Em qualquer emprego é natural que haja diferença de opiniões, discussões, e empatias pessoais mas, para que o trabalho flua e a equipa funcione, a sinceridade e frontalidade são fundamentais. Infelizmente, nem sempre isso acontece e há, muitas vezes, quem, na sombra, sabote o nosso trabalho. Conheça dois casos em que a rivalidade profissional chegou a tal ponto que fez com que o ambiente de trabalho se tornasse um inferno.
Carolina (nome fictício), hoje com 26 anos, tinha acabado de sair da Faculdade de Engenharia da Universidade de Coimbra, quando conseguiu um emprego como engenheira estagiária na Ilha do Faial, nos Açores, em Janeiro de 2000.
Na empresa, os funcionários trabalhavam em equipas de engenheiros estagiários e seniores, orientando estes os mais novos, assumindo tarefas de maior responsabilidade. A relação de trabalho entre Carolina e a sua sénior, era boa: “Havia bastante intimidade entre nós. Mas notei que ela não tinha experiência suficiente e que tinha o hábito de me passar tarefas que devia ser ela a resolver. Depois sentia-se mal, porque eu estava a ter o protagonismo. Mas o facto de me estar a sair bem estava-me a causar problemas”, aponta Carolina. “O caricato é que ela me confessava os seus pontos fracos, ao que eu respondia: ‘Não há problema! Fazemos as duas, perguntamos!”Mas a engenheira sénior não demorou a informar o chefe que achava que Carolina não respeitava a hierarquia.
Aproveitando a baixa de parto desta engenheira sénior, o patrão substituiu-a por alguém com mais experiência. Foi pela nova sénior, uma engenheira brasileira, que Carolina ficou a saber das queixas da ex-colega. “Ainda tentei falar com o chefe, mas não pareceu interessado. Não queria que uma pessoa, acabada de sair da faculdade, lhe desse problemas, quer tivesse ou não razão.”No entanto, a nova colega revelou-se ainda pior. “Tinha uma grande necessidade de protagonismo, ocultava os seus fracassos e era muito hábil a delegar trabalho aos outros e a ficar com os louros”, recorda Carolina. “Para além de ser incompetente, ocultava-me informação de trabalho. Era muito conflituosa e arrogante. Optei por falar com ela e discutimos.”
Para evitar as situações por que tinha passado anteriormente, Carolina passou a recusar-se a fazer os trabalhos de maior responsabilidade, da competência da engenheira sénior. “Ela passou todo o meu trabalho a outra estagiária e deixou-me sem nada para fazer, dizendo ao chefe que não conseguia trabalhar comigo.”A ironia é que esta engenheira sénior acabou por ser despedida, depois de sucessivas queixas dos empreiteiros das obras de que era responsável. Apesar de já sentir por Carolina uma certa antipatia, o chefe nunca conseguiu encontrar defeitos nos seus trabalhos. Os empreiteiros com quem trabalhava davam boas informações da estagiária.
Devido a tantas queixas e tensão, Carolina entrou em depressão e pediu a demissão, apesar de a aconselharem a ficar para ‘limpar a sua imagem’.Hoje, conclui que deveria ter optado por ficar nos bastidores. “Fui ingénua. Expus-me demasiado. Devia ter ficado mais na sombra.” Isso mudou bastante a sua forma de encarar as relações laborais. “Hoje, separo as amizades das relações de trabalho. Para fazer um verdadeiro amigo, no emprego, essa pessoa tem de me provar que merece mesmo a minha confiança.”
A Sabotadora
Há poucas coisas tão irritantes como aquela colega que nos olha de lado quando passamos por ela no escritório. Conceição Francisco, 40 anos, conheceu esta sensação há cinco anos, quando trabalhava num banco. Uma das colegas já tinha fama de ser conflituosa e Conceição depressa assim o constatou. “Olhava-me por cima do ombro, ouvia as minhas conversas ao telefone. Não gostava de mim, e havia ali alguma inveja, apesar de eu nunca ter percebido porquê.
Foi então que começaram a surgir situações estranhas: dados que desapareciam misteriosamente, outros que eram registados em duplicado. Conceição tinha a certeza de ter realizado correctamente aquelas operações
Tudo corria mais ou menos normalmente, até ao dia em que desapareceu um documento importante, uma ordem dada por um cliente. “Perguntei às minhas colegas se tinham mexido no documento e todas me responderam que não. Desesperada, procurei-o até às nove da noite, sem o encontrar.” O director, que ainda estava na empresa, viu luz acesa no gabinete e foi até lá, saber o que se passava. “Expliquei-lhe a situação e ele disse-me para ter calma e procurar na secretária das minhas colegas. Eu disse que não fazia isso, uma vez que já lhes tinha perguntado por ele.” Então o director apontou para a secretária da colega com quem não se dava bem e perguntou: “Já viu ali?” E lá estava ele, no fundo da pilha de papéis da colega que o negara ter visto, nessa tarde. “O director disse-me para o voltar a pô-lo no lugar e que no dia seguinte já sabia o que tinha a fazer. Foi uma noite muito longa e angustiante.”
No dia seguinte, Conceição confirmou à chefe de departamento que achara o documento. “Então chamei por essa minha colega e disse-lhe: ‘Por favor, entregue o documento porque eu achei-o no seu cesto de papéis. Encontrei eu e o director.’ A partir daí, nunca mais uma operação minha foi duplicada ou desapareceu alguma coisa. Não tenho dúvidas que foi de propósito. Não se defendeu, não pediu desculpas, não procurou as chefias para explicar a situação. Foi apenas por maldade.”
Há mil e uma razões para surgirem as rivalidades como estas: divergências de opiniões laborais, personalidades incompatíveis, inveja do cargo alheia, insegurança. “60% dos nossos problemas de relacionamento têm por base uma má comunicação”, afirmam Soledade Sousa Morais, da Invesco Transearch, e Margarida Dias, da Bright Partners, ambas executivas especialistas em gestão de recursos humanos. “A conflituosidade existe, é inevitável e, por si só, não é necessariamente negativa. Faz parte da natureza e está tão presente nas empresas como na família, nas instituições, nos grupos. Todos nós conhecemos casos que acabam por tomar proporções muito dramáticas, como demissões em bloco, despedimentos questionáveis ou incompatibilidades profissionais e pessoais bloqueadoras”, dizem as especialistas. “Mas, as capacidades de negociação treinam-se e desenvolvem-se; podemos aprender a controlar melhor o nosso nível de stresse e as nossas emoções.”
Mas há soluções para evitar estas tensões. As empresas de executive search, vulgarmente conhecidas como ‘caçadores de talentos’, procuram cada vez mais gestores com capacidade de gerir conflitos pessoais. E, nas economias mais desenvolvidas, recorre-se a um modelo de distribuição ‘por quotas’ de mulheres e homens, de diferentes grupos etários, de formações académicas e especializações técnicas díspares. Tudo para fomentar a convivência com a diferença. “Um ambiente empresarial misto será mais rico, produtivo e eficaz”, referem as duas especialistas.
Só as mulheres se dão mal entre si?
Quem fala de uma ‘Liga de Cavalheiros’, onde não há lugar para rivalidades abertas e intrigas, pode não estar a ser muito fiel à verdade. Apesar de ter tido um conflito com uma mulher, Conceição Francisco admite: “É um mito. Um homem alcoviteiro, traiçoeiro, mau colega, consegue ser mais dissimulado e confunde-nos mais: estamos à espera que essa situação parta de uma mulher e não de um homem. Penso é que as mulheres são mais dadas à conversa.”
As especialistas concordam: conflitos não têm sexo. “Não é exclusivo de homens ou de mulheres ser mais ou menos conflituante ou ser mais ou menos tolerante. Tem mais a ver com os níveis grupais ou individuais de aceitação da diversidade.” Margarida Diaacrescenta que se trata de uma ideia feita, muito difundida: “Resta saber se não passa mesmo só de uma ideia feita. Há tempos, uma executiva muito conhecida no mercado e com quem trabalho há muito tempo, convidou-me para almoçar dizendo: ‘Desta vez não é trabalho. É que estou a precisar de poder falar de verniz, croché… sem chocar ninguém!”