Há uma nuvem negra que está, de uma maneira geral, associada à menopausa. Sempre que o tema é abordado, são as partes negativas que são sublinhadas, sem nenhuma tónica nas soluções que existem para as aliviar. O silêncio gerado pelos muitos mitos a ela associada, bem como à ideia de que há uma desvalorização da mulher a partir desta etapa, contribui em muito para a representação errónea que há sobre este tema.
No sentido de desmistificar estas ideias e de mostrar que a menopausa pode, de facto, ser um início e não um fim, a Activa online falou com Iris Bravo, especialista em Ginecologia com subespecialidade em Medicina da Reprodução para perceber como o olhar pode, e deve, ser diferente quando falamos de menopausa.
Sendo a menopausa um período mais do que natural na vida da mulher, porque está envolto em secretismo e até alguma vergonha?
Penso que terá a ver com os estigmas associados ao ciclo de vida das mulheres e à crença antiquada e desajustada de que as mulheres que não estão aptas para ter filhos possuem menos valor ou são menos desejáveis.
É fundamental falar abertamente do tema para que as mulheres percebam que, além de não estarem sozinhas a viver esta fase, o que experienciam é também vivido por tantas outras pessoas?
Sim, é muito importante, uma vez que a menopausa é um fenómeno fisiológico, natural e transversal. Todas nós nascemos com um número finito de óvulos, a que vão corresponder ciclos de ovulação e menstruações, que duram até cerca dos nossos 50 anos. Depois disso, os nossos ovários deixam de produzir óvulos e as hormonas estradiol e a progesterona, cujo objetivo é a reprodução. Em tudo o resto, somos exatamente as mesmas pessoas, as nossas hormonas, ou a falta delas, não nos definem.
Quais são as principais ideias erradas associadas à menopausa?
Pensar que não vale a pena ir ao médico porque não há nada a fazer em relação aos afrontamentos ou outros sintomas, assumir que a vida sexual se tornará inevitavelmente menos satisfatória, assumir que irá afetar a nossa capacidade intelectual e pensar que a terapêutica hormonal deve ser evitada porque é perigosa.
Este é um período de muitas mudanças para a mulher. Que mudanças são essas e como podem ser encaradas de forma mais positiva?
A mudança visível é a cessação das menstruações a que corresponde uma mudança hormonal. Por um lado, a adaptação às alterações hormonais pode provocar alguma irritabilidade, insónias, afrontamentos ou diminuição da libido. Os sintomas variam muito de mulher para mulher, mas por outro lado, a cessação da menstruação pode ser uma mudança muito positiva para as mulheres com endometriose, que tenham menstruações dolorosas ou muito abundantes. Também o facto de não poder ocorrer uma gravidez não desejada e ser uma altura em que a vida familiar se torna menos cansativa, sobretudo para as mulheres que tiveram filhos, faz com que algumas mulheres se sintam mais relaxadas e estejam mais disponíveis.
Quais são os principais sintomas da menopausa, sendo que podem variar muito de mulher para mulher, como disse?
Variam muito e as mulheres poderão valorizar uns sintomas em detrimento de outros de acordo com a interferência nas suas atividades e qualidade de vida. Os que costumam ser verbalizados como mais frequentes e, os que são mais incómodos, são os afrontamentos, as insónias, a irritabilidade, a secura vaginal e a diminuição da líbido.
Sintomas como a secura vaginal ou a falta de líbido podem afetar a vida em casal. Sente que ainda se esconde muito estes sintomas, mesmo do próprio médico ou ginecologista?
Talvez ainda haja algum constrangimento em tocar no assunto, mas penso que a tendência é positiva no sentido de que as mulheres cada vez mais se sentem no direito a uma vida sexual prazerosa, e também porque existe maior sensibilidade a nível dos profissionais de saúde para questionar o assunto caso as mulheres não o abordem.
Outro ponto muito importante, e que nunca é demais frisar, é que o principal órgão sexual da mulher é o cérebro, e que muitos destes constrangimentos podem estar relacionados com estas crenças limitadoras em relação à menopausa e à perceção do seu corpo como menos atraente.
A excitação na mulher vai muito além de estímulos físicos, é sobretudo psicológica e depende muito das suas próprias fantasias e criatividade. Um casal que comunique e se expresse abertamente sobre o tema num contexto de confiança e intimidade, certamente há-de encontrar estratégias para uma vida sexual satisfatória.
Ultimamente, várias figuras públicas internacionais começaram a colocar a tónica na menopausa, trazendo a normalidade necessária para o assunto. Mas ainda há um longo caminho a percorrer, ou não?
Sim, sobretudo no sentido de não demonizar a menopausa, como o bicho papão que dita o início de uma era em que “perdemos valor”, nos irá fazer sofrer e para a qual não há remédio. Quando no fundo é apenas uma nova etapa, onde alguns aspetos da nossa vida serão melhores e outros menos bons, pelo que é importante partilhar experiências e verbalizar as queixas, ao invés de as sofrer em silencio e com vergonha.
Olha-se muito para a menopausa como o fim de algo e raramente como o início de uma outra fase na vida da mulher. É imperativo mudar este olhar?
Na minha opinião, a menopausa deve ser encarada como uma oportunidade e um recomeço. É uma fase em que as mulheres são mais sábias, sabem melhor o que gostam, o que querem e que não querem para as suas vidas. Acumularam múltiplas experiências e saberes, o que as coloca num lugar privilegiado para tomarem decisões e alcançarem sucesso em projetos novos ou em curso.
Por outro lado, nas mulheres que tiveram filhos, a menopausa muitas vezes coincide com a altura em que eles se tornam mais autónomos ou saem de casa, o que por um lado pode provocar alguma tristeza pelo síndrome do ninho vazio, mas por outro lado permite mais tempo e disponibilidade para atividades com o parceiro, vida social, ou para aceitar novos desafios em diversos campos que as entusiasmem.
É muito comum assistir à criação e ascensão de projetos muito interessantes, lucrativos ou não, de mulheres nesta faixa etária, e muitas delas referem que só alcançaram confiança, espaço e tempo para si próprias e para os seus sonhos depois dos cinquenta anos.
Ou seja, a menopausa não tem que ser um período sofrido, constrangedor e vivido de forma isolada?
Claro que não, temos muitas ferramentas ao nosso dispor, medicamentosas e não só, para contrariar os incómodos causados pela transição hormonal, para que as mulheres desfrutem da sua vida familiar, social, afetiva e sexual, de uma forma tão ativa como antes. Uma das peças chave nesta transição e que recomendo muito é a prática regular de atividade física ou desportiva.