Vou começar este artigo pedindo-lhe para responder a uma pergunta: tem a certeza de que respira bem? Parece uma pergunta parva, afinal trata-se de uma função vital sem a qual não existimos, tão básica que nem pensamos nela. É a primeira coisa que fazemos quando nascemos e a última quando morremos, aliás, não é por acaso que a expressão ‘o último suspiro’ é sinónimo de falecer. Mas a pergunta não é assim tão descabida. Aparentemente, a esmagadora maioria das pessoas respira de forma errada e isso pode dar origem a uma série de problemas de saúde, tanto físicos como psicológicos, mais à frente explicamos quais, mas antes vou propor-lhe que faça uma experiência em dois momentos. Primeiro, em pé ou sentada numa cadeira mas com as costas direitas, inspire devagar mas profundamente. Expire com calma. Agora, repita mais uma vez, inspire e expire, mas desta vez preste bem atenção ao que acontece aos seus ombros. Eles levantam ou não se mexem? Se sobem é sinal de que, quando respira, não está a usar o diafragma – o principal músculo responsável pela respiração nos seres humanos –, mas sim músculos secundários, auxiliares no processo, que devemos usar sobretudo quando estamos em esforço (ao praticar uma atividade física), ou em situações que nos provocam stresse ou ansiedade.
Agora, deite-se no chão com a cabeça apoiada numa almofada. Coloque uma mão sobre o peito e outra sobre o estômago. Inspire e expire profundamente. Qual é a mão que mexe mais, a que está sobre o peito ou sobre a barriga? Se for a da barriga, ótimo, é sinal de que está a usar o diafragma, como é suposto. Se for a mão do peito, significa que está a respirar de forma incorreta. Há especialistas que se referem a este tipo de respiração como vertical, porque levanta os ombros, e horizontal à respiração que usa o diafragma, que se expande no momento em que inspiramos. A razão por que devemos respirar com a ‘ajuda’ deste órgão é porque é essa a sua função, é ele que permite abrir a caixa torácica convenientemente, permitindo assim que os pulmões se encham de ar na proporção adequada para depois também haver as trocas gasosas necessárias nos vasos sanguíneos e a expulsão das toxinas, tudo nas quantidades certas. Ao respirarmos mal não estamos a oxigenar o suficiente, nem a libertar o dióxido de carbono que é devido. E infelizmente é isso que muitos de nós, adultos, fazemos.
22 mil é o número de vezes que um adulto respira por dia (15 por minuto).
Ninguém nasce ensinado
Sabia que quando nascemos a nossa respiração não tem um ritmo consistente durante as primeiras semanas de vida? Quem o diz é Danny Penman, professor certificado de meditação e autor do livro ‘The Art of Breathing’ (a arte de respirar). Ali, o autor revela que os recém-nascidos não têm um ritmo de respiração constante, só respiram quando precisam (entre 30 a 60 respirações por minuto acordados e 20 a dormir), e é por isso que às vezes eles pregam-nos grandes sustos… com aquele segundo de espera a mais que faz o nosso coração disparar. À medida que as semanas passam, os músculos associados à respiração desenvolvem-se e ela começa a ter um ritmo consistente, assumindo o diafragma o seu papel central neste processo. Mas, segundo Belisa Vranich, psicóloga, autora do livro ‘Breathe’ e dos workshops The Breathing Class, por volta dos 5-10 anos o nosso padrão respiratório altera-se e passamos a fazer cada vez mais uma respiração vertical, levantando os ombros, relevando o diafragma para segundo plano. Porquê? Já lá vamos…
A nova normalidade
O interesse de Belisa por esta temática começou quando um dia acordou com uma dor lancinante no maxilar inferior. Foi ao dentista, pensando que seria essa a solução, mas depois de ter gasto milhares de dólares percebeu que o problema de ranger os dentes tinha por base o imenso stresse em que vivia. Resolveu inscrever-se em aulas de yoga e foi aí que começou a ouvir falar na importância de respirar bem. Começou a ler tudo o que apanhava sobre o tema, livros e artigos científicos sobre respiração celular, rácios de trocas celulares, estudos sobre respiração no parto, no mergulho, a cantar, nas artes marciais… ufa! Depois de bem documentada olhou ao seu redor e percebeu que, tal como ela, quase toda a gente vivia sob stresse e respirava mal, levantando os ombros quando inspiram. Então, se com poucos anos de vida já sabemos respirar como deve ser, porque vamos perdendo essa capacidade? Aparentemente, a culpa está na vida moderna. Aos 5-10 anos é a idade em que começamos a frequentar a escola, lembra Belisa, e passamos a estar muitas horas sentados, posição que, aliás, se prolonga por toda a idade adulta, já que muitos temos empregos que nos obrigam a estar dezenas de horas por semana em frente a um computador, com as costas encurvadas. Depois, ainda vamos para casa e descomprimimos em frente à tv… sentadinhos no sofá. Experimente respirar da forma correta, contraindo e expandindo o diafragma sentada assim. Não é possível! E depois de anos nesta rotina, o normal é que o nosso padrão respiratório se vá alterando, daí que, atualmente, a forma como respiramos no dia-a-dia seja igual à respiração que fazemos quando estamos em stresse: com inspirações e expirações superficiais e rápidas. O impacto na saúde é grande: insónias, níveis de stresse elevados, mais tendência para ataques de pânico, maior ansiedade, hipertensão, dores nas costas… tudo problemas que abrangem uma grande fatia da população mundial.
A solução é simples
Temos de reaprender a respirar corretamente, a utilizar o diafragma neste processo, e a usufruir de todos os benefícios que essa pequena-grande alteração nos traz:
• Alivia bastante o stresse, a tensão e estados de ansiedade.
• Combate a insónia.
• Estabiliza o ritmo cardíaco e acalma-nos.
• Regula as emoções e ajuda a controlar o medo e a irritabilidade.
• Ajuda a controlar a dor.
• Estimula a imunidade e processos anti-inflamatórios no nosso corpo.
• Ajuda a pensar melhor e a sentirmo-nos com mais energia.
• Otimiza a performance desportiva.
• O movimento do diafragma massaja os órgãos internos, o que estimula a eliminação natural das toxinas do corpo.
Preparada para mudar?
• Antes de mais, procure estar num espaço em silêncio para poder usufruir do momento a 100%, sem interrupções.
• Seja firme e consistente. Mais importante que os minutos a que se dedica a esta experiência de respirar bem é a frequência: o ideal é que o faça todos os dias.
• Vista uma roupa confortável, que não a aperte nem esteja larga a ponto de a distrair.
• Em relação à posição, para fazer estes exercícios respiratórios, pode ser deitada com uma almofada sob a cabeça, em pé, descontraída, ou sentada numa cadeira, na ponta do assento para manter as costas direitas, as pernas à largura dos ombros, não se esquecendo de os descontrair.
• É importante também que inspire pelo nariz, mantendo a boca fechada – não cerrada –, basta que os lábios estejam juntos e a ponta da língua toque no interior dos dentes do maxilar superior. A questão de inspirar pelo nariz é muito importante porque não só estimula o sistema nervoso parassimpático, que nos ajuda a acalmar, como as pessoas inalam a quantidade de ar adequada (quando respiramos pela boca, inalamos mais ar do que precisamos podendo dar origem a hiperventilação), como aquece, humedece o ar e filtra-o dos micróbios, alergéneos, agentes poluentes, até este chegar aos pulmões.
• Se o objetivo é libertar tensão e stresse, deve fazer até 5-7 respirações por minuto. Lembre-se que o tempo que leva a inspirar deve ser sempre menor do que o tempo que leva a expirar, isto é, deve inspirar, por exemplo, em 4 tempos e expirar (pela boca) em 6 ou 7 tempos.
• Para se certificar de que está a respirar com a ajuda do diafragma, mantenha uma mão sobre o estômago e outra sobre o peito, a do estômago deve ser sempre aquela que deve mexer.
• Uma das técnicas de respiração mais conhecidas é a ‘4-7-8’, desenvolvida pelo médico integralista americano Andrew Weil. Trocado por miúdos é: quatro tempos a inspirar, sete tempos a suster a respiração e oito tempos a expirar. Ele aconselha a que se faça apenas 4 vezes seguidas este exercício [4 x (4-7-8)], o que demora poucos minutos, mas que, para ser eficaz, deve ser feito de manhã e à noite, todos os dias sem falta, pois, diz ele, os benefícios são cumulativos, vão-se sentindo cada vez mais ao longo do tempo. Não se admire se ficar um pouco tonta no início do exercício nos primeiros tempos, passa rapidamente com a continuação.
• Se precisar de ajuda, há várias apps que podem guiá-la e manter a disciplina necessária.