantidade de iodo na sua composição. O que acontece na gravidez é que há um aumento da necessidade de iodo e se a grávida já tiver deficiência de iodo não vai formar tantas hormonas tiroideias e vai desenvolver hipotiroidismo, o que pode causar alterações durante a gravidez assim como no desenvolvimento cognitivo futuro do bebé. Desta forma, as recomendações da Direção-Geral de Saúde preconizam que as mulheres que não apresentam contra- indicações específicas devem receber um suplemento diário de iodo durante a pré-conceção, a gravidez e o período de amamentação exclusiva a leite materno”, remata a endocrinologista.

Sinais de alerta

O problema em diagnosticar hipotiroidismo está no facto de os seus sintomas se poderem manifestar de forma muito gradual e poderem ser confundidos com outras doenças. “Os sintomas são muitas vezes insidiosos, inespecíficos e comuns a múltiplas patologias. De qualquer maneira, as pessoas, e vou referir mais as mulheres porque são elas que sofrem mais, no início queixam-se sobretudo de cabelo seco, com queda mais acentuada e unhas quebradiças. Por vezes, as queixas também podem estar relacionadas com perturbações gastrointestinais, nomeadamente obstipação, aumento de peso, sonolência, alterações de memória, cansaço e intolerância ao frio. Há ainda a referência a alterações menstruais como a amenorreia [ausência de menstruação] ou oligomenorreia [em que os ciclos menstruais têm intervalos muito grandes entre si, mais de 35 dias], e em alguns casos as alterações da função tiroideia são identificadas em contexto de infertilidade”, esclarece Daniela Guelho.

Diagnóstico
e tratamento

A conversa com o médico é (sempre) meio caminho andado para se descobrir o fio à meada e chegar ao diagnóstico. O especialista tem de fazer a história clínica do doente e avaliar sintomas. Muitos casos de hipotiroidismo têm uma componente genética importante, por isso informe-o se a sua mãe, irmã ou tia têm essa doença, é uma pista muito relevante em todo este puzzle. Depois há que recorrer aos exames médicos, “além da análise da TSH e de T4 livre que nos permite estabelecer ou excluir o diagnóstico de hipotiroidismo, temos de juntar um exame de imagem, ecografia (para excluir a presença de lesões nodulares) e para confirmar uma tiroidite autoimune fazemos o doseamento de anticorpos específicos”, revela a endocrinologista.
Confirmado o diagnóstico, o tratamento padrão é medicamentoso e consiste na “administração oral de levotiroxina sintética, disponível em múltiplas dosagens, que constitui um fármaco bem tolerado pelos doentes e que, quando administrado na dose certa, raramente se associa a efeitos adversos”, indica Daniela Guelho. Na maior parte dos casos não é muito difícil acertar na dose, esta é “ajustada à idade, peso e contexto clínico da pessoa – por exemplo, se tiver problemas cardiovasculares, terá de começar com dosagens inferiores – e depois de atingir níveis estáveis permite manter a mesma dose durante muitos anos, fazendo uma vigilância anual. É um tratamento para a vida em que a toma do fármaco é feita diariamente, em jejum, cerca de 20-30 minutos antes do pequeno almoço para ser totalmente absorvido”, remata a especialista.

Cuidados com a alimentação quando se tem tiroide ‘preguiçosa’

Sempre ouvimos falar que as pessoas que sofrem de hipotiroidismo têm muitas dificuldades em perder os quilos que têm a mais. Será? Falámos com a nutricionista Lillian Barros, que nos revelou os cuidados para perder o peso a mais, o que comer e o que evitar se está a ser medicada para o hipotiroidismo.

1. Ajustar a medicação é essencial. “Só depois é que devemos iniciar as estratégias alimentares para reverter o peso excessivo e outra sintomatologia associada, como o cansaço extremo, prisão de ventre, perda de massa muscular, entre outras.”

2. Emagrecer não é um objetivo inatingível. Uma mulher com hipotiroidismo, medicada e estabilizada, terá a mesma facilidade em perder peso que uma mulher da mesma idade sem esse problema. “É por este motivo que pedimos sempre que o acompanhamento médico destas situações seja feito primeiro e depois sim uma perda de peso acompanhada.”

3. Atenção à interação com os medicamentos. “Cuidado com o consumo excessivo de cafeína, contida em bebidas refrigerantes, café, chá verde e preto, porque vai diminuir a absorção da medicação específica para esta condição de saúde.” Também o consumo de alimentos como sementes de linhaça e soja (e seus derivados, como a bebida de soja, iogurtes de soja e tofu), que atualmente estão muito em voga, devem ser evitados. Os fitoestrogéneos da soja diminuem a absorção do fármaco utilizado no tratamento do hipotiroidismo e, para além disso, são capazes de suprimir por si só a atividade da tiroide, agravando o hipotiroidismo.

4. Se a origem é carência de iodo, aí é necessário o aumento do consumo deste mineral. “O sal iodado é a melhor forma de suplementação em iodo. No entanto, uma alimentação equilibrada fornece o iodo que precisamos, especialmente se comermos peixe com regularidade.”

5. Evite o consumo de açúcares e alimentos com índices glicémicos elevados, como pão branco, massas e doces. Estes alimentos aumentam muito a necessidade de insulina. A sua libertação pelo pâncreas obriga a uma boa coordenação com outras glândulas, nomeadamente as suprarrenais e a tiroide.

6. Melhore a eficácia dos fármacos. 
A saúde da tiroide está intimamente relacionada com a ingestão de minerais tais como o selénio, zinco e ferro, de vitamina A, ácidos gordos ómega 3 com um importante papel anti-inflamatório (salmão, sardinha) e hidratos de carbono complexos, que têm um índice glicémico baixo, para evitar flutuações rápidas de açúcar no sangue (glicemia).

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