Quando percebeu que era mais feliz tendo menos, Eliana Barros tomou para si a missão de criar uma marca de acessórios que sobrevivessem ao tempo, tanto na vontade de quem os usava, como na qualidade. Nesta tentativa de combater a voracidade da fast fashion nasceu a Ownever, uma marca repleta de valores que se espelham numa vontade real de impactar de forma positiva e, sobretudo, construtiva. Um exemplo perfeito disso mesmo é a mala 2157, que foi desenhada para chamar a atenção para a desigualdade de género, incluindo a diferença salarial. Para isso, este modelo tem incorporado no seu design o ano 2157, uma vez que, segundo o World Economic Forum, é essa a meta para que haja igualdade de género. De forma simbólica, a Ownever oferece 135 anos de garantia. E foi sob este mote, já que hoje se celebra o Dia Europeu da Igualdade Salarial, que Eliana falou com a ACTIVA sobre os propósitos que a movem.
A sua marca assenta nos princípios da qualidade e da longevidade do produto. Como é que surgiu a vontade de criar a Ownever?
Sempre soube que queria criar algo com o savoir-faire português, bem feito, sustentável e que enaltecesse o design intemporal. Desde o primeiro dia que ambiciono que a Ownever seja uma referência não só de qualidade e longevidade, mas também de sustentabilidade e que tenha algo emocional. Não quero que as carteiras da Ownever sejam descartadas como o fast fashion faz atualmente; em que o esforço e dedicação com que se cria um produto é completamente ignorado, sendo preterido pela novidade, e onde os produtos acabam por ser descartados sem qualquer consciência.
Passa pela valorização da qualidade e da consequente intemporalidade?
Acredito que a moda é importante, e pode ser um veículo de mudança, mas sou contra o fast fashion que desvaloriza o trabalho, o processo e os trabalhadores. Penso que quando os acessórios ganham a qualidade que necessitam e são acompanhados de um design intemporal, a necessidade de consumo diminui, e em vez de se comprar muito, acaba por se optar pelo pouco e bom – mantendo esse pouco durante muito mais tempo, atribuindo assim o valor que realmente devia existir em tudo o que se cria. Todas as peças da Ownever são criadas por mãos de artesãos em Portugal e, além de trabalhar localmente, também tenho o prazer de trabalhar com pessoas que sabem fazer as coisas bem e com muita qualidade, algo que também é de grande importância para mim.
Em termos estéticos, a minha inspiração é o estilo tradicional francês, que valoriza o minimalismo, a elegância e que confere às malas intemporalidade. Quero que cada carteira seja usada para além de uma estação – quero que seja usada para a vida. Por isso, quando criei a Ownever, além da linha de malas, foi muito importante disponibilizar ainda um serviço de reparação e restauro de artigos em pele. Este serviço, para além das peças da Ownever também está disponivel para malas de qualquer outra marca e inclui polimento, pintura, tratamento antibacteriano, restauração de alças e cantos, e outras reparações que sejam necessárias. Porque muitas vezes não necessitamos de uma carteira nova, apenas de reparar a que já temos.
Tendo esses valores por base, como define a marca?
A Ownever é uma marca de acessórios de luxo, ética, sustentável e feita à mão em Portugal. Todas as criações são idealizadas com a missão de serem passadas de geração em geração, abraçando a economia circular e assumindo uma posição oposta ao fast fashion.
Criou a única mala no mundo que alerta para os problemas de desigualdade de género entre homens e mulheres. Enquanto artista, é importante fazer a diferença em temas como este?
Claro que sim, é importante não só enquanto artista, mas como mulher. Somos uma marca criada por mulheres e somos acima de tudo uma marca que se preocupa com quem e onde atua. É impossível, depois de nos depararmos com os números atuais de desigualdade de género, a nossa cabeça não se questionar: o que é que está ao meu alcance para mitigar de alguma forma esta realidade? Por vezes pequenos gestos fazem a diferença, e neste caso oferecer manutenção numa mala durante mais de 100 anos, como se deve imaginar, não existe propriamente lucro. Por isso, de alguma forma, sinto que estou a ajudar as mulheres que usam esta carteira. Tenho um orgulho enorme quando mulheres, e homens, adquirem esta edição especial e agradecem por ter chamado a atenção para esta realidade. Todos podemos fazer sempre qualquer coisa para mudar a nossa realidade para melhor, este é só um pequeno exemplo.
2157 assinala o ano em que chegamos à igualdade de género. Que passos teríamos que dar para que a mudança acontecesse mais cedo?
Ainda há muito trabalho a fazer, infelizmente. Mas a igualdade salarial seria um grande avanço para a igualdade de género, porque atrás disso vem muitas outras coisas como a igualdade financeira, ou seja poder de compra. É alarmante perceber que uma mulher em Portugal ganha menos 11,4% do que um homem que desempenha o mesmo trabalho. É chocante pensar que nós mulheres trabalhamos quase dois meses por ano sem receber nada por isso. É preciso mudar mentalidades, e esse é um caminho muito longo, mas como já referi, por vezes pequenos gestos podem fazer a diferença e é importante continuar a dar palco para este tipo de temas.
Alertar para este tipo de temáticas através de campanhas como a da Ownever 2157 é um dos meios que enquanto marca podemos usar; mas há muitos outros como educar a nossa comunidade. Uma marca como a Ownever também tem responsabilidade social, por isso temos a responsabilidade de dar a conhecer os números, de dar a conhecer as realidades boas e más, e de escolher trabalhar apenas com parceiros que estejam alinhados com os nossos valores.