Não, ele pode não ser apenas irrequieto, distraído, desinteressado ou apático. Uma série de problemas podem afectar as crianças, desde as dificuldades de visão e audição a disfunções como a dislexia e a discalculia, e comprometer a capacidade de se concentrarem e aprenderem conteúdos. Falámos com especialistas que os descodificam e apontam soluções.
Dislexia
O que é?: É uma dificuldade, de ordem neurológica, que afecta a aprendizagem da escrita e leitura. Ainda há poucas décadas, as crianças disléxicas eram consideradas pouco inteligentes ou desatentas. “A dislexia não tem qualquer correlação com classe social ou inteligência. Pessoas com esta dificuldade podem ser brilhantes em outras áreas, que não incluem leitura e escrita”, diz Tânia Rangel, psicopedagoga do
Prevalência: “Esta é a dificuldade mais frequente na população escolar. Em Portugal os estudos são escassos, mas estima-se que se situe entre os 5% e os 10%”, diz Tânia Rangel. É mais comum nos rapazes.
Sinais de alerta: Como depende de que exista já algum tempo de alfabetização da criança, não costuma ser detectada antes dos sete ou oito anos. Eis alguns sintomas, segundo a psicopedagoga:
– trocas de letras com formas parecidas (o d e o b, por exemplo);
– trocas de letras com sons parecidos;
– confusão entre sílabas inicias, intermédias e finais;
– reduzida percepção auditiva;
– dificuldade na aquisição do nome das letras;
– problemas ao nível da organização espacial;
– dificuldade na memória auditiva;
– ocorrência de trocas/inversões e omissões na leitura e na escrita;
– problemas na aquisição da fala/dificuldades articulatórias;
– dificuldade em segmentar e reconstruir sílabas ou fonemas;
– dificuldade em fixar rimas;
Discalculia
O que é? Desordem neurológica que afecta a capacidade da criança compreender e trabalhar com números. Está para os números como a dislexia para as letras. Costuma afectar mais raparigas.
Prevalência: “Os estudos são ainda mais reduzidos, mas pesquisas americanas apontam para que afecte entre 3 e 6% da população com necessidades educativas especiais – que representa 13 a 14% do total de crianças”, observa a psicopedagoga.
Sinais de alerta: Tal como a anterior, só costuma ser identificada por volta dos sete ou oito anos, pois depende da estimulação escolar. Segundo Tânia Rangel, os principais sinais são:
– reduzida memória de trabalho;
– dificuldade na interiorização dos princípios numéricos;
– dificuldade em aceder ao cálculo mental;
– dificuldade no manuseamento do dinheiro;
– dificuldade na utilização de símbolos;
– dificuldade na compreensão dos números;
– fracas habilidades de contagem;
– dificuldade em nomear quantidades matemáticas;
– dificuldade na execução de operações e cálculos numéricos;
Quais as terapias mais eficazes para a discalculia e dislexia?
“Existem outras abordagens, não educacionais, mas o Treino Cognitivo é considerado o mais eficaz”, responde Tânia Rangel. “Neste tipo de intervenção, o terapeuta constrói, e aplica um programa, desenvolvendo e trabalhando as funções implicadas no processo de aprendizagem da leitura, escrita e cálculo. Trata-se de ajudar a criança a adquirir alguns ‘truques’ que lhe permitam ultrapassar as suas principais dificuldades no acto de ler, escrever ou calcular.”
Como os pais fazer podem ajudar?
Eis alguns conselhos da psicopedagoga do SEI:
Estar atento aos sinais: “Assim que identifiquem algum sinal de alerta, deverão procurar realizar uma avaliação especializada.”
Não faça disso um drama nem um tabu: “Em grande parte dos casos, a forma como os pais lidam com a dificuldade será semelhante à forma como a criança também lida”, observa. “Se os pais vivem estas dificuldades com tranquilidade e compreensão, provavelmente também a criança o irá fazer, havendo uma evolução mais rápida. Por outro lado, é preciso conversar com ela e explicar-lhe porque é que ela não está a conseguir ler como os seus colegas e não esconder essa dificuldade nem torná-la um assunto proibido.”
A brincar também se aprende: “Em casa, os pais poderão estimular através de jogos que estimulam o desenvolvimento destas aptidões. No SEI fazemos formações com pais onde lhes damos dicas de jogos que criamos para estes casos, pois há muito pouca coisa. Jogos como o Scrabble podem ajudar na dislexia, por exemplo, mas estão muito próximos do conteúdo escolar e as crianças acabam por rejeitá-los porque o associam a isso. Aconselho os pais a inventar jogos em que se encontrem palavras com determinados sons ou que comecem com uma letra.”
Não pressione: “Estas crianças podem apresentar desempenhos muito instáveis, como se num momento soubesse fazer aquela tarefa e daí a cinco minutos já não. Nestas situações, os pais não devem dramatizar, nem insistir. O melhor será mesmo desviar todos os sentimentos de culpa e encontrar outras formas de ajudar a criança.”
Seja assíduo na terapia: “É muito importante que os pais sejam consistentes e assíduos nas terapias que iniciarem.”
Distúrbio de Hiperactividade com Défice de Atenção
Não sendo uma dificuldade de aprendizagem específica, pode levar ao insucesso, uma vez que as crianças que dela sofrem não conseguem ter o nível de concentração necessário para o bom acompanhamento das aulas. “Começamos a ter queixas por volta dos quatro ou cinco anos, embora os pais se preocupem mais quando as crianças entram na escola e não conseguem estar sentadas na cadeira e concentradas”, diz-nos Tânia Rangel.
Prevalência: “Calcula-se que afecte entre 3% e 5% das crianças em idade escolar”, diz a psicopedagoga.
Sinais de alerta: A Hiperactividade e o Défice de Atenção podem manifestar-se isoladas ou associadas. Seis ou mais destes sintomas devem coexistir, com frequência, pelo menos durante seis meses, segundo a Associação Portuguesa da Criança Hiperactiva:
No Défice de Atenção:
– Não presta atenção suficiente aos pormenores ou comete erros nas tarefas escolares ou em actividades lúdicas;
– Tem dificuldade em manter a atenção em tarefas ou actividades;
– Parece não ouvir quando se lhe dirigem;
– Não segue as instruções e não termina os trabalhos escolares ou outras tarefas
– Tem dificuldade em organizar tarefas ou actividades;
– Evita, sente repugnância ou está relutante em envolver-se em tarefas que requeiram um esforço mental mantido, tal como trabalhos escolares ou de casa;
– Perde brinquedos, exercícios e material escolar, livros