E se alguém lhe dissesse que a chave para uma saúde de ferro está em fazer um detox ao seu intestino? É isso que o naturopata francês Thomas Uhl defende no seu livro ‘Et Si Je Mettais Mes Intestins au Repos?’ (E se os meus intestinos fizessem uma pausa?). Porquê os intestinos? Porque eles são o maestro de uma grande orquestra que é o nosso corpo. É ali que vive uma ‘comunidade’ de bactérias – cerca de 100 biliões, de 500 a 1000 espécies diferentes – que, para exercer a sua função na perfeição, tem de viver num equilíbrio proporcionado através de uma alimentação saudável e variada. Quando isso não acontece, algumas espécies de bactérias do nosso microbioma intestinal desenvolvem-se mais que outras, provocando um desequilíbrio que se reflete numa menor capacidade de nos defender contra micro-organismos patogénicos. E isso abre a porta a problemas metabólicos como a obesidade, intolerância ao glúten e até a neuropatologias como a depressão ou doenças neurodegenerativas, como Alzheimer.
Além da alimentação, também o avançar da idade diminui a qualidade da flora intestinal e torna-a mais sensível, assim como os tratamentos medicamentosos (antibióticos e quimioterapia) e agentes infecciosos como a salmonela.
Mas num mundo em que se come quase ininterruptamente, em que as nossas papilas gustativas parecem estar em constante solicitação, como é que se consegue resistir às tentações gastronómicas e reequilibrar o intestino? A resposta do naturopata francês é: com uma redução alimentar temporária.
Atenção: renovação interior em processo
A pergunta que já deve estar a fazer é: ‘então para ser saudável tenho de parar de comer? Isso não faz sentido!’ Thomas Uhl diz que ao fazer a redução alimentar, ainda que por um período curto, isso vai fazer com que o seu aparelho digestivo trabalhe em slow motion, em vez do fast forward habitual. No seu livro, ele explica que quando há uma redução alimentar temporária, não só há um abrandamento dos movimentos peristálticos (dos intestinos) como o corpo regula de forma mais eficaz a produção de sucos digestivos e fá-lo em menor quantidade. Isso vai ter também impacto a nível cerebral, já que este órgão recebe informação do estômago e intestino com mais calma e não em catadupa. “Vamos ver uma verdadeira limpeza e autorregulação no intestino já que as bactérias não recebem açúcar e vão acalmar-se progressivamente. Como 1 milhão de células do intestino se renovam a cada minuto, não tendo tanto trabalho a digerir os nutrientes e absorver micronutrientes, têm mais tempo para fabricar imunoglobulinas A, os anticorpos encarregados de proteção da mucosa intestinal”, escreve o naturopata, que cita também o trabalho de Valter Longo, um cientista americano há muito dedicado aos efeitos benéficos do jejum, e que defende que o jejum aumenta a eficácia do nosso sistema imunitário em mais de 20%. Apesar de não ter boa fama, é uma prática milenar (os cristãos jejuavam na Quaresma; os muçulmanos fazem-no durante o Ramadão, por exemplo) e “é recomendada pela comunidade médica na Alemanha e na Rússia desde os anos 50”, afirma Uhl.
Detox à la carte
No seu livro, o naturopata francês sublinha que a perda de peso não é o objetivo, mas sim uma tomada de consciência do que põe no prato, a fim de mudar para uma alimentação mais saudável. Embora Uhl seja o fundador de um centro em França, Pensée Sauvage, onde se pratica vários tipos de detox com duração de vários dias, o naturopata desaconselha totalmente a fazê-lo sem a devida preparação, “é como começar a correr e inscrever-se logo numa maratona”, diz, ou seja, é perigoso e talhado para o insucesso. Em vez disso, apresenta várias alternativas de redução alimentar temporária (um dia) que pode fazer uma vez por semana ou por mês, seja um jejum de 24h, ou uma monodieta. Pode parecer uma tarefa hercúlea, mas feita de forma pensada, organizada e com regras não é assim tão difícil. É claro que findo o jejum ou a monodieta não se deve atirar ao maior bife à face da terra nem a pastéis de nata. Deve fazer um esforço para cozinhar refeições saudáveis e, ao contrário do que possa pensar, quando terminar a redução alimentar não vai querer comer este mundo e o outro.
Antes de iniciar esta ‘empreitada’, Thomas Uhl aconselha primeiro a habituar-se a seguir algumas regras:
• Comece os seus dias bebendo um copo de água morna com umas gotas de limão para acordar suavemente as suas funções digestivas.
• Prefira alimentos biológicos, sempre que possível crus, como fruta e legumes em salada.
• Evite produtos à base de trigo.
• Faça, no máximo, 4 refeições com proteína animal por semana (carne branca, peixe, ovos e laticínios).
• Coma fruta sempre fora das refeições, meia hora antes ou 3h depois (idealmente entre as 11h e as 17h).
• Beba 1,5l de água por dia, sobretudo 30 minutos antes das refeições ou 2h depois.
Regras para um dia de repouso digestivo
Comece as 24h de jejum num domingo e sempre à noite, aconselha o naturopata, em que acorda mais tarde, tem tempo para preparar um pequeno almoço/brunch saudável e saciante, almoça mais tarde e se calhar até nem há muito apetite para jantar. Não deve comer nada a partir das 20h e só deve voltar a fazê-lo no dia a seguir por essa hora com uma refeição ligeira, como uma sopa de legumes. Se for difícil pode comer uma sopa de legumes ao almoço. Obrigatório é mesmo beber pelo menos 1,5l de água ao longo do dia ou tisanas sem açúcar, para não ficar com dores de cabeça. A primeira vez vai custar, até porque somos animais de hábitos e quebrar a rotina de comer quase como os bebés, de 3h em 3h, não é fácil.
Versão mais suave: monodieta
A monodieta é um detox mais suave e consiste em ingerir apenas um tipo de alimento durante 24h, esclarece Thomas Uhl. E diz o autor que é a forma mais fácil de repousar os intestinos porque dura apenas 24h e só têm de digerir um alimento, em vez de 20 ou 30 diferentes ao longo do dia. Os alimentos para a monodieta que o naturopata aconselha são: a maçã (se não tiver colite pode comer 1,5kg a 3kg, crua, ralada, assada no forno com canela, triturada ou em sumo sem nada adicionado); o arroz; o melão; as uvas (1,5kg a 2kg num dia, mas desaconselhada a quem tem diabetes ou taxa de glicémia alta); ou sumos de legumes (5 copos ao longo do dia). Como para o jejum, comece num dia à noite, às 20h-21h, e termine no dia seguinte à mesma hora (comendo só o alimento escolhido até à manhã seguinte, altura em que deve escolher um pequeno almoço saudável).
Microbioma em alerta
Os seus intestinos não estão em equilíbrio se tem:
• dores abdominais, musculares, articulares
• problemas digestivos: sensação de peso no estômago, náuseas, inchaço, flatulência, diarreia, obstipação, prurido anal
• problemas fisiológicos: envelhecimento precoce, perda ou ganho de peso, fadiga, falta de líbido, formigueiro nas mãos e nos pés, tonturas
• problemas de imunidade: alergias e infeções
• problemas neurológicos: dor de cabeça, ansiedade, perda de concentração e de memória, estado depressivo
• problemas inflamatórios: artrite, tornozelos inchados
• problemas dermatológicos e capilares: secura, eczema, erupções, queda de cabelo e cabelo sem brilho.